O velejador norte-americano Dennis Conner, conhecido como ‘Mr. America´s Cup’, disse um dia que "só há uma coisa melhor do que ganhar: perder e voltar a ganhar". Mas a incomum derrota na Corunha confirmou o quanto esta época do Barcelona se vem transformando numa espécie de montanha-russa, cheia de ‘shuttles’ sublimes e ‘loopings’ perigosos. Depois do enorme fiasco em Paris e do luto profundo que se lhe seguiu, arrancou para uma série de vitórias gordas e que o levou à liderança provisória da liga espanhola, culminada com a goleada homérica sobre o PSG, na maior ‘remontada’ alguma vez vista na Champions. "O nunca visto", titulou então o ‘El País’ sobre a versão melhorada do milagre conseguido pelo United de Ferguson sobre o Bayern de Munique, na final da Champions de 1999, curiosamente também no Camp Nou. Após o tropeção em Paris, não faltou quem acusasse Luis Enrique de tudo e mais alguma coisa. Uns diziam que é um treinador sem cintura, com substituições de pacotilha e sem plano B, outros acusaram-no até de ter traído a ideia de jogo de Guardiola, de ter uma política de rotações difícil de decifrar, demasiada imprevisibilidade tática e de ter escolhido um mau momento para anunciar a saída em junho. O Barça é um clube vulcânico e consegue triturar até um técnico que, nos dois primeiros anos, ganhou oito dos dez troféus disputados (incluindo duas ligas espanholas, uma Champions e um mundial) e que, na época em curso, já garantiu os ‘quartos’ da Champions, a final Taça do Rei e não desiste da liga espanhola. Mas após aqueles sete minutos tresloucados que valeram três golos e os quartos-de-final, passou a ler-se que o técnico tinha ajudado a equipa a relaxar com o anúncio da sua saída e já tinha voltado a ser o grande estratega, capaz de sacar da manga o 3x4x3 em losango nunca visto desde Cruyff. De facto, a reconciliação com o manual cruyffista havia começado muito antes da eliminação do PSG. O asturiano ainda insistiu no 4x3x3 frente ao Leganés, mas como o Barça continuou a agonizar e só foi salvo por um penálti ao minuto 90, no Calderón já assumiu a defesa a três, mesmo que Sergi Roberto baixasse para fechar o corredor direito em momento defensivo. A fórmula resultou e foi sendo aprimorada nas goleadas sobre o Gijón e o Celta. Com mais um homem no miolo, recuperava as ligações e a velocidade de jogo, dava maior suporte a Busquets, libertava Messi das amarras ao corredor direito e Neymar e Rafinha podiam investir no 1x1 e tirar partido da superioridade na zona de criação. Luís Enrique não é um cruyffista puro, mas o 3x4x3 (em organização ofensiva) permite-lhe resolver o problema que surgia sempre que os adversários pressionavam alto e a bola não chegava à MSN. Foi também a partir daí que fez voltar Messi à zona central do campo e um pouco mais recuado do que vinha acontecendo quando jogava sobre a direita. Messi, que já foi extremo, falso nove, a partir daí movimentou-se mais de acordo com o dez nas costas. Os seus movimentos aleatórios desmontaram o Celta (que é uma boa equipa) e o seu segundo golo foi uma parábola.
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