Beto: «Solidariedade viu-se dentro de campo»

– O INÍCIO da época foi negativo. Nessa altura, chegou a pensar que o Sporting ficaria fora da luta pelo título?

– Começámos mal, é certo, mas todos tínhamos consciência da excelente equipa e dos jogadores talentosos que formavam o Sporting. Na fase mais complicada pensámos que, se déssemos as mãos e nos uníssemos ainda mais na luta pelo mesmo objectivo, as dificuldades iniciais seriam ultrapassadas e assim sucedeu.

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– A mudança começou com a chegada de Jardel...

– Faltava-nos um jogador de área e fomos buscar o melhor. Jardel foi obviamente importante para a conquista do título, porque é um homem-golo e, desde que a bola lhe chegue em condições, todos sabemos do que é capaz, pois o resto torna-se simples.

– Juntando a essa contratação uma época fabulosa de João Pinto, o caminho para o êxito tornou-se menos agitado. Dentro de campo, como foi acompanhar as exibições de João Pinto?

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– Deu-me um enorme prazer, porque o João é uma pessoa que admiro como amigo e, claro, como futebolista. Torci muito por ele no sentido de que se adaptasse bem ao Sporting e todos observámos como se empenhou imenso para que tudo corresse bem. Ainda por cima viera na época passada do clube rival e conseguiu afirmar-se pelo talento, pela qualidade, entrando rapidamente no coração da massa associativa. Foi preponderante, realizou uma temporada excepcional, é um grande amigo e um jogador brilhante.

– Qual foi o principal trunfo para o duplo êxito do Sporting este ano?

– Muita força de vontade de todos, desde os jogadores às pessoas que nos rodearam. Mas a grande força foi a união no balneário, uma relação extraordinária de amizade e solidariedade entre todos, questão que se viu e reflectiu dentro de campo. Isso foi fundamental. Ao princípio, a época não estava a correr bem, mas esses primeiros jogos até nos trouxeram maior coesão e vontade de vencer para superar as críticas.

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– O Sporting viveu diversos momentos importantes durante a época. Quando sentiu que o título estava ganho?

– O empate do Boavista na Madeira, aliado à nossa vitória na Póvoa, foi a situação em que percebemos ter o título à disposição, porque ficávamos cada vez mais dependentes de nós já perto do fim do campeonato.

– O principal adversário foi o Boavista?

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– Sem dúvida. Lutou imenso até perto do fim, demonstrando que o título da época passada não surgira por acaso. Jaime Pacheco e os seus jogadores efectuaram óptima campanha, mas FC Porto e Benfica também lutaram até onde puderam.

– A equipa oscilou quando dispunha de todas as condições para assegurar o título. Os jogos com Benfica e V. Setúbal mostraram um conjunto ansioso e pouco confiante. Receou que o título ficasse comprometido?

– Não. Sentimos a ansiedade natural em quem via o título tão próximo e pretendia resolver rapidamente a situação. Nesse curto período final a ansiedade foi o nosso adversário mais complicado.

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Entrar na História

– Numa temporada bem sucedida, foi ainda possível lançar novos talentos na equipa. Como decorreu a integração de Hugo Viana e Ricardo Quaresma?

– Muito bem, procurei ajudá-los ao máximo tal como o fizeram todos os companheiros. Foram muito bem recebidos e tiveram o mérito de mostrar enorme vontade de aprender. Estiveram sempre atentos, disponíveis para nos ouvir, revelando-se óptimos jovens e profissionais de categoria. Isso deixou-me muito orgulhoso, porque o Sporting provou ter excelente escola de homens e de profissionais.

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– Laszlo Bölöni veio para uma realidade que desconhecia e também teve de adaptar-se. Como foi o relacionamento entre o técnico e o plantel?

– Foi uma relação profissional com respeito mútuo entre o treinador e os jogadores.

– Quais foram os melhores e os piores episódios da temporada?

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– O pior foi quando me magoei, sofrendo uma lesão muscular que me afastou da titularidade. Pela positiva, houve grandes momentos da equipa, mas o que mais me emocionou foi aquele domingo após o jogo de Setúbal. Houve uma explosão de alegria e de emoções acumuladas que me fizeram sentir como se estivesse nas nuvens. Dar felicidade a tanta gente permitiu que me sentisse realizado como profissional.

– Não foi uma surpresa ver tantos sportinguistas nas ruas?

– Não, já tivera a experiência do título há dois anos e calculava que a dimensão da festa seria assim. Temos uma grande massa associativa que foi sempre incansável a apoiar-nos. A Juve Leo simbolizou essa dedicação de todos do primeiro ao último minuto, até pelas músicas com que nos brindou. O Sporting tem a melhor massa associativa de Portugal e isso ficou mais uma vez demonstrado.

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– Conseguir a “dobradinha” depois de vinte anos à procura desse objectivo deu lugar de maior relevo a estes jogadores. Tiveram a noção de que estavam a fazer História?

