Norberto Mourão: «Não peço mais nada porque sou um homem feliz»

• Foto: Lusa

RECORD - Já disse várias vezes que não tem as pernas, mas tem mais vida. Explique-nos como é que se deu esse clique.

NM – Tive o acidente no caminho do trabalho para casa e a minha vida mudou completamente. Deixei o meu trabalho na pastelaria e tive de seguir em frente. O meu objetivo sempre foi fortalecer os braços e por isso apareceu a canoagem e dediquei-me completamente a ela. Antes, a minha vida era muito casa-trabalho, trabalho-casa, horários diferentes dos meus amigos, nunca saía à noite, o convívio era só ao fim-de-semana, que era quando eles tinham o dia livre. A vida era aquela monotonia. Agora tenho uma vida muito mais preenchida, faço aquilo que gosto, sinto-me bem e bastante útil e feliz. Não peço mais nada porque sou um homem feliz.

PUB

R - Acredito que foram muitas, mas qual a história que mais o marcou em Tóquio?

NM – Aquilo lá acaba por ser um Mundo aparte, nunca tinha visto nada assim. Eu costumo ver muitas pessoas com limitações quando são as provas internacionais, mas aquilo não tem nada a ver com o resto. As histórias de superação veem-se em todo o lado, mas o que eu quero destacar são os atletas nacionais. Temos atletas com uma vontade e com um empenho… lembro-me de uma rapariga do boccia com muitas limitações físicas, se não tiver o apoio na cabeça não a consegue suportar, mas estava ali com uma vontade e com um querer, sempre muito simpática a falar com toda a gente... isso mexe muito connosco, e mexeu com Alex, que ficou muito impressionado com ela. Convivemos muito com ela. É importante as pessoas conhecerem os atletas portugueses, não só eu e o Miguel Monteiro que conquistámos medalhas, mas todos os outros, porque há histórias fantásticas.

PUB

R - E qual o momento mais caricato que viveu em Tóquio?

NM – Andámos sempre na brincadeira, por isso é fácil. Houve uma notícia que saiu num jornal, não vou dizer qual, em que, em vez de estar Alex Santos, estava Alexa, e nós ainda hoje brincamos com isso. Estamos sempre a gozar com ele, até porque a Alexa é aquele aparelho que temos em casa para controlar as coisas e nós dizemos sempre que gostamos mais da Siri. Ganhou uma alcunha. Isto para além de todas as brincadeiras que nós já fazemos. Com o Ivo Quendera por perto é impossível não estar a rir.

R - Qual o sentimento na cerimónia de encerramento?

PUB

NM – Não se percebe que está vazio porque está escuro, por isso é imaginar que as pessoas estão lá. É impressionante! Tive pena de não ir ao estádio para ver as competições, mas viver aquilo ali era algo que eu queria muito, indescritível.

R - O objetivo é voltar a sentir tudo isto daqui a três anos?

NM – É claro que eu quero muito ir a Paris, vou lutar para ir a Paris, mas não quero viver o que vivi em Tóquio. Quero viver o que os outros atletas viveram nos outros Jogos. Nós estávamos muito limitados em termos de liberdade. Quero algo em pleno. Tóquio foi fantástico pelo convívio, mas queremos acrescentar o público e a liberdade, por isso é que acho que vai ser ainda mais intenso do que todos os Jogos até agora. Estão todos com muita vontade de ver as provas, nós precisamos do público, estamos ansiosos.

PUB

R - O Norberto e o Fernando Pimenta são amigos e conquistaram o bronze nos Jogos separados por um mês...

NM – Sim, ele deu-me força. Somos uma equipa, apoiamo-nos bastante. E pode dizer-se que temos uma estratégia semelhante. Ele ataca sempre no início e tenta gerir até ao fim. Eu como sou dos mais rápidos a arrancar a nível mundial, tento também começar o mais rápido possível, é o chamado ‘arrancar a matar e acabar a morrer’ e foi basicamente isso que aconteceu. É o que faço em todas as provas. Somos parecidos nisso, mas não somos os únicos.

R - Não foi o primeiro a dizê-lo, mas fez questão de o referir logo após a prova. Sente que há muita pressão para que os nossos atletas conquistem medalhas?

PUB

NM – Nós já queremos dar o máximo pelo nosso país, ninguém entra no desporto para perder. O facto de as pessoas e mesmo os nossos amigos estarem a pressionar custa. As mensagens que mandavam eram sempre ‘vais ao ouro’, ‘traz a medalha’, ‘a medalha é tua’. Isso mete uma grande pressão. Nós não precisamos que coloquem mais pressão do que aquela que colocamos em nós próprios, porque é muito fácil falhar, e foi por pouco que não falhei. Isto é tudo uma incerteza, porque todos os que lá estão trabalham para ser os melhores.

Por Pedro Filipe Pinto
Deixe o seu comentário
PUB
PUB
PUB
PUB
Ultimas de Fazemos campeões Notícias
Notícias Mais Vistas
PUB