TRANQUILIDADE é a palavra-chave para caracterizar o momento actual de Beto, enquadrado num ambiente familiar muito feliz. Conquistada a presença na final da Taça e numa altura em que a principal competição portuguesa entra em fase decisiva com os leões no primeiro lugar, seguidos de perto por Boavista e FC Porto, enquanto o Benfica espreita qualquer deslize, o jogador mostra-se confiante nas potencialidades da sua equipa. Reafirma-se central por vocação, mesmo que o papel de lateral-direito que Bölöni lhe tem reservado nos últimos tempos lhe permita “ser útil à equipa”.
O central recua cinco anos para lembrar o primeiro desafio no campeonato com a camisola leonina, poucos dias depois da estreia oficial, registada em Metz para a Taça UEFA. “Guardo poucas camisolas, mas essa ainda a tenho”, confessa. Assim, sem perder de vista a selecção e a presença na fase final do Mundial, regressa à época de 96/97, a primeira como jogador do plantel principal, projectando o delicado desafio de hoje ao mesmo tempo que lembra episódios positivos desses tempos em que dava os passos iniciais na equipa então ainda treinada pelo actual seleccionador belga, Robert Waseige. No campeonato, tudo aconteceu a 19 de Outubro de 1996:
– Lembro-me muito bem de como foram esses dias. Jogámos em Metz e perdemos (0-2) no dia 15, logo a seguir visitámos Guimarães. Claro que é um jogo marcante, ainda por cima sendo a estreia no campeonato com a camisola do meu clube. Vivia uma fase em que era sempre convocado, mas não utilizado e, dessa vez, tive oportunidade, soube agarrá-la e esse encontro acabou por ser muito importante para mim. Guardo poucas camisolas, mas essa, pelo significado especial que lhe atribuo, ainda a tenho.
– Vinha de dois empréstimos consecutivos a U. Lamas e Campomaiorense, este último caso assinalado pelo infortúnio...
– Sem dúvida. Uma época atribulada, até porque tive de ser operado e perdi imenso tempo na recuperação. Mas tudo terminou bem.
– Como foi o ambiente à sua volta nos dias que antecederam essa visita a Guimarães?
– Espectacular. Todos me apoiaram, pois sabiam que era ainda um jovem à procura de definição dentro da equipa. Senti força redobrada pelos incentivos constantes e máximo apoio de todos os meus companheiros. Posso dizer que, tanto para mim como para o Sporting, estas visitas vão sendo positivas e tenho boas recordações dos jogos em Guimarães.
– Pouco mais de um ano depois apontou aí o seu primeiro golo para a Taça de Portugal. Lembra-se?
– Claro, a 26 de Outubro de 97, o dia em que foi baptizado o meu sobrinho! Recordo-me com muita satisfação, porque se trata de coisas que ficam sempre na memória. O golo surgiu de um centro da esquerda, feito pelo Vinícius na marcação de uma falta, apareci perto do poste mais distante e desviei para a baliza. Nesse jogo, Oceano e Giménez foram expulsos.
– Esses dois momentos marcantes em Guimarães representaram o quê no que diz respeito à sua integração no Sporting?
– Acima de tudo, ajudaram a que definisse e conquistasse o meu espaço na equipa. Já passaram vários anos, mas não esqueço esses tempos. Logo a seguir àquele primeiro jogo em Guimarães, recebemos o Benfica e ganhámos por 1-0, com um golo meu ao Michel Preud’homme, outro belo episódio da minha carreira.
"Dependemos de nós"
– Na temporada transacta, Guimarães tornou a servir como talismã: o Sporting ganhou por 4-1 com três golos de Acosta e um seu...
– Sim, foi no início da época passada, na sequência de falta marcada do lado esquerdo, o Rui Jorge cruzou e surgi no meio da área a cabecear, já perto do final do encontro.
– Só falta mesmo lembrar que, na primeira volta, à 7ª jornada, um dos cinco golos ao Vitória foi seu, na cobrança de livre directo...
