COSTA SANTOS e FERNANDO FERREIRA enviados especiais
Rheden -- Bakero mudou de ares. Trocou Leiria por Sevilha, e por isso, integrado no plantel andaluz, rumou à Holanda para a pré-temporada do plantel comandado por Marcos Alonso.
Para trás, um princípio de época algo conturbado. Uma rescisão com eventual justa causa mas, sem dúvida, o início de uma longa "batalha" em que os tribunais serão palco a visitar, seja qual for a demanda que saia da Comissão Arbitral da Liga.
No diálogo travado, o jogador, vinte e um anos cheios de esperança e muitos sonhos para realizar, desfia um rosário longo. "Estórias" que, contadas assim, mesmo com o "carimbo" de "top secret", não se acreditam à primeira, tão incríveis são. Se transformadas em "lances de bola corrida", mereceriam, sem dúvida, o aplauso da multidão e a crítica colocá-los-ia nas primeiras páginas da "antologia".
Mas não são lances de futebol ou, se quiserem, são lances "de outros futebóis"!
Por isso é que Bakero fez as malas e partiu. Com riscos claramente assumidos mas convicto que tem armas na mão -- e testemunhos -- para demonstrar as suas razões. Alguém há-de ouvi-las!
E "enquanto o pau vai e vem", as costas de Bakero ganham força e ritmo nos muitos e variados campos de Rheden.
Num outro mundo e noutros métodos de trabalho está a procurar integrar-se. Para trás...
"Um passado que não quero esquecer enquanto as coisas não se resolverem. Depois, ficará a lição de como se é enganado por quem nesta arte é mestre! Para já, estou aqui para trabalhar, para mostrar o meu valor e lutar por um lugar na equipa. É o sonho de qualquer jogador que entra num novo clube. Porém, ao mesmo tempo, tenho a cabeça em Portugal, na expectativa da decisão da Comissão Arbitral da Liga. Se me der razão -- como espero e os factos demonstrados permitem concluir --, muito bem, ficarei em Sevilha de alma e coração, apostado em realizar uma excelente temporada; se não me for dada razão, será muito mais difícil poder continuar e cairá por terra um dos meus grandes objectivos: jogar num campeonato muito competitivo como é o de Espanha e, com isso, ficar com as portas abertas para poder triunfar fora de Portugal."
-- Não está muito confiante...
-- Até estou. Fundamentalmente, porque sei que a razão está do meu lado, conheço as coisas por dentro e por fora e não consigo esquecer a artimanha que me foi montada para me levarem a cair nela. Isso revolta-me.
Infelizmente é gente desta que faz com que o ambiente do futebol ande como ande, em Portugal! Mas terei de aguardar que tudo se resolva. Não me resta outra alternativa.
-- Estava já determinado em sair de Leiria?
-- Não, e muito menos da maneira como saí! Se há coisas que não tenho no meu feitio, na minha maneira de ser, é a ingratidão, e por isso não esqueço que a União de Leiria foi o clube que me abriu as portas da I Divisão, que me colocou na rampa de lançamento para uma bonita carreira. Não queria sair, é um facto, mas dado tudo o que se passou, com uma pessoa a não ser correcta comigo, não havia mais condições para poder continuar. Tomei a melhor decisão e, agora, só me resta aguardar que as minhas razões sejam analisadas e justiça seja feita.
-- Uma pessoa?
-- Sim. Não saí de Leiria por causa do clube, do treinador, dos sócios! Nada disso. Mais: todas estas pessoas não mereciam que eu voltasse as costas! Nada tenha contra eles, antes pelo contrário, sempre me ajudaram, me apoiaram! Saí de Leiria zangado com o presidente. Enganou-me. Não foi correcto, não foi sincero e eu não consigo encarar pessoas que não tenham esses predicados! Bartolomeu, nunca mais!
ASSINEI À PRESSA
E a assinatura? Bakero não a nega... Um contrato assinado num hotel de Leiria e, depois, a corrida ao notário para o necessário reconhecimento! Os procedimentos normais...
"Não, não foi normal, e disso me apercebi muito cedo. Por tal razão é que ainda fiz finca-pé e disse que não assinava nada sem a presença do meu representante. Mas logo fui avisado que ‘teria de ser já, se não o Mário Reis multava-me, chegaria atrasado ao treino, seria prejudicado na equipa, nem haveria tempo para estar a ler e que aquilo era a mesma coisa que tinha sido acordado’, etc., etc.! Tenho uma testemunha -- se quiser dizer o que viu e ouviu -- e chama-se Artur Meneses. Éramos só os três que estávamos no Hotel EuroSol. Fui chamado pelo presidente ao dito hotel para assinar uma coisa e, ao fim e ao cabo, assinei novo contrato."
-- No notário não lhe foi lido o contrato?
-- Não.
-- Há uma cláusula no contrato com o Sevilha que prevê a quebra do vínculo estabelecido se o problema não ficar resolvido até Dezembro...
-- É verdade. Caso não me dêem razão em Portugal, este contrato não é válido. Por isso espero que as pessoas tenham consciência daquilo que me fizeram e que digam a verdade. Não quero que me ajudem de outra forma. A verdade, a tramóia que me montaram é conhecida por mais pessoas. Directores e ex-directores. Se forem pessoas de bem, como dizem ser, não hesitarão em confirmar as minhas razões!
-- Disse que só Artur Meneses estava no hotel e agora diz que mais pessoas sabem?
