Contra a corrente

Ribeiro Soares
Ribeiro Soares

As lições de uma final

Desta vez não vamos dizer mal: isto porque a final da Taça de Portugal, jogada no dia 25 de Maio1, foi um desafio muito bem disputado, com as duas equipas empenhadas na luta pela vitória até ao último fôlego, quatro bonitos golos em recuperações alternadas, emoções ao rubro a ultrapassarem o limite dos 120 minutos e, por fim, a decisão da marca dos onze metros, com 12 pontapés de penalti, todos enquadrados com a baliza (os ferros também contam) e apenas uma defesa de guarda-redes, que decidiu o jogo.

Embora os primores técnicos não tenham ultrapassado o nível a que os jogadores do Futebol Clube do Porto e do Sporting Clube de Portugal estão obrigados e nos habituaram, a influência dos treinadores e as suas intervenções marcaram decisivamente o evoluir dos acontecimentos.

Marcel Keizer, sabedor das limitações da sua equipa – tinha perdido há uma semana no Porto, embora reduzido a 10 durante mais de 70 minutos –, jogou com os trunfos que tinha, apostou nos melhores jogadores disponíveis e fez as substituições adequadas, com a surpresa de investir num segundo ponta de lança (que se chama Bas Dost) quando já tinha perdido definitivamente a luta do meio campo.

Sérgio Conceição partia em vantagem e certamente achou que era desta vez que ia acabar com a malapata dos desempates nos penaltis... O jogo deu-lhe razão, os jogadores fizeram tudo para ganhar e o domínio foi avassalador: 57%-43% em posse de bola, 26-11 em remates (16-4 na 2.ª parte e 7-2 no prolongamento), 12-1 em cantos (8-0 na 2.ª parte)!! Equilíbrio só nas faltas (19-23) e nos foras de jogo (2-1). Confiante nos seus jogadores, só fez uma substituição no tempo regulamentar e arriscou outras três no prolongamento, todas para reforçar o ataque onde, nos últmos minutos também estavam os dois centrais.

Foi um jogo impróprio para cardíacos (como soi dizer-se): para o Sporting foi uma vitória saborosíssima, que moraliza e acrescenta confiança no futuro; para o FC Porto a derrota adensa as dúvidas que pairam sobre uma equipa que perde muitos jogadores fundamentais e perspectiva a próxima época com apreensão.


Apenas algumas notas a propósito.

- Bruno Fernandes sofreu cinco faltas, algumas violentas (além de outras duas que, em nosso entender, ficaram por marcar), todas cometidas por jogadores diferentes (Alex Teles, Otávio, Militão, Danilo e Brahimi, aos 7, 10, 73, 99 e 110 minutos), demonstração clara da estratégia de condicionamento (ou inutilização?) do melhor jogador adversário, aliás dando continuidade ao que se passou há uma semana e sem que tivesse havido adequada punição nalgumas delas.

- Dois possíveis erros de arbitragem – braço de Herrena na jogada do 1.º golo e amarelo a Coates (possível vermelho) – ambos revertidos pelo VAR, mas ficam dúvidas.

- Exagero nos descontos do prolongamento (3+1 minutos) – 4 em 30 minutos, correspondentes a 12 minutos nos 90, que nunca são atingidos.

- Necessidade de cronometragem exacta nestes prolongamentos, para evitar exageradas perdas de tempo que, aliás, não aconteceram neste jogo.

- Os 30 minutos são excessivos, 20 minutos (duas partes de 10) serão suficientes, já que na maioria dos casos não há golos (talvez em 60% dos desempates) e a decisão vai para os penaltis.

- Vantagem na recuperação do "golo de ouro" – o jogo termina quando for marcado um golo – para evitar desgaste excessivo, medida particularmente importante em poules disputadas por quatro equipas com jogos de 3 em 3 dias, em que a recuperação é mais difícil (relembrem-se os város prolongamentos que Portugal teve de jogar no Europeu de França).


1 Recordo o jogo a que assisti, em 1967 (há 52 anos!) no mesmo dia 25 de Maio e no mesmo palco do Jamor, a final da Taça dos Clubes Campeões Europeus, entre Celtic de Glasgow e Inter de Milão (2-1), um desafio memorável e uma honra pela primeira vez foi concedida a Portugal. 

*Antigo colaborador de Record (1991/97) e último director da Gazeta dos Desportos (1995); escreve segundo a antiga ortografia

 

 

 
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