Guia completo do Tour'2024

Segunda Grande volta do ano arranca no sábado e neste especial poderá ficar a saber de tudo

Este ano mais cedo do que o habitual, aí está a prova mais esperada dos fãs do ciclismo. Com arranque marcado já para sábado, em Florença, a Volta a França deste ano tem tudo para monopolizar as atenções dos amantes do ciclismo, mas também de todos os que gostam de grandes espetáculos desportivos. Colocada ainda com o Europeu de futebol em andamento e antes dos Jogos Olímpicos de Paris, a mais emblemática corrida velocipédica deste ano promete arrebatar as emoções. Tudo porque vai reunir o naipe dos melhores ciclistas da atualidade, todos os líderes das equipas com ambições à camisola amarela.
Quer saber tudo? Como habitual, Record traz-lhe um guia completo onde pode consultar todas as informações, desde a análise detalhada das etapas e das equipas, um perfil histórico e também quem são os principais candidatos. Está tudo aqui.
Este ano, como sempre, todo o Tour contará com transmissão em direto para Portugal no Eurosport e na plataforma MAX, mas também poderá seguir as incidências das principais etapas no site de Record.
Os dados estão lançados, que comece então a prova rainha do ciclismo mundial!

Apresentação

Este ano mais cedo do que habitual, conforme dissemos, o Tour'2024 vai ser um dos mais renhidos de sempre, isto a julgar pelo pelotão de elevadíssima qualidade que as equipas vão fazer alinhar.
Tadej Pogacar (UAE Emirates), Jonas Vingegaard (Visma | Lease a Bike), estes dois os campeões dos últimos quatro anos, com duas vitórias cada; Primoz Roglic (que deixou a Jumbo, agora Visma | Lease a Bike), para ser líder a solo na Red Bull – BORA – hansgrohe, ainda que esta tenha também Alesandr Vlasov; Remco Evenepoel (Soudal Quick-Step), que faz a sua estreia na prova; Egan Bernal (Ineos Grenadiers); Richard Carapaz (EF Education - EasyPost); ou Enric Mas (Movistar). São - mesmo! - muitos os candidatos...
Para os portugueses, a Volta a França de 2024 terá ainda mais motivos para colocar os espetadores pregados à televisão. João Almeida fará a sua estreia, depois de ter brilhado na Volta a Itália (no ano passado foi 3.º) e de outras bem sucedidas participações na Vuelta. Sabe que agora a sua prioridade é trabalhar para Tadej Pogacar, não descurando todavia aproveitar "uma oportunidade" se o desenrolar da corrida assim o permitir. A UAE Emirates, de resto, será a super equipa do pelotão, pois além do esloveno e do português, apresenta-se com Juan Ayuso, Adam Yates e Pavel Sivakov.
A lista de portugueses presentes este ano completa-se com Rui Costa (EF Education), 37 anos, e Nelson Oliveira (Movistar), 35, já veteranos nestas andanças, com aquelas que vão ser as suas 12.ª e 8.ª participações, respetivamente.

Percurso etapa a etapa

A Volta a França de 2024 disputa-se um pouco mais cedo que as datas habituais, por força dos Jogos Olímpicos de Paris’2024. É também por este motivo que a corrida não termina em Paris, o que vai acontecer pela primeira vez na sua longa história de mais de 120 anos. As primeiras pedaladas serão dadas este sábado, dia 29 de junho, para a corrida ter o seu fim dia 21 de julho, em Nice e também com outra novidade: a última etapa não será a da habitual consagração, mas sim um contrarrelógio que pode até decidir o vencedor.
O início será de novo fora do território francês, desta vez em Itália, mais concretamente em Florença. Será, de resto, a primeira vez que o Tour começa em território italiano, naquela que é a 26.ª vez que a corrida começa em terras estrangeiras.
Em traços gerais, o Tour de 2024 apresenta o seguinte figurino: 3498 quilómetros, com 52.230 metros de desnível positivo, oito etapas ditas planas, quatro de média montanha, sete de alta montanha (com quatro delas em chegadas em alto) e dois contrarrelógios. E logo desde o primeiro dia que a corrida promete, já que a ligação Florença-Rimini é um carrossel de sobe e desce.
Quer saber o percurso, etapa a etapa? É só ler as linhas abaixo, numa análise da autoria de Marques dos Santos.
Etapa 1: Florença a Rimini (206 km)
Sem tempo a perder ou para "ganhar pernas", o arranque do Tour colocará desde logo em alerta os homens da geral com uma etapa de constantes altos e baixos. No total, são sete subidas categorizadas, com a maior dureza a ficar reservada para a última, que conduzirá os ciclistas até São Marino. Depois disso, há uma longa descida até à meta, pelo que será na ascensão final que o pelotão fará a seleção natural dos candidatos.
Aposta: Remco Evenepoel (Soudal Quick-Step)

Etapa 2: Cesenatico a Bolonha (200 km)
Depois de uma montanhosa tirada inaugural, o segundo dia da Volta à França continuará por estradas italianas e novamente com terreno acidentado, o que vai adiar por mais um dia a entrada em ação dos sprinters. Embora não sejam esperadas diferenças entre os que batalham pela classificação geral, o circuito final, com duas subidas ao Santuário de San Lucas (1,9 km a 10,6%), será ideal para os elementos mais explosivos do pelotão tentarem a vitória na etapa.
Aposta: Mathieu Van der Poel (Alpecin)

Etapa 3: Piacenza a Turim (229 km)
Depois do sofrimento inicial, eis que chega finalmente o primeiro dia para os velocistas de elite em prova. Na etapa mais longa desta edição, haverá terreno plano do princípio ao fim e com as equipas dos sprinters ainda frescas, a fuga do dia estará, à partida, condenada ao insucesso. É expectável uma batalha entre os mais rápidos do pelotão na chegada a Turim, naquela que será a primeira oportunidade Mark Cavendish chegar à 35.ª etapa no Tour.
Aposta: Jasper Philipsen (Alpecin)