-- No hotel só estava Artur Meneses, é verdade, mas outros directores e ex-directores sabem muito bem o que estava acordado e ficaram admirados com a "mudança" feita!
-- Outra situação: admite ficar sem jogar?
-- Obviamente que sim! Estou preparado para tudo e não tomei a decisão que tomei de ânimo leve. Se tiver de ficar um ano sem jogar, ficarei! Lidar com um presidente como João Bartolomeu, não!
-- Uma carreira curta e duas situações pouco comuns: de Felgueiras saiu como saiu; de Leiria, idem! Coincidências ou outra coisa mais?
-- Não sei se são coincidências ou não, o que sei é que gosto de trabalhar com pessoas sérias e a partir do momento em que não correspondem à realidade que desejo, não são sinceras para comigo, é evidente que tudo se torna muito difícil e não há mais condições para poder trabalhar nesses sítios.
-- Mas conhecia Mário Reis...
-- Conhecia-o e conheço-o, e não me custa afirmar que ele não tem culpa nenhuma daquilo que aconteceu. Em Leiria, volto a repetir, fui enganado pelo presidente e por mais ninguém. Desejo a Mário Reis muita sorte, bem como ao seu grupo de trabalho. Merecem-na.
-- É verdade que esteve com um "pé" no Sporting?
-- Não posso dizer isso, de uma forma categórica. Verdade é, sem dúvida, que o presidente da União de Leiria me ligou muitas vezes num só dia para eu me deslocar a Lisboa e assinar por um dos grandes. Depois disseram-me que era o Sporting, embora, por precaução, acrescente que nem quis confirmar essa informação.
-- E porque não foi?
-- Porque o presidente queria que fosse assinar por um clube sem a presença do meu empresário; no fundo, voltar a fazer tudo nas costas do meu representante, e comigo nada funciona assim! O meu representante é Jorge Mendes, estou com ele e vou com ele até ao fim! Devo-lhe muito. Pegou em mim no Felgueiras, agora estou onde estou e a ele o devo!
-- Fica-se com a ideia de que, em Portugal, nem um grande o seduziu...
-- Tenho um sonho desde miúdo: jogar no FC Porto. Não foi possível já, mas tenho 21 anos e muito tempo à minha frente para concretizar essa ambição. Espero que possa jogar, ganhar muita experiência e, depois, tentar essa sorte de regressar a Portugal e entrar no FC Porto.
MUDANÇAS
Novo clube, novos métodos. Tudo diferente. Desde o trabalho de campo até ao transporte para as sessões diárias. De autocarro? Não! De bicicleta! Exactamente...
"É assim mesmo, e sinto-me bem! Saímos de bicicleta para o campo e regressamos ao hotel no mesmo transporte. Faz-se bem e... faz bem!"
-- Uma boa integração? -- Aos poucos, como é normal. Estou aqui há quatro dias e, depois de o
primeiro dia ter sido algo difícil, o pior já passou. Os colegas já me estão a apoiar e espero que nos próximos dias esteja muito melhor para poder trabalhar no máximo. Quem ambiciona, como eu, um lugar no “onze” do Sevilha, não poderá pensar de outra maneira!
-- As cargas de treino...
-- Não direi que são mais puxadas que em Portugal, mas exige-se muito mais fisicamente. É a base de toda a preparação. Como estive parado muito tempo, ressenti-me nos primeiros dias mas, agora, as coisas estão perfeitamente normais.
-- Sem bola...
-- Fiz uns ligeiros toques. Não tenho pressa. Quero estar fisicamente bem para poder aspirar a participar nos jogos-treino que iremos fazer por aqui.
-- O que é que o treinador lhe disse?
-- Ainda não falei muito com ele, mas perguntou-me como me sentia e tive de lhe responder que, face à longa paragem, não poderia estar bem. Por isso estou a trabalhar a resistência e a velocidade, principalmente, para poder entrar na equipa com possibilidades de mostrar o que valho.
-- É uma ilusão o campeonato espanhol?
-- É. É dos mais competitivos do Mundo e, nele, espero poder triunfar e ajudar o Sevilha a alcançar os seus objectivos. A equipa tem excelentes condições de trabalho, há muita ambição e só desejo ser mais um a puxar para o mesmo lado!
-- Objectivos-Sevilha ou objectivos-Bakero?
-- Neste momento, objectivos do Sevilha. Mas como sou um jogador ambicioso, quero ir mais longe, no futuro! Mas para isso é necessário mostrar tudo no presente...
PARECIDO COM BAKERO
-- Orlando José Lemos Martins é... o Bakero do futebol. Vinte e um anos e dois clubes, apenas, no seu currículo: Felgueiras -- desde os 12 aos 20 anos -- e União de Leiria. Porquê um "nome de guerra" tão diferente do nome próprio?
--"Porquê? Porque, quando comecei a jogar, as pessoas que me viam diziam que o meu estilo tinha largas parecenças com o estilo de um jogador chamado Bakero. E como era assim... Bakero fiquei. Essa alcunha foi-me posta pelo meu treinador no Felgueiras, o Jacinto João. Era ele quem dizia que a minha maneira de jogar era igualzinha à do Bakero. Assim fiquei."
-- Alguma vez o viu jogar?
-- Não. Nem nunca procurei imitar quem quer que fosse. Jogava -- e jogo
-- no meu estilo, sem procurar fazer imitações. Não seria capaz e, por certo, não renderia minimamente. Sou como sou e quem me quiser terá de ser assim. Se sou o Bakero foi porque outros o disseram. Eu não...