– Um tipo de lance que muito aprecio e tenho procurado aperfeiçoar, sempre com a ideia de ajudar a equipa. Ainda no jogo com o Farense tentei duas vezes, mas o guarda-redes defendeu.
– Neste regresso a Guimarães, o Sporting vai defrontar um adversário incómodo, com um estilo bem definido. Além disso, no tal desafio da primeira volta, a equipa foi goleada, em Alvalade, por 5-0. Este facto poderá reflectir-se na abordagem ao jogo?
– Não acredito. São encontros diferentes e a história não se repete. O Vitória tem jogadores de qualidade e excelente equipa, muito bem orientada e organizada, a fazer óptimo campeonato. Vai, certamente, criar-nos dificuldades que teremos de saber ultrapassar, pois devemos sempre estar mais preocupados connosco e dar o melhor em cada jogo. Dependemos apenas de nós próprios e isso é fundamental.
– Ao dizer que o Vitória está bem orientado refere-se a um técnico muito importante para si: Augusto Inácio. Que recordações guarda da sua passagem por Alvalade?
– As melhores, claro, porque com ele fui campeão. Ajudou-nos imenso. Após os primeiros jogos com Materazzi, foi o treinador do título e isso diz tudo. É certo que nos conhece bem, algo que representa um trunfo para ele, mas dispomos de outros. No final do jogo desejarei que seja muito feliz. Para já, espero ganhar e que tudo corra bem à equipa.
"Sporting está coeso"
– O último jogo deixou marcas, até do ponto de vista exibicional, pois a actuação da equipa foi tremida. Mesmo que o Sporting não dependa apenas dele, tendo inclusive faltado outros jogadores com o Farense, a ausência de Jardel foi muito sentida?
– Vamos a Guimarães com quase todo o plantel disponível e, lamententando esses casos, espero que Niculae e Sá Pinto sejam os únicos impedidos de jogar. Já realizámos muitos jogos com Jardel, existe um hábito e ele funciona como uma referência. Mas neste jogo houve mais do que isso: além do Jardel, o Paulo Bento e o Pedro Barbosa não puderam jogar, devido a castigo, questão que teve óbvios reflexos no rendimento da equipa. Reconheço que o jogo não correu bem, mas também porque o Farense conseguiu causar problemas.
– A onze jornadas do fim, o Sporting lidera o campeonato, mas tem Boavista, FC Porto e Benfica ainda envolvidos na luta. Comparando com o início da época, sente mudanças na sua equipa e parece-lhe que será a que reúne mais condições para reconquistar o título?
– É verdade que mudaram algumas coisas desde o princípio da temporada e o mais importante é que nos conhecemos cada vez melhor, mas há questões inalteráveis. A vontade, o empenho e o profissionalismo são os mesmos, o Sporting está coeso e isso vê-se também no apoio existente à nossa volta, desde os dirigentes até ao público. Por exemplo, foi muito bonito ver os adeptos em cânticos e incentivos no último encontro, mesmo quando não jogávamos bem. Essa ajuda suplementar é decisiva, porque só todos juntos poderemos conseguir os nossos objectivos e estou convencido de que seremos capazes.
Central a defesa-direito
– Para um central, como é o seu caso, jogar a lateral-direito representa um desafio?
– Também, mas não só. Acima de tudo, quero ajudar a equipa. Se me perguntarem, é evidente que digo ser central, posição onde gosto mais de jogar e tenho maior rotina. Desde que seja útil aos planos do grupo, fico bastante satisfeito.
– Isso remete-nos para a questão da polivalência, muitas vezes inimiga dos jogadores, porque é preferível ser um especialista, marcante e personalizado numa posição, do que interpretar diversos papéis sem conseguir definir-se num deles. Como encara o assunto, sabendo-se que também António Oliveira já o apontou como hipótese para três lugares diferentes, ressalvando que não seja prejudicado pela polivalência?
– Não conheço essas declarações do seleccionador, mas concordo com a análise que fez. A polivalência tem lados positivos e negativos. É óbvio que desejo ser útil à equipa e também é evidente que gostava de jogar sempre na minha posição. Entre a conjugação destes factores espero recolher dados positivos e aprender mais alguma coisa.