Etapa 4: Pinerolo a Valloire (138 km)
Da etapa mais longa para uma das mais curtas, com o pelotão a pedalar em direção a França ao quarto dia de prova para enfrentar as primeiras altas montanhas que a presente edição do Tour tem para oferecer. Com duas segundas categorias antes da mítica ascensão ao Galibier – assim as condições climatéricas o permitam -, o alívio das pernas dos ciclistas chegará apenas nos 20 km finais em descida até à meta. Antes disso, contudo, espera-se uma acesa batalha entre os favoritos, num dia que ajudará a perceber o que poderemos esperar daqui para a frente na luta pela geral.
Aposta: Tadej Pogacar (UAE Emirates)

Etapa 5: Saint-Jean-de-Maurienne a Saint-Vulbas (177 km)
Após uma breve, mas intensa passagem pelos Alpes, o Tour regressa a terreno plano na quinta etapa. Apesar das duas subidas categorizadas, os sprinters não terão dificuldades em sobreviver e em assegurar o seu lugar na luta pela vitória no fim do dia, até porque o trajeto permitirá às suas equipas controlar a fuga.
Aposta: Mads Pederson (Lidl-Trek)

Etapa 6: Mâcon a Dijon (163 km)
Pelo segundo dia consecutivo, os mais rápidos do pelotão enfrentam nova etapa bem ao seu jeito. A fuga poderá sonhar com algo mais neste dia, mas aqueles que lutam pela camisola verde não deverão perder mais esta oportunidade para tentar a subida ao pódio no final da tirada.
Aposta: Arnaud de Lie (Lotto Dstny)

Etapa 7: Nuits-Saint-Georges a Gevrey-Chambertin (25 km - CRI)
O primeiro contrarrelógio individual da Volta à França surge ao sétimo dia de competição, mas o percurso não deixa antever grandes diferenças entre os principais favoritos. A única dificuldade surge sensivelmente a meio do trajeto, com 1,6 km em subida a 6,1% de inclinação.
Aposta: Remco Evenepoel (Soudal Quick-Step)

Etapa 8: Semur-en-Auxois a Colombey-les-Deux-Églises (176 km)
Com a primeira semana do Tour a aproximar-se do final, a oitava etapa apresenta-se como a primeira oportunidade séria para uma fuga ter sucesso. As cinco subidas categorizadas nos dois primeiros terços da tirada podem causar estragos nos velocistas, embora haja tempo depois disso para ainda anular os fugitivos e assegurar um final ao sprint.
Aposta: Simon Geschke (Cofidis)

Etapa 9: Troyes a Troyes (199 km)
Antes do primeiro dia de descanso, a Volta à França não terá alta montanha para oferecer aos adeptos, mas haverá algo de completamente novo nesta grande: o sterrato. No total, o circuito da etapa englobará 14 setores de batalha dos ciclistas com a gravilha, com algumas subidas categorizadas pelo meio. Será um teste duro e promete uma etapa pródiga em situações inesperadas.
Aposta: Tadej Pogacar (UAE Emirates)

Etapa 10: Orléans a Saint-Amand-Montrond (187 km)
De volta após um merecido dia de descanso, o pelotão arranca a segunda semana da prova com mais uma etapa plana que, olhando para o perfil, colocará de novo a atenção nos sprinters. Mas isso é a teoria, porque a prática pode trazer resultados bastante diferentes, uma vez que os ciclistas vão percorrer boa parte do percurso em estradas expostas ao vento, o que pode levar a cortes no pelotão e apanhar desprevenidos os mais desatentos.
Aposta: Jasper Philipsen (Alpecin)

Etapa 11: Évaux-les-Bains a Le Lioran (211 km)
Depois de várias tiradas em terreno geralmente plano, o Tour volta às montanhas com uma etapa que promete uma batalha intensa entre os melhores trepadores. As quatro subidas em rápida sucessão já nos 50 km finais não vão permitir qualquer descanso aos ciclistas e a vitória deverá ser discutida entre os favoritos, até porque as diferenças ainda não devem ser muitas nesta fase, limitando por isso as hipóteses de uma fuga vir a vingar.
Aposta: Primoz Roglic (Red Bull-BORA-hansgrohe)

Etapa 12: Aurillac a Villeneuve-sur-Lot (204 km)
Não sendo uma etapa completamente plana, com três subidas categorizadas nos dois primeiros terços do percurso, prevê-se uma batalha intensa entre a fuga e as equipas de sprinters. Ainda assim, a nossa aposta recai sobre os velocistas, uma vez que não é expectável que as ascensões sejam feitas a um ritmo capaz de os sufocar, embora a fuga já tenha sido feliz nestes terrenos.
Aposta: Arnaud de Lie (Lotto Dstny)

Etapa 13: Agen a Pau (171 km)
Mais um dia e mais uma oportunidade para os sprinters batalharem entre si. As subidas já numa fase adiantada da etapa podem deixar alguns velocistas mais frágeis neste terreno para trás, mas os candidatos à camisola verde estarão certamente na luta pela vitória.
Aposta: Dylan Groenewegen (Team Jayco AlUla)

Etapa 14:  Pau a Saint-Lary-Soulan/Pla d'Adet (152 km)
Esta não deixa qualquer margem para dúvidas: é para os homens da geral. A primeira etapa nos Pirineus tem chegada no alto de Pla d’Adet, naquela que será a segunda categoria especial do dia - depois do sempre temível Col du Tourmalet -, a que se junta ainda uma segunda categoria pelo meio. Com a prova a entrar na fase decisiva, esta será a segunda grande oportunidade para os favoritos estabeleceram diferenças entre si, mais de 10 dias depois da ascensão ao Galibier, na quarta etapa.
Aposta: Tadej Pogacar (UAE Emirates)

Etapa 15: Loudenvielle a Plateau de Beille (198 km)
O Dia da Bastilha poderá ser de celebração para os franceses, mas para o pelotão do Tour será sobretudo de sofrimento. Com quatro montanhas de primeira categoria antes de uma categoria especial para fechar a contenda, o dia será novamente para os homens de geral cavarem fossos ou recuperarem de uma prestação infeliz no dia anterior. A fuga deverá ser numerosa, até porque as equipas dos favoritos também se devem infiltrar na mesma, pelo que não será descabido que venha a ter sucesso.
Aposta: Neilson Powless (EF Education - EasyPost)

