O Decreto-Lei n.º 267/95, de 18 de outubro, que estabelece o estatuto dos dirigentes desportivos em regime de voluntariado e respetivo regime de apoio, é daqueles diplomas que faz justiça ao provérbio “muito prometer, é sinal de pouco dar”.
Diz o legislador que “considera-se dirigente desportivo em regime de voluntariado qualquer pessoa que se encontre, de modo efetivo e sem remuneração, no exercício de funções em órgãos estatutários do Comité Olímpico de Portugal, da Confederação do Desporto de Portugal, de federações desportivas dotadas de estatuto de utilidade pública desportiva ou de associações nestas últimas inscritas”.
Apesar de exultar a relevância da função desempenhada pelos dirigentes desportivos naquelas circunstâncias, a sua concretização, volvidas três décadas, tanto quanto se sabe circunscreveu-se à criação do Gabinete de Apoio ao Movimento Associativo sob os auspícios do Comité Olímpico de Portugal, divulgada à estrutura federada em julho de 2013, contando comsubvenção estatal através do IPDJ, I.P.
O regime jurídico em apreço, gerado pelo XII Governo Constitucional, liderado por Aníbal Cavaco Silva, veio reconhecer, num registo algo arrojado, o interesse público da atividade dos dirigentes desportivos. Porém, tal reconhecimento nunca se traduziu na adoção de medidas efetivas e consistentes de apoio pela dedicação de milhares de concidadãos, cuja prestação benévola ao serviço daquele que é um dos mais dinâmicos movimentos sociais contemporâneos à escala global, representando um valor social e económico incomensurável.
Fazendo fé nos eloquentes testemunhos de vários protagonistas, registados em ações de formação promovidas pela Associação Portuguesa para o Desenvolvimento Local e dirigidas à capacitação de quadros que implementem projetos desportivos e culturais, o dirigismo desportivo voluntário já conheceu melhores dias e o futuro parece cada vez mais incerto.
Aliás, para conhecer e compreender a dimensão deste universo, a Federação Portuguesa de Futebol promoveu, em 2021, um estudo com o objetivo de reformar o estatuto do dirigente associativo em regime de voluntariado, concluindo “que, se há agente desportivo que merece ser apoiado pelos poderes públicos, esse é o dirigente desportivo em regime de voluntariado e, neste âmbito, particularmente os dos clubes desportivos não profissionais”. Ademais, alertava para “a necessidade da criação de um registo nacional dos dirigentes desportivos voluntários”, realidade que o PORDATA quantificava no ano de 2024 – sem distinguir entre os que exerciam funções a título gracioso ou profissionalizado – em 27.581 indivíduos (menos 5,4% face ao ano anterior).
Sinal dos tempos, ainda recentemente na Associação de Futebol de Lisboa ? organismo que coordena semanalmente a realização de 830 jogos de futebol a nível distrital em várias disciplinas e escalões ? foi maciçamente sufragada a linha programática que preconizava: “os Dirigentes dos Clubes foram excluídos. O que não se compreende, quando os Dirigentes desportivos contribuem para o desenvolvimento e para a prática desportiva de milhares de praticantes, com prejuízo, muitas vezes, da sua vida pessoal e profissional (...)”.
Como “a esperança é a última a morrer”, vão aumentando as expetativas suscitadas pelo recente anúncio governamental do Plano Nacional de Desenvolvimento Desportivo, que promete elevar a fasquia através da combinação do crescimento exponencial no financiamento público alocado ao desporto com a modernização do ordenamento jurídico vigente. É o momento de, finalmente, concretizar o compromisso de valorizar e dignificar o papel insubstituível e a importância social destes ativos, bem como de fazer prosperar o tecido associativo nacional desde o ponto mais setentrional de toda a Lusofonia – a aldeia de Cevide – ao meridional Ilhéu de Fora na Madeira.
Só assim conseguiremos promover a ambicionada renovação geracional e progredir no esforço de requalificação num pilar determinante do “Modelo Europeu de Desporto”, dando, dessa forma, corpo às?“recomendações dirigidas aos Estados-Membros, em linha com o princípio da?subsidiariedade, que incluem reconhecer e preservar a natureza específica do desporto e das suas estruturas baseadas no voluntariado, assim como reconhecer e apoiar, conforme adequado, o contributo de voluntários, clubes desportivos de base, famílias e comunidades locais”.
Por José Manuel Costa