"Figo responde no campo como nenhum outro"
No fim do particular com a Espanha, Beto manifestou-se descontente por ter sido o único jogador a ficar no banco. Voltando ao tema, o central prefere olhar para o futuro e não atribuir demasiada importância ao episódio:
– Confessei ter ficado triste, como seria natural para outra pessoa naquela situação, mas respeito sempre as opções do treinador. Qualquer jogador tem legitimidade para ambicionar a participação no maior número de jogos possível. Senti-me triste, mas Oliveira sabe o que faz e não vale a pena pensar mais no caso.
– Estar em Barcelona com Figo na equipa permitiu-vos participar numa experiência em que o ambiente era altamente desfavorável. Como sentiram a reacção dele a essa situação?
– Figo é um grande senhor do futebol mundial, joga com muita maturidade e está mais do que habituado a estes problemas. Ele próprio ultrapassa melhor do que qualquer um de nós essa adversidade e dá a resposta mais adequada dentro de campo, algo que faz como ninguém.
– Como encararam o particular com a Espanha, selecção com a qual Portugal não perde desde 58, existindo grande rivalidade?
– Foi um jogo prestigiante entre duas grandes selecções, excelentes equipas que estão muito acima de qualquer sentimento de rivalidade.
– A selecção continua a merecer, junto do público, grande entusiasmo em função da qualidade existente nos habituais convocados. Receia que as expectativas em relação ao Mundial sejam demasiado altas ou acredita ser esta a forma indicada de apoiar Portugal?
– É bom sentir que as pessoas confiam nas nossas capacidades, porque isso moraliza-nos. Uma coisa é garantida: todos os que fizerem parte das opções de António Oliveira vão desejar estar ao melhor nível, pois o Mundial é uma competição duríssima, surgindo a concluir temporada desgastante para todos. Espero que a equipa consiga apresentar-se de maneira a aproveitar o elevado talento de todos, dando sequência ao excelente trabalho feito no Campeonato da Europa e no apuramento.
"Solidariedade total com Nuno Gomes"
– Teve oportunidade de reencontrar Nuno Gomes, para quem os últimos tempos na Fiorentina têm sido muito difíceis, com salários em atraso e a equipa numa posição delicada. Pareceu-lhe que estava afectado piscologicamente?
– Não tivemos muito tempo para conversar e confesso que esse assunto não foi abordado, mas sobre o Nuno importa dizer que ambiciono a melhor sorte do Mundo para ele, desejando-lhe o mesmo que para mim. Mais do que um companheiro da selecção, o Nuno é um amigo de longa data, espero que tudo se resolva bem para ele e manifesto-lhe solidariedade total. Nestas fases, considero que o mais importante é o apoio da família e isso ele tem.
Quinze golos na I Liga
Sendo defesa, a principal missão de Beto situa-se na protecção à sua baliza, embora vá muito além disso. Ameaçador quando joga de cabeça, o central sobe muitas vezes à grande área adversária e, nesse papel, tem obtido a maior parte dos golos.
E os leões têm uma garantia: sempre que Beto marca a equipa não perde. Com quinze golos em sete épocas de I Liga, o sportinguista mantém a regularidade, apontando dois ou três tentos por temporada. Só na primeira, sob empréstimo ao Campomaiorense, apenas obteve um golo (derrota por 1-4 em Chaves).
Com a camisola do Sporting, o jogador começou por notabilizar-se pelas qualidades a defender, mas logo deixou marcas de concretizador, surpreendendo Benfica e FC Porto na época de estreia pelos leões. As equipas que mais sofreram golos de Beto foram Benfica, Estrela da Amadora, Chaves, Farense e V. Guimarães, iludidas em duas ocasiões.
Ultimamente, o jogador ampliou o leque de problemas para os guarda-redes contrários, aperfeiçoando uma especialidade que começara por utilizar nas selecções jovens: a marcação de livres directos. Os dois golos desta temporada (V. Guimarães e P. Ferreira) foram obtidos a partir de lances deste género.