Daniel Sá
Daniel Sá Diretor Executivo do IPAM

Do relvado à passerelle: como o futebol se tornou um fenómeno de alta-costura

Em 2024, o mercado europeu de camisolas e merchandising de futebol registou um crescimento recorde de 26%, totalizando 1,8 mil milhões de euros de receitas entre os 20 principais clubes. O Real Madrid liderou esta tabela com 196 milhões de euros em receitas, seguido de perto por Barcelona (179 M€), Bayern de Munique (171 M€), Liverpool e Manchester United (ambos com 146 M€).

Este boom comercial reflete a crescente valorização dos equipamentos como ativos estratégicos, não apenas desportivos, mas também culturais e de moda. Em Portugal, o Sporting CP atingiu um recorde de 9,2 milhões de euros em menos de seis meses, impulsionado pelo sucesso do equipamento alternativo inspirado em Cristiano Ronaldo.

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O futebol deixou há muito de ser apenas um jogo. Em 2025, é também uma poderosa linguagem estética, cultural e comercial. Os equipamentos desportivos, outrora meramente funcionais, tornaram-se peças de moda desejadas, símbolos de identidade e expressão pessoal. Clubes como o Venezia FC em Itália lideram esta revolução, transformando as suas camisolas em verdadeiros objetos de culto.

O clube italiano, sediado na romântica cidade de Veneza, é hoje uma referência global em design de equipamentos. Desde 2021, quando iniciou a colaboração com a marca Kappa e o estúdio de design Bureau Borsche — conhecido por trabalhos com Balenciaga e Supreme — o Veneza FC passou a lançar equipamentos que combinam tradição, luxo e modernidade. As camisolas, com cortes elegantes, cores sóbrias e detalhes dourados, são apresentadas em campanhas que mais parecem editoriais de moda, muitas vezes fotografadas nos canais e palácios venezianos.

Em 2025, o clube deu mais um passo arrojado ao firmar parceria com a NOCTA, marca de streetwear criada pelo músico Drake em colaboração com a Nike. O equipamento principal da época 2025/26 foi lançado sob o conceito “Home Ground”, celebrando a arquitetura, cultura e identidade de Veneza. A camisola, em preto profundo com detalhes em verde e laranja, é simultaneamente uma peça desportiva e um manifesto de estilo. Está disponível em duas versões: uma para jogo e outra para lifestyle, sem patrocínio visível, pensada para o uso urbano.

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Este fenómeno não é exclusivo do Veneza. Clubes como o Paris Saint-Germain, com colaborações com a Jordan Brand, ou o Arsenal, com equipamentos retro da Adidas, também têm explorado esta interseção entre futebol e moda. No entanto, o Veneza distingue-se pela coerência estética, pela narrativa visual e pela capacidade de criar desejo mesmo fora do campo. As camisolas esgotam em horas, são usadas por celebridades e aparecem em desfiles e revistas de moda.

A tendência é reforçada por movimentos como o blokecore, que popularizou o uso de camisolas de futebol vintage em looks de streetwear, e pela crescente presença de marcas de luxo como Louis Vuitton, Balenciaga e Gucci no universo desportivo. O futebol tornou-se uma plataforma de lifestyle, onde o equipamento é mais do que uniforme — é identidade, memória e afirmação cultural.

Por Daniel Sá
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