Etapa 16: Gruissan a Nîmes (187 km)
Na ressaca de etapas duras nos Pirineus e de novo dia de descanso, os sprinters poderão respirar de alívio com o regresso momentâneo ao terreno plano. Contudo, à semelhança da 10.ª tirada, o vento voltará a ser um fator a ter bastante em conta e que poderá causar cortes no pelotão. Em 2008, venceu um tal de Mark Cavendish em Nimes e consta que o britânico procura fazer história neste Tour...
Aposta: Mark Cavendish (Astana)

Etapa 17: Saint-Paul-Trois-Châteaux a SuperDévoluy (178 km)
Numa tirada feita quase sempre a subir, embora as ascensões categorizadas surjam apenas nos últimos 40 km, o percurso parece ideal para a formação de uma fuga numerosa, da qual provavelmente sairá o vencedor. As dificuldades no terço final da etapa, que marcará a estreia do Superdévoluy na Volta à França, tratarão de fazer a seleção no grupo.
Aposta: Magnus Cort (Uno-X Mobility)

Etapa 18: Gap a Barcelonnette (179 km)
Uma etapa de sobe e desce constante, mas sem as dificuldades necessárias para os favoritos entrarem em ação a todo o gás. Nesse sentido, o dia deverá voltar a sorrir à fuga, com os ciclistas das clássicas a assumirem-se como grandes candidatos. Não seria também um mau dia para o nosso Rui Costa tentar mais um brilharete.
Aposta: Rui Costa (EF Education - EasyPost)

Etapa 19: Embrun a Isola 2000 (145 km)
Já com o fim da prova a vista, o pelotão ataca finalmente os Alpes. A etapa é das mais curtas, mas as dificuldades não são para os fracos de espírito. Com duas categorias especial e uma chegada em alto, os ciclistas vão ultrapassar por três vezes os 2.000 metros de altitude, pelo que os trepadores mais frágeis nestes terrenos terão de ter especial atenção. Apesar da fase adiantada da competição, os favoritos deverão querer juntar o ganho de tempo à vitória na etapa.
Aposta: Jonas Vingegaard (Visma)

Etapa 20: Nice a Col de la Couillole (133 km)
A penúltima etapa do Tour podia perfeitamente ser uma tirada do Paris-Nice. No total, há quatro contagens de montanha, três delas de primeira categoria, e uma chegada em alto. A fuga poderá ser bem-sucedida, mas isso dependerá muito do que ainda estiver em discussão na classificação geral.
Aposta: Tadej Pogacar (UAE Emirates)

Etapa 21: Monaco a Nice (34 km - CRI)
Como já havia sido anunciado, esta edição da Volta à França será a primeira a não terminar em Paris, não havendo por isso lugar à tradicional etapa de consagração. Desta feita, não há lugar a festejos antecipados, já que haverá um contrarrelógio individual para fechar as contas da classificação. Com setores em ascensão e descidas técnicas, os trepadores com capacidade no esforço individual levarão a melhor. Veremos se não se decide o vencedor finais nestes últimos 34 quilómetros...
Aposta: Remco Evenepoel (Soudal Quick-Step)

Análise das equipas

Segunda Grande Volta da temporada, o Tour é a prova mais importante de todo o calendário mundial e, por isso, é na prova gaulesa que entram os melhores dos melhores. Tal como no Giro, em França estarão presentes as 18 WorldTeams, isto para lá de outras quatro vindas do escalão ProTeams: Lotto–Dstny e Israel–Premier Tech, as melhores desse escalão no ano passado, e ainda Uno-X Mobility e Team TotalEnergies, estas duas convidadas pela Amaury Sport Organisation (ASO).
Como habitual, abaixo poderá conhecer um pouco melhor cada uma delas, saber as suas apostas e quais os reais objetivos. Uma análise da autoria do especialista Pedro Filipe Pinto.

Team Visma | Lease a Bike

O que mais pode acontecer a esta equipa nesta temporada? Depois de conquistar as 3 grandes voltas em 2023, a Visma vai tropeçando de azar e azar e só mesmo por milagre é que consegue alinhar com o Jonas Vingegaard neste Tour. O dinamarquês, bicampeão da Volta a França, esteve 12 dias internado após uma queda na Volta ao País Basco no início de abril e, por isso, a sua capacidade física é uma autêntica incógnita, principalmente quando o objetivo é a camisola amarela.
Vai ser o alvo a abater e terá a UAE a atacá-lo logo desde o primeiro dia... Será impossível saber como irá apresentar-se. Até porque Sepp Kuss, vencedor da última Vuelta, está fora por estar doente com Covid-19, e Wout van Aert também está a regressar após queda da época de clássicas. As abelhas têm feito um esforço para tirar peso dos ombros de Vingegaard, dizendo que Jorgenson está pronto para liderar, mas... ninguém acredita nisso! O líder é Vingegaard, ponto final. E essa é a única real esperança para sair deste Tour com a camisola amarela.

UAE Emirates

Isto é muito simples: tudo o que não seja ganhar o Tour será uma desilusão brutal. Pogacar, apesar de ter feito e ganho o Giro, é o principal favorito e, depois da super exibição na Suíça, Adam Yates e João Almeida mostraram estar prontos para quaisquer incidências. Depois ainda há Ayuso, um super talento que, se for domado pelo diretor desportivo Matxin, vai ser um pesadelo para as equipas adversárias. Ah, e depois têm ainda Sivakov, Soler e Wellens. Coitado do Politt, que vai ter de andar quilómetros e quilómetros na frente do pelotão a controlar a corrida. Acredito que a UAE pode acabar o Tour com 3 corredores no top 5 e se isso não acontecer, estarão no top 10 com toda a certeza.

Team Jayco AlUla

Se estivessemos em 2019, esta equipa da Jayco dava tremendas garantias, mas como se vai correr o Tour de 2024, veremos no que dá. Simon Yates parte como líder e é candidato claro ao top 10, contudo, de há uns anos para cá, parece vir a afastar-se do seu irmão Adam, que tem conseguido muito melhores resultados na Emirates. Começar como no ano passado (2.º lugar logo na primeira etapa) seria bastante positivo. Depois, Groenewegen é o sprinter destacado para esta corrida e terá um bom comboio. Veremos se consegue ganhar alguma etapa sem colocar alguém em risco... Já Matthews terá as suas oportunidades e, se estiver no topo de forma, poderá ser a melhor opção da equipa australiana.

