Daniel Sá
Daniel Sá Diretor Executivo do IPAM

O plano saudita para dominar o desporto mundial

A Arábia Saudita está a transformar o desporto numa das suas principais ferramentas de projeção internacional, diversificação económica e construção da sua marca-país. Sob a liderança do príncipe herdeiro Mohammed Bin Salman, o país lançou há alguns anos o ambicioso plano “Vision 2030”, que procura reduzir a dependência do petróleo e posicionar o reino como um hub global de entretenimento, turismo e desporto. O desporto, neste contexto, é simultaneamente negócio, diplomacia e transformação social.

O investimento é massivo e não promete abrandar nos próximos anos. Só nos últimos três anos, o país aplicou mais de 4 mil milhões de euros em projetos desportivos, através do seu Fundo de Investimento Público (PIF), que controla diretamente clubes, eventos e parcerias internacionais. O objetivo é que o setor desportivo represente 22 mil milhões de euros por ano até 2030, tornando-se um dos pilares da nova economia saudita.

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O futebol é o rosto mais visível desta estratégia. A Saudi Pro League foi reestruturada, com o PIF a adquirir 75% das ações dos quatro maiores clubes: Al-Nassr, Al-Hilal, Al-Ittihad e Al-Ahli. Estrelas como Cristiano Ronaldo, Neymar, Benzema, Kanté e Mané foram contratadas com salários recorde — Ronaldo, por exemplo, recebe cerca de 200 milhões de euros por ano, incluindo direitos de imagem e participação acionista. A presença destas figuras aumentou em mais de 150% o valor de mercado da liga, e as transmissões internacionais da Saudi Pro League já chegam a mais de 140 países.

Mas a aposta vai muito além do futebol. A Arábia Saudita organiza atualmente o Grande Prémio de Fórmula 1 em Jeddah; o Rally Dakar desde 2020; torneios de golfe como o LIV Golf, que rivaliza com o PGA Tour; eventos de MMA e boxe com lendas como Tyson Fury e Oleksandr Usyk; torneios de ténis e eSports, incluindo a Tala do Mundo de eSports em 2025 e os Jogos Olímpicos de eSports em 2027.

A nível institucional, o país estabeleceu parcerias com entidades como a ATP, a FIFA, a Fórmula 1, a WWE e a PGA Tour, e foi confirmado como sede do Mundial de Futebol de 2034, da Taça da Ásia de 2027 e dos Jogos Asiáticos de Inverno de 2029, que serão realizados na futurista cidade de Trojena, parte do megaprojeto NEOM.

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A estratégia inclui também a privatização de clubes, a construção de infraestruturas como a Global Sports Tower (projeto de 23 mil milhões de dólares) e a criação de zonas desportivas integradas em cidades inteligentes. O país está a construir mais de 30 novos estádios e arenas, com tecnologia de ponta e foco em sustentabilidade.

No plano social, o desporto é usado como catalisador de mudança. A participação feminina em atividades desportivas aumentou 150% desde 2016, com mais de 330 mil atletas registadas e equipas nacionais femininas em várias modalidades. O desporto foi introduzido no currículo escolar e as federações são obrigadas a incluir mulheres nos seus órgãos diretivos. Além disso, o número de praticantes amadores cresceu exponencialmente, com mais de 7 milhões de sauditas a praticar desporto regularmente em 2024.

Apesar das críticas internacionais sobre direitos humanos e acusações de “sportswashing”, a Arábia Saudita tem conseguido redefinir a sua imagem global. O desporto tornou-se uma ferramenta de soft power, atraindo turistas, investidores e atenção mediática.

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Por Daniel Sá
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