VIRAR de página. Emílio Peixe enterra definitivamente os fantasmas na primeira grande entrevista que concede esta temporada a um diário desportivo, falando como elemento integrado de corpo e alma na estrutura e filosofia do FC Porto.
O médio que garante a solidez da zona nevrálgica da equipa azul-e-branca não quer voltar a ser visto como um sportinguista deslocado da sua realidade. Peixe assevera que a saída de Alvalade foi benéfica para a sua carreira. Deixa até nas entrelinhas a mensagem de que poderia ter ganho outra projecção como jogador, caso tivesse contactado mais cedo com uma organização do calibre da portista.
Apesar do protagonismo que justamente lhe