INEOS Grenadiers

É a minha opinião, mas considero os 4 'líderes' da UAE melhores do que o top 4 da Ineos - ou seja, Pogacar, Yates, Almeida e Ayuso > Rodríguez, Bernal, Pidcock e Thomas -, por isso é que poderá haver alguma confusão na formação britânica. Na Emirates, Pogacar é o n.º 1 indiscutível, mas na Ineos isso é diferente. No papel, Carlos Rodríguez é o líder e Pidcock quer fazer a sua corrida sem amarras, enquanto os dois campeões do Tour - Geraint Thomas (2018) e Egan Bernal (2019) - vão ver o que acontece à sua frente, sem grandes obrigações também. Não parece que organização seja a palavra de ordem, mas o top 5 será sempre o objetivo, até porque Rodríguez foi 5.º no ano passado. Mas não quero deixar passar em branco esta nova participação de Bernal no Tour, que está, aos poucos, a voltar ao seu melhor depois do acidente que quase lhe tirou a vida em janeiro de 2022.

Lidl - Trek

Por falar em lutar pela camisola verde, eis que aparece outro candidato. Mads Pedersen ganhou uma etapa em 2023 e apenas ficou atrás de Jasper Philipsen na regularidade, pelo que este ano quer dar o salto e subir ao pódio em Nice. O campeão do Mundo de 2019 vai contar com a preciosa ajuda de Stuyven e Gibbons nos quilómetros finais, sendo que o trator Tim Declercq vai ter muitas horas na frente do pelotão a controlar a distância para as fugas. Na luta pela geral, Giulio Ciccone vai mais uma vez ser o líder da equipa e tentará estrear-se no top 10 de uma grande volta. Muito promete, mas raramente cumpre. No ano passado até festejou em Paris a conquista da classificação da montanha, mas não é isso que o move no ataque a uma Volta a França.

Decathlon AG2R La Mondiale

A mudança de nome até trouxe uns resultados engraçados para uma equipa que, em casa, vai lutar principalmente por vitórias em chegadas ao sprint e, depois, tentar colocar um corredor entre os 10 primeiros. A principal esperança para a geral é Felix Gall, oitavo classificado na edição passada, mas que, nesta temporada, não tem aparecido com grande destaque. Mas entre colocar Gall no top 10 ou ganhar uma ou duas etapas, a equipa francesa escolherá sempre a segunda opção. E para isso leva o sprint Sam Bennett, que em tempos já foi o melhor do Mundo e este ano leva 5 vitórias, e ainda nomes importantes para fugas como Nans Peters e Paul Lapeira - este jovem de 24 anos com raízes portuguesas vai estrear-se no Tour e exibir a camisola de campeão francês, que conquistou com o seu 4.º triunfo da época.

Bahrain - Victorious

Ora aqui está uma equipa que sabe as suas valências e limitações e que traz um bloco que dará garantias e possibilidades de vencer em qualquer terreno. Para a geral, Santiago Buitrago parte como líder e terá em Pello Bilbao a sua principal ajuda nas montanhas. Já Jack Haig e Wout Poels terão mais liberdade para procurarem vitórias através de fugas nas tiradas mais duras deste Tour. Por outro lado, Phil Bauhaus é o sprinter designado e terá um comboio engraçado que contará com Nikias Arndt, Fred Wright e Matej Mohoric. Este último acaba por ser o corredor mais perigoso da equipa e tem algumas etapas que lhe assentam que nem uma luva (finais em descida). Mohoric tem o objetivo de ser o primeiro camisola amarela, mas será complicado porque a UAE deverá querer endurecer bastante a corrida já no sábado.

Soudal Quick-Step

O paradigma nesta equipa, a 'boa e velha' Quick-Step, tem mudado completamente nos últimos anos e tudo se deve a um menino chamado Remco Evenepoel. O conjunto que era, temporada a temporada, o mais vencedor, começou a transformar-se numa equipa moldada para ganhar grandes voltas porque tem nas fileiras um super talento. A primeira prova foi dada com a conquista da Volta a Espanha de 2022 e, agora, o prodígio belga de 24 anos quer estrear-se em grande no Tour. Para isso traz um bloco completamente focado em si, com Hirt, Van Wilder e, principalmente, Mikel Landa a serem os seus homens de confiança. As fichas estão tão apostadas em Evenepoel que um dos melhores sprinters do Mundo, Tim Merlier, ficou em casa...

Red Bull-BORA-hansgrohe

Mais uma oportunidade para Primoz Roglic ganhar o Tour e, quem sabe, a melhor desde que perdeu a camisola amarela na penúltima etapa de 2020. O esloveno trocou de equipa, é o líder indiscutível da agora denominada Red Bull-BORA-hansgrohe e planeou toda a temporada para se apresentar na melhor forma possível no arranque de Florença. As muitas quedas que sofreu ao longo da época têm sido um pesadelo, mas nenhuma delas deixou mazelas sérias, pelo que é visto como o principal rival aos monstros Pogacar e Vingegaard. A Bora foi construída à sua volta e terá dois grandes braços direitos, com Vlasov e Jai Hindley a apresentarem-se num bom momento. Jungels, Denz e Sobrero terão outro tipo de funções, enquanto Danny van Poppel vai tentar intrometer-se nos sprints com a ajuda de Marco Haller.

Groupama - FDJ

Aquele que, em tempos, foi visto como a grande esperança francesa, parece estar prestes a ser ultrapassado dentro da própria equipa. David Gaudu vai de desilusão em desilusão e esta temporada ainda não terminou uma prova por etapas dentro dos 10 primeiros - o melhor que fez foi o 14.º lugar na Volta à Romandia! O 9.º lugar na edição passada do Tour foi resultado de um autêntico 'iô-iô', mas o fio pode partir-se este ano porque Lenny Martinez impõe-se cada vez mais como um dos melhores trepadores gauleses. Aos 20 anos, o jovem, que leva 5 vitórias esta época, vai estar à espera de um pequeno deslize do líder para saltar para a ribalta e assumir a liderança. De resto, atenção a Grégoire, muito forte em subidas curtas e inclinados, e Valentin Madouas. Já 'King' Kung é uma máquina de guerra e, para além dos contrarrelógios, vai tentar a sorte com ataques de longa distância.

Alpecin - Deceuninck

No ano passado toda a gente dizia que, pelo que fez na Volta a França - 4 vitórias -, Jasper Philipsen era o melhor sprinter do Mundo, mas, passados cerca de 11 meses, já há mais dúvidas em relação a isso. Mas atenção, para além da potência do belga, o que fez a diferença foram os lançamentos de Mathieu van der Poel, que tiveram tanto de louco como de perfeito. A dupla está unida de novo e, por isso, Philipsen, que pouco se mostrou depois de ganhar a Milan-San Remo, parece partir como o alvo a abater nas chegadas em pelotão compacto. Vai ser engraçado ver o arco-íris a abrir caminho! Porém, esse arco-íris vai querer comer também! Mathieu van der Poel estará em crescendo de forma em direção aos Jogos Olímpicos e, nas duas últimas semanas, vai tentar picar o ponto. Soren Kragh Andersen e Axel Laurance, vencedor da Volta à Noruega, são outros homens a ter em conta no que às fugas diz respeito.

EF Education - EasyPost

Muita gente para ganhar etapas e pouca para ajudar realmente Richard Carapaz. Um corredor como o equatoriano tem sempre o pódio como o objetivo, mas a tarefa não será fácil se, aos primeiros safanões, ficar sozinho contra os blocos de UAE, Visma, Bora ou Ineos... Mas o que perde no comboio de montanha, os norte-americanos ganham na luta por vitórias, com nomes muitos fortes nesse aspeto e com Rui Costa à cabeça. Com a conquista da prova de fundo dos campeonatos nacionais, o experiente ciclista português mostrou estar completamente recuperado da queda na Volta ao Algarve e tenciona voltar às vitórias no Tour 11 anos depois. Mas com o mesmo objetivo vão Neilson Powless, Ben Healy, Sean Quinn e Alberto Bettioll, tudo malta para ir para as fugas. Marijn van den Berg vai procurar surpreender nos sprints, enquanto Bissegger é sempre alguém a ter em conta nos contrarrelógios.

Lotto Dstny

Finalmente, temos o touro! Arnaud de Lie estreia-se em grandes voltas e vai mostrar-se ao grande público. O talentosíssimo corredor de 22 anos é uma diamante em bruto e pode muito bem ser a grande figura dos sprints nesta Volta a França. A exibição no campeonato nacional belga, no qual arrancou mais cedo e ganhou em potência 'só' a Philipsen, Meeus, Nys, Van Aert e Merlier, é prova de que temos aqui um caso sério. Ele e Van Gils, que tentará a sorte em algumas etapas de montanha, são as únicas esperanças da Lotto nesta corrida.

Israel - Premier Tech

Cresci a admirar Froome, mas já chega... Está a encher os bolsos de dinheiro, mas já não é um corredor competitivo. Pena aquela queda em 2018, quando ia a caminho do 5.º Tour conquistado. É dos melhores de sempre, mas deixá-lo de fora foi a melhor opção para a Israel, isto porque há muito se dizia que iria ser o líder. Esse papel foi entregue a Derek Gee, que o agarrou com unhas e dentes no Critérium du Dauphiné, onde fechou o pódio. Depois do super Giro que fez em 2023, o canadiano de 26 anos reapareceu em grande e vai estrear-se na Volta a França com aspirações ao top 10. E merece tudo, é adorável, este rapaz, pá! Contudo, o foco da equipa estará mais na conquista de etapas, com Stephen Williams e Neilands a serem reais ameaças nas fugas e Ackermann a tentar intrometer-se nas chegadas ao sprint.

Cofidis

Guillaume Martin é um corredor que praticamente nos esquecemos que existe, mas a verdade é que chega ao Tour e... fecha top 10. O filósofo do pelotão defende o 10.º lugar da época passada, mas dependerá apenas de si, porque a equipa não vai ficar à sua espera, visto que Izagirre, Herrada, Geschke e Zingle vão procurar as fugas para tentarem triunfar dessa forma. Contudo, a grande esperança da formação francesa é o sprinter Bryan Coquard, que tem o sonho de conquistar a camisola verde e, por isso, estará sempre na luta dos sprints. Em 2023 ficou em 3.º na luta pela camisola verde e o melhor que conseguiu foi um quarto lugar em etapa. Vai procurar a sua primeira vitória no Tour.

Movistar Team

O nome do documentário da Movistar - 'El dia menos pensado' - diz muito sobre as táticas desta equipa ao longo dos anos, mas também o que é que se pode fazer contra monstros como Pogacar e Vingegaard? Às vezes é preciso um pouco de loucura. O problema é que essa loucura que Valverde tinha, falta a Enric Mas, um puro trepador (dos melhores do mundo), mas que não consegue fazer a diferença frente aos principais adversários. A queda e abandono na primeira etapa do Tour passado (não terminou também em 2022) ficaram marcados na memória do castelhano de 29 anos, que vai tentar pelo menos replicar o seu melhor resultado - 5.º lugar. Tendo em conta a concorrência, é melhor não elevar muito as expectativas, até porque o suporte não é o melhor. Veremos se Nelson Oliveira vai ter liberdade e capacidade para ir em busca de vitórias, com Lazkano e Aranburu a serem os mais fortes da Movistar para as fugas. No sprint vão tentar a sorte com Gaviria, que não ganha no Tour desde 2018.

Arkéa - B&B Hotels

Não quero ser mauzinho, mas só um milagre vai fazer com que a Arkéa saia do Tour com nota positiva. Sendo da casa, o objetivo passará por estar muitas vezes na fuga e ver se a sorte lhes cai do céu, porque nos frente a frente com os pesos pesados vai ser complicado. O líder da equipa é o sprinter Arnaud Démare, que o melhor que conseguiu esta época foi um 5.º lugar na primeira etapa da Volta ao Algarve. Por isso, acredito que as grandes esperanças estejam depositadas em Luca Mozzato e Kévin Vauquelin, que conseguiram os melhores resultados da equipa esta época, quando fizeram 2.º na Volta a Flandres e Flèche Wallonne, respetivamente.