– Acima de tudo, sentimos enorme orgulho por ter alcançado algo que escapava há tanto tempo e viver esta situação é algo de indescritível. Dias antes da final da Taça falava-se muito de jogadores como Manuel Fernandes, Oliveira, Jordão ou Bastos, os quais estiveram na dupla conquista anterior, e, sem estabelecer qualquer tipo de comparação, compreendemos melhor como foi essa alegria de 1982.

– Na final da Taça, o Leixões foi um adversário exigente que colocou muitas dificuldades. Foram surpreendidos?

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– Já sabíamos que o Leixões tinha muito bons jogadores, além de estar bem organizado e orientado. Acontece que a equipa se sentiu um pouco fatigada em função de estarmos perto do fim da época. Foi fácil perceber que não estávamos na condição ideal mas, felizmente, deu para vencer.

Parabéns, Figo

– Nos últimos jogos, Bölöni devolveu-o à condição de defesa-central. Foi o reconhecimento de que era melhor para a equipa colocá-lo nesse posto?

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– Sempre disse ser a central que me sentia mais à vontade. É evidente que posso jogar a lateral-direito ou a trinco, isso já aconteceu. Há situações que nos ultrapassam, felizmente tudo correu bem, senti-me útil e ajudei o Sporting.

– Isso significa que, se a próxima temporada lhe trouxer a repetição deste cenário, vai encará-lo do mesmo modo?

– No futebol, temos de estar preparados para tudo. Estou sempre disponível para encarar desafios e, se for útil noutra posição para ajudar o clube, assim farei como profissional que respeita opções.

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– Viveu com o coração dividido as emoções da final da Liga dos Campeões: de um lado a possibilidade de o Sporting ter entrada directa na competição para a próxima época, do outro Luís Figo. Como foi iss?

– Fui vendo o jogo aos poucos sem lhe dedicar total atenção. Claro que era óptimo termos entrada directa, mas sinto-me muito feliz com a vitória de um compatriota na mais importante competição de clubes da Europa. O Luís está de parabéns e parece-me que já estava na hora de chegar a este triunfo. É mais um motivo de orgulho para Portugal e também um estímulo para a própria selecção. É sempre bom ter alguém nosso na final, era melhor se fosse o Sporting, mas esteve o Luís e torci por ele como o faria em relação a outro português.

– Em 2001/2002 efectuou mais jogos para o campeonato e ganhou mais troféus do que até aqui, mas concorda que não foi a sua melhor temporada?

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– Reconheço que não foi a melhor de sempre mas, pelo menos, foi aquela em que alcancei maior regularidade e tive mais utilidade.

– Como seria um final de época perfeito?

– [risos] Depois dos troféus conquistados no Sporting, era chegar ao fim com o título de campeão do Mundo! Eu e milhões de portugueses sonhamos com isso mas, até que se torne realidade, há muito trabalho pela frente. Devemos ter calma e não embarcar em loucuras.

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«O grupo está muito unido»

– Joga na selecção principal há cinco anos, período em que disputou 16 encontros. Pode parecer pouco a quem não conheça a realidade da equipa, mas admite que lutar com a dupla Fernando Couto/Jorge Costa é uma tarefa árdua?

– Sem dúvida. Jogam muito bem juntos, são excelentes profissionais, elementos com muita experiência e maturidade com quem tenho procurado aprender. Respeito o seu espaço, mas continuo a trabalhar para definir o meu. Podem estar certos que vou lutar por um lugar porque, dessa forma, estarei a ajudar a selecção, colocando-me ao dispor do treinador. Será uma luta saudável para ajudar Portugal.

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– O nível de exigência e o entusiasmo à volta da selecção nacional são elevados. Que tipo de papel lhe parece que está reservado à equipa neste Mundial?

– Há muitos factores inesperados a considerar numa competição deste género, questões que todos esperamos superar da melhor forma. Claro que gostávamos de chegar à final, mas esse objectivo não é apenas nosso. Além disso, as equipas presentes têm todas ambições legítimas de atingir plano de destaque. Outras, mais fortes, como Argentina, França, Brasil ou a própria Itália, estão legitimadas não só pela qualidade dos seus jogadores mas também do ponto de vista histórico. No fundo, são todas selecções de grande nível e, caso nos cruzemos com alguma delas, não vão faltar dificuldades. Antes, convém não subestimar os três adversários iniciais...

– Como tem sentido o ambiente no grupo por estes dias?

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– Todos estão muito alegres como eu por terem conquistado o direito a jogar numa competição tão importante. Penso também ser compreensível alguma ansiedade: mesmo que muitos tenham participado já numa competição de sub-20, este é o nosso primeiro Mundial com estas proporções. O grupo está unido e cheio de vontade de vencer.

– A felicidade por ter sido convocado não apaga aquele momento, antes do jogo com o Brasil, em que António Oliveira mencionou a hipótese de o Beto não estar numa convocatória ou num Mundial. Receou não estar nos 23 para a fase final?

