Tornou-se voz corrente que teria sido impossível, na atualidade, Eusébio fazer a parte mais importante da carreira em Portugal. E se isso aconteceu, não foi seguramente por falta de interessados. Real Madrid, Vasco da Gama, Barcelona, Atlético Madrid ou Nápoles foram alguns dos grandes clubes que sondaram o Pantera Negra, sem o terem conseguido resgatar. As tentativas mais sérias, porém, pertenceram a outras duas equipas italianas.
A Juventus foi a primeira a avançar e a parada subiu até dividir o Benfica internamente. O voto de desempate foi de... António de Oliveira Salazar. “O Benfica deve ter falado com o então Presidente do Conselho. Salazar mandou-me chamar e disse-me que eu não poderia sair do país, porque era património do Estado”, contaria mais tarde Eusébio.
Seguiu-se a investida do Inter, de Angelo Moratti. “Ofereceu-nos como prenda relógios em ouro branco, lindíssimos”, revelaria Eusébio, a propósito das conversas que manteve com o dirigente, a par da mulher, Flora, em Itália, onde passou a lua-de-mel. Tudo aconteceu ainda antes do Mundial de 1966. O Benfica receberia 90 mil contos, o casal já tinha escolhido residência junto ao Lago de Como. Desta vez Salazar não precisou de intervir. Na sequência de uma prestação paupérrima de Itália no Mundial (eliminada pela Coreia do Norte), a federação decidiu impedir os clubes transalpinos de contratar estrangeiros. Eusébio ficou em terra, assim como Bobby Charlton, que teria sido seu companheiro no Inter.
Revoltado contra colagem ao regime
Um dos aspetos que mais revoltou Eusébio foi a tentativa de associação ao antigo regime, nomeadamente às insinuações de que teria sido uma espécie de “afilhado” de Salazar. O Pantera Negra viria a admitir, depois de ter sido impedido de jogar em Itália, o desencanto com os acontecimentos que travaram a transferência. “Só mais tarde percebi até que ponto fui utilizado pelo regime de então”, chegou a afirmar. O lamento de Eusébio não estava afastado da realidade. Em tempo de tensão com as antigas colónias, o Rei acabou por ser usado como exemplo em vários momentos, nomeadamente ao cumprir o serviço militar no Regimento de Artilharia Anti-Aérea, em Queluz.