Intermarché - Wanty

Lembram-se da forma como defini Guillaume Martin? Louis Meintjes é muito parecido. Parece que só corre nas grandes voltas e sabemos sempre onde ele está - a fechar o grupo dos favoritos. O pequenino sul-africano terminou a Volta a França 4 vezes e só por uma vez ficou fora do top 10 (14.º em 2021). Não se pode esperar grande espetáculo deste trepador, mas uma coisa é certa: ele vai lá estar quase sempre! Espectáculo é o que Biniam Girmay pode dar se estiver de volta aos 'bons velhos tempos'. Os resultados recentes deram alguma confiança ao eritreu de 24 anos, que, se tiver boas pernas, vai lutar pela camisola verde. Se Bini falhar, atenção a Gerben Thijssen, sprinter que foi o primeiro camisola amarela na Volta ao Algarve.

Team dsm-firmenich PostNL

Nestas muitas análises que já fiz, poucas foram as vezes em que elogiei a dsm e... esta não será uma delas. Ora, então vamos por partes. O líder Romain Bardet vem de um 9.º lugar no Giro e o top 10 é quase impossível. Warren Barguil vai tentar a sorte em fugas mas não ganha desde abril de 2022 e, em grandes voltas, desde o Tour de 2017. O sprinter Fabio Jakobsen, a única vez que ficou dentro do top 100 da etapa foi numa chegada compacta na qual não foi além do 22.º posto. Degenkolb vai desgastar-se a tentar lançar Jakobsen. De Welten, Van den Broek e Eekhoff pouco se pode esperar. Sobra Oscar Onley, jovem britânico de 21 anos que tem feito uma excelente temporada e pode estar na luta pelo top 15 na sua estreia no Tour. Um nome a ter em conta.

Astana

Podia fazer copiar e colar aqui a análise à Astana do guia da temporada passada. Era suposto ser a última oportunidade de Cavendish superar Eddy Merckx no número de vitórias em etapas da Volta a França (estão empatados com 34), mas a fratura da clavícula direita logo à oitava tirada deixou uma espinha encravada na garganta do britânico de 39 anos. A equipa cazaque deu-lhe mais um ano de contrato e ainda lhe ofereceu o melhor lançador do Mundo - Morkov -, que tanto o ajudou nos 4 triunfos de 2021. As duas vitórias em 2024 mostram que Cav ainda consegue superiorizar-se, mas a concorrência não dará borlas... Com toda uma equipa virada para o sprint, Vinokourov leva o sempre perigoso Lutsenko para tentar sacar uma vitória através de fugas e ainda o talentoso trepador Harold Tejada.

Uno-X Mobility

Ao contrário da dsm, aqui está uma equipa de que falo quase sempre bem, porque... fazem as coisas bem. Este projeto está bem construído e aposta na prata da casa para tentar ter sucesso. Tobias Halland Johannessen está a ser polido para vir a ser um grande voltista e vai partir como líder da equipa para a montanha. Mas os noruegueses trocam qualquer top 10 por uma ou duas vitórias de etapa. Magnus Cort, Waerenskjold e Rasmus Tiller vão andar muitas vezes na frente, enquanto Kristoff vai tentar andar para trás no tempo para voltar a ganhar na Volta a França.

TotalEnergies

Steff Cras era um dos corredores que eu na época passada apontava ao top 10, mas uma queda tirou-o da corrida logo à oitava etapa. Contudo, na Volta a Espanha voltou bem e terminou no 11.º posto. Parecia ter a época estragada depois daquela queda no País Basco (ficou pior do que Vingegaard), mas voltou na Volta à Eslovénia e mostrou-se bem. Posto isto, não acredito no top 10, mas acredito que Cras será um nome a ter em conta nas fugas dos dias de montanha. No entanto, Mathieu Burgaudeau, o Alaphilippe da Wish (com todo o respeito!), é um corredor super talentoso e vai tentar fazer das suas no seu quarto Tour.
 

Os favoritos


E agora, mesmo que isto normalmente dê para o torto - no ano passado, por exemplo -, aqui vão as nossas previsões, saídas da análise feita pelo jornalista Pedro Filipe Pinto. Daqui a 3 semanas veremos se a aposta foi certeira...

Os portugueses

Tal como em 2023, Portugal volta a ter 3 ciclistas no pelotão do Tour, mas desta feita com ambições e esperanças bem distintas. Muito por culpa da presença de João Almeida, o ciclista de maior nomeada da atualidade do nosso ciclismo.
O terceiro colocado do Giro do ano passado estreia-se na mais importante Volta do calendário internacional e, apesar de ter aqui um papel secundário, no auxílio a Tadej Pogacar, vai tentar manter o seu registo imaculado em Grandes Voltas. É que, com exceção do Giro 2022, onde abandonou, o ciclista natural das Caldas da Rainha foi sempre top-10, com o maior destaque a ir para a tal Volta a Itália do ano passado, onde conseguiu um histórico 3.º lugar.
E já que falamos em história, o que dizer de Rui Costa? Recentemente consagrado campeão nacional de estrada, o veterano ciclista que agora veste as cores da EF Education - EasyPost vai para a sua 12.ª presença no Tour, a apenas 1 do lendário Joaquim Agostinho. Com 3 vitórias em etapas em terras gaulesas, Rui Costa pode tentar a sua sorte em busca de uma eventual quarta, mas o seu papel principal será certamente a ajuda ao líder Richard Carapaz.
Situação similar encontrará Nelson Oliveira, um dos mais fiáveis (e confiáveis) da estrutura da Movistar. Aos 35 anos, vai para a sua 8.ª presença no Tour e para uma incrível 20.ª Grande Volta, sempre com papel fundamental nas esperanças da equipa espanhola. Este ano, tal como no Tour e Vuelta de 2023, será um fiel escudeiro de Enric Mas, mas poderá ter chances para brilhar nos contrarrelógios. Veremos...