– Seja o Beto, seja outro jogador, todos estamos sujeitos a isso. Tudo depende do trabalho desenvolvido. Senti que podia não ir, mas mantinha a confiança no sentido de que, caso continuasse a trabalhar bem, poderia ser opção e foi o que acabou por suceder.

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– Ter vivido parte substancial da época a lateral-direito tornou mais frágil a sua posição. Mesmo sendo campeão e vencedor da Taça, o risco de ficar de fora era grande...

–Apesar de ter jogado numa posição que não é a minha de origem, penso que consegui época regular e isso tornou-se vantajoso para mim. Aprendi a sofrer de outro modo e isso fez-me crescer como jogador.

– Sá Pinto, Simão e Quim são apenas alguns dos ausentes forçados do Mundial. O que se pode dizer a quem perde esta competição?

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– São óptimos jogadores e, embora vivam fase dura, sei que vão ultrapassar este momento doloroso. Desejo-lhes a maior sorte do Mundo e sei que terão outras hipóteses.

«Não penso na saída»

– Pouco depois de chegar a Lisboa, Rui Costa pronunciou-se favoravelmente sobre a possibilidade de contar com Beto no Milan para a próxima época. Qual é o ponto da situação em relação a essa possível saída?

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– Em primeiro lugar, agradeço as palavras de confiança e amizade que o Rui teve em relação a mim. Além de ser um dos maiores talentos do futebol mundial, orgulho-me de ser seu amigo e esta situação também ilustra isso. Ninguém falou comigo e, sinceramente, não me parece que exista alguma coisa. Estou bem no Sporting, clube que respeito ao máximo. Só irei sair se não me quiserem ou caso me sinta indesejado. As pessoas respeitam o meu trabalho e tratam-me bem, portanto, nada existe de concreto e não penso nisso.

– Com a confusão gerada em torno da eventual transferência para o Real Madrid, na época passada, aprendeu a enfrentar melhor estes assuntos?

– Deu-me maior maturidade. Houve, de facto, a possibilidade e, aí, aprendi a lidar com situações mais complicadas que não dependem só de mim. Cresci como pessoa e encaro estes episódios com normalidade.

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«Espero que Jardel e André Cruz fiquem»

– A possível saída de Jardel, cujos golos despertaram interesse estrangeiro, tem sido assunto nos últimos dias. Para a equipa, a transferência seria um rude golpe...

– Jardel é um grande ponta-de-lança, um homem-golo. É normal que os grandes clubes da Europa se interessem por ele. Também é verdade que o próprio Jardel já revelou sentir-se bem no Sporting. Se optar por sair, desejo-lhe tudo de bom, mas espero que fique.

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– Outra situação complicada é a da continuidade de André Cruz, algo que pode abalar a estrutura defensiva do Sporting. Como analisa essa hipótese?

– O André é um dos grandes centrais com quem tive o prazer de jogar. É um craque, sabe tudo não apenas sobre a posição em campo mas também de futebol. Ficaria muito triste se saísse. Em resumo, espero que fiquem os dois e não haja muitas mudanças.

Longe da família

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– O Mundial vai afastá-lo da família durante muitos dias. Como avalia o impacto dessa ausência no seu rendimento?

– Estive algumas vezes longe de casa mas, depois do casamento e do nascimento da minha filha, é a primeira vez que estarei fora durante tanto tempo e isso vai tocar-me imenso. Terei de saber ultrapassar a situação como os meus companheiros de equipa. Somos profissionais e sabemos estar sujeitos a momentos desta natureza. Vamos sofrer, mas temos de conviver com isso.

Ao lado, a esposa, Filipa Severo, admite que será uma situação delicada, desde logo por se tratar de um caso inédito:

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– Penso que estou preparada para enfrentar este tempo em que só poderei acompanhá-lo à distância, pois já me mentalizei que vai ser assim. Vou sofrer muito mais do que é normal, porque estou habituada a vê-lo jogar num espaço mais perto em que a distância não chega a ser problema. Neste caso é diferente, há uma sensação de impotência, de nada poder fazer para lhe dar apoio próximo. Vamos sentir saudades, não sei como iremos viver sem ele e a Bruna vai sofrer tanto ou mais do que nós.

«Experiência gira»

– A Selecção portuguesa, caso passe a primeira fase, irá jogar em território japonês e tem pelo menos dois jogadores, Beto e Nuno Gomes, que já estiveram no Japão. Que recordações tem desse episódio?

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– Foi uma experiência muito gira. Depois de sermos campeões da Europa de sub-18 em Espanha, há oito anos, fomos convidados para um torneio e adorei a cidade de Tóquio: muito grande, com enorme confusão nas ruas, mas também rica em diversidade cultural. Deu para perceber que o grau de humidade é muito forte, mas foi experiência única que todos adorámos e gostávamos de repetir.

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