História

Muita história, mas nem sempre feliz…
Sabia que os jornalistas estão diretamente ligados à história da Volta a França? Henri Desgrange, fundador do jornal "L’Auto" (o atual "L’Équipe"), decidiu colocar em prática uma ideia de um dos seus funcionários, ao acreditar que, realizando uma prova de ciclismo, poderia aumentar a circulação do jornal.
Estava-se no início do século 20, já lá vão muitos anos. A primeira edição do Tour disputou-se em 1903, sendo que a prova só vai para a estrada pela 108º vez, tendo sido interrompida por ocasião das duas Grandes Guerras (1915 a 1918 e 1941 a 1946).
A ideia de associar um evento como a Volta a França a um jornal também de grande tiragem foi seguida em outros países. Em Itália, o Giro é organizado pela empresa que detém a "Gazzetta dello Sport", sendo que no nosso país, a maioria das edições da Volta a Portugal teve igualmente jornais por trás, como o "Diário de Notícias" e o "Jornal de Notícias".
O Tour foi, de resto, um tremendo êxito em várias frentes desde as primeiras edições, uma aposta ganha desde a primeira hora. Houve etapas que chegaram a ter cem mil espectadores, ao passo que as vendas do "L’Auto" aumentaram em mais de 40 mil exemplares.
Inicialmente, o figurino do Tour era apenas uma competição individual, em que qualquer ciclista se poderia inscrever. Mas a partir de 1930, passou a ser disputado por equipas, no começo só formações nacionais.
O primeiro Tour contemplou seis etapas, num total de 400 quilómetros, feitos em 19 dias. A prova começou nos arredores de Paris e consagrou o francês Maurice Garin.


Sem dinheiro para comer... e até suicídio
As histórias que contam as primeiras edições da Grande Boucle são muitas delas bizarras, como a que foi ‘contada’ por Eugene Christophe. Os primeiros ciclistas a participarem no Tour tinham de ser eles próprios a fazerem a reparação da bicicleta se surgisse uma avaria, um furo. Só em 1956, foi autorizada pela primeira vez a troca de roda. Por isso, ficou para a posteridade o que o francês fez em 1913. Nesse ano, teve de fazer parte do percurso de uma etapa com a bicicleta às costas à procura de uma oficina onde pudesse remendar o pneu. Apesar do tempo que perdeu e dos dez minutos de penalização por ter tido ajuda extra, Eugene Christophe acabaria em sétimo da geral.
Aliás, nos primeiros anos da Volta a França muitos dos ciclistas participavam como ‘aventureiros’, sem ajudas, sofrendo autênticos calvários, sem dinheiro para dormirem em hóteis ou simplesmente para comerem.
Há muitas outras histórias. Nem todas com um final feliz. Há cinco ciclistas que ganharam o Tour e que depois não mais voltaram a participar nele. O caso mais recente foi o do britânico Bradley Wiggins, hoje comentador da modalidade. Mas nem todos ficaram para ver quem o sucederia no palmarès. É o caso de Rene Pottier, campeão da edição 1906. O francês, conta-se, suicidou-se pouco depois de vencer a prova, ao descobrir que, enquanto corria o Tour, a sua mulher o traía.
Morte e doping
Como quase tudo na vida, há sempre dois lados. O bom e o mau. O Tour não foge à regra. A morte e o doping têm sido as páginas negras da prova.
O primeiro ciclista a falecer durante a corrida foi o espanhol Francisco Cepeda, em 1935, devido a uma queda. Mas foi o francês Adolphe Heliere a abrir verdadeiramente a lista de falecidos no Tour. Ainda que não tenha morrido durante a corrida propriamente dita, o jovem de apenas 22 anos faleceu em 1910 no dia de descanso, quando estava numa praia em Niza. Reza a história que terá morrido afogado, após sofrer uma congestão, provocada por uma picada de uma alforreca. O italiano Fabio Casartelli foi o último a falecer em competição, em 1995.
O outro lado negro do Tour é o doping. Três campeões da classificação geral perderam os seus títulos por doping: o norte-americano Floyd Landis em 2006, o espanhol Alberto Contador em 2010 e o norte-americano Lance Armstrong, que perdeu todos os sete títulos entre 1999 e 2005, depois de ter confessado o uso de substâncias dopantes. "Vencer a Volta da França sem se dopar é impossível", disse o texano.

Fica também o caso Festina em 1998. A equipa foi expulsa depois do mega escândalo da descoberta de substâncias dopantes em vários carros e acompanhantes da formação.
Mas o recurso a artifícios para ser melhor que o adversário aconteceu quase praticamente desde os primórdios do Tour. Os primeiros ciclistas consumiam álcool e usaram éter, para aliviar a dor.
E em mais de 100 anos de história, as greves também não faltaram. Greves dos ciclistas e de fora da corrida. Veja alguns desses momentos:
 
Em 1982, os metalúrgicos em greve pararam a etapa do contrarrelógio por equipas.
Em 1987, os fotógrafos entraram em greve, dizendo que os carros que transportam os convidados estavam a atrapalhar.
Em 1988, a corrida entrou em greve em protesto a respeito de um teste antidoping feito ao espanhol Pedro Delgado.
Em 1990, os organizadores tiveram conhecimento de um bloqueio por parte dos agricultores nos arredores de Limoges e desviaram a corrida.
Em 1991, os ciclistas recusaram-se a correr por 40 minutos porque um ciclista, o suíço Urs Zimmerman, foi penalizado por optar ir ele a conduzir o seu carro em dia de transfer, em vez de ir no avião com o restante pelotão.
Em 1992, activistas do movimento separatista basco bombardearam alguns os carros de adeptos durante a noite.
Em 1996, os ciclistas entraram em greve perto de Bordéus após terem realizado testes antidoping na noite anterior.
Em 1999, bombeiros em demonstração pararam a corrida e atiraram bombas de mau cheiro.
Chris Froome continua a uma vitória do quarteto das cinco
Com a anulação das sete vitórias conquistadas por Lance Armstrong, continuam a prevalecer as cinco obtidas por quatro ciclistas como o recorde de títulos no Tour: Jacques Anquetil (1957, 1961 a 1964), Eddy Merckx (1969 a 1972 e 1974), Bernard Hinault (1978, 1979, 1981, 1982 e 1985) e, por último, Miguel Indurain (1991 a 1995).
Atualmente, o mais próximo que está deste grupo de elite é Chris Froome, com quatro triunfos (2012, 2015, 2016 e 2017), sendo que em 2019 Egan Bernal tornou-se no primeiro colombiano a vencer o Tour, feito também conseguido por Tadej Pogacar em 2020 em relação à Eslovénia, sendo que o ciclista da Emirates bisou no ano seguinte.
Jonas Vingegaard é o primeiro ou o segundo dinamarquês campeão?
Bjarne Riis venceu o Tour de 1996, tornando-se no primeiro dinamarquês a inscrever o seu nome no palmarés do Tour. Mas será que esta vitória valeu mesmo? É que anos mais tarde, o antigo ciclista admitiu ter ganho a corrida com recurso a substâncias dopantes, mas a UCI decidiu manter a classificação, pelo que Jonas Vingegaard tornou-se em 2022 oficialmente no segundo ciclista da Dinamarca a sagrar-se campeão, para no ano seguinte revalidar o título.
Veremos a consagração de Cavendish?
Será que Mark Cavendish vai tornar-se no único recordista de triunfo em etapas? É uma das grandes incógnitas da Volta a França de 2024. O britânico, de 39 anos, soma 34 vitórias, as mesmas que tem Eddy Merckx.

As Camisolas

Portugueses no Tour

Ao longo da história do Tour, 31 ciclistas portugueses tiveram a oportunidade (e o privilégio) de pedalar nas estradas francesas. Entre eles, 16 participaram apenas por uma vez, mas muitos outros deixaram marca na história daquela que é considerada a prova rainha do ciclismo.
Alves Barbosa (correu em 4 edições, como José Freitas Martins e Orlando Rodrigues) abriu as hostilidades em 1956. E fê-lo com um brilhante 10º lugar na geral final. Nas edições seguintes, José da Silva, Antonino Batista e José Sousa Cardoso juntaram-se a Alves Barbosa, mas só em 1969 o ciclismo português começou a ganhar alguma ‘fama’ no Tour. Tudo por culpa de um ‘tal’ de… Joaquim Agostinho.

O malogrado corredor, que faleceu em 1984 após uma queda na Volta ao Algarve, detém o recorde de participações lusas (13) no Tour e, logo na estreia, tornou-se no primeiro português a ganhar uma etapa. Voltaria a vencer uma etapa nessa mesma edição e terminou em 8º, na primeira das 8 vezes em que fez ‘top-10’. Mas o auge de Agostinho no Tour estava guardado para 1978 e 1979 com dois terceiros lugares. Em 1979 venceu a etapa do Alpe d’Huez, feito que está eternizado com um busto de Agostinho, em bronze, na 14ª curva da mítica subida. Agostinho ainda correria em mais três edições e despediu-se do Tour em 1983, com 40 anos.
Em 1984, Paulo Ferreira não terminou a sua única presença no Tour, mas juntou-se ao restrito lote de lusos com vitórias em etapas, levando a melhor na 5ª tirada. Entre o final da década de 80 e o início da década de 90, Acácio da Silva foi o único português no pelotão, mas fez história, tornando-se no primeiro (e até hoje, único) luso a envergar a camisola amarela no Tour. Aconteceu durante 4 dias, em 1989, após a vitória na 1ª etapa – já havia ganho duas nos dois anos anteriores. Ainda que com resultados modestos na geral (o melhor foi um 61º lugar), as seis participações fazem de Acácio da Silva o 4º português que mais vezes correu o Tour.
No final da década de 90, foi Orlando Rodrigues a representar as cores nacionais e, já neste século, José Azevedo destacou-se e foi mesmo uma das figuras da corrida. Com cinco presenças consecutivas, venceu três etapas e fez duas vezes ‘top-10’ (6º na estreia em 2002 e 5º em 2004), tendo sido o fiel escudeiro de Lance Armstrong nas últimas 2 das 7 vitórias do norte-americano, entretanto retiradas por doping. Em 2006, na sua última presença no Tour, José Azevedo fez algo inédito até aos dias de hoje: foi o único luso a correr com o dorsal nº 1.
A história mais recente dos portugueses no Tour teve, além de outros nomes, quatro grandes protagonistas: Sérgio Paulinho, Rui Costa, Nelson Oliveira e Ruben Guerreiro.
Sérgio Paulinho estreou-se no Tour em 2007, venceu uma etapa em 2010 e, com 7 presenças, é o 3º luso com mais edições nas pernas, as mesmas de Nelson Oliveira, que correu o Tour pela primeira vez em 2014 e que no ano passado acabou em 53.º. Em 2024, voltará a estar presente e isolar-se-á na 3.ª posição nesse particular, apenas atrás de Joaquim Agostinho (13) e Rui Costa (11).
Já com três vitórias em etapas, Rui Costa vai para a sua 12.ª participação e ficará apenas a uma presença de igualar o recordista Joaquim Agostinho. Por fim, Ruben Guerreiro. O agora ciclista da Movistar mostrou-se em bom plano em 2021, acabou em 18.º - igualou o melhor registo de Rui Costa -, mas as duas presenças seguintes foram para esquecer, com dois abandonos. Este ano, com muitos problemas físicos, não estará presente.

Historial dos vencedores

A lista de vencedores do Tour ficará para sempre marcada pelo 'apagar' dos registos de Lance Armstrong. Vencedor de sete edições consecutivas, entre 1999 e 2005, o norte-americano era o dono e senhor da prova gaulesa, com mais duas conquistas do que os históricos Jacques Anquetil, Eddy Merckx, Bernard Hinault e Miguel Indurain, mas acabou por ficar sem todas as suas vitórias por conta da confissão do uso de substâncias dopantes.
Como seria de esperar, os franceses, com 36 vitórias, são os mais ganhadores, mas a verdade é que não conseguem um triunfo em Paris desde 1985, no último dos cinco triunfos de Bernard Hinault. E muito provavelmente também não será este ano...
O detentor do título é o dinamarquês Jonas Vingegaard, que no ano passado revalidou o título de 2022. Uma conquista que o colocou a par de outros 13 ciclistas que conseguiram bisar, juntando-se na altura a um lote onde entra Tadej Pogacar, o seu rival deste ano - outra vez -, mas outros nomes de destaque, como Alberto Contador ou os lendários italianos Gino Bartali e Fausto Coppi ou o francês Laurent Fignon.
 
Caso este ano algum dos dois (Vingegaard ou Pogacar) consiga o hat-trick, irá fazer algo que até agora apenas outros 3 ciclistas conseguiram. Philippe Thys (1913, 1914 e 1920), Louison Bobet (1953, 1954 e 1955) e Greg LeMond (1986, 1989 e 1990) - isto para lá dos outros 5 que têm 4 ou mais triunfos.

Textos e recolha de dados Ana Paula Marques, Marques dos Santos e Pedro Filipe Pinto
Fotografia Tour de France, Getty Images e Reuters | Edição Fábio Lima | Webdesign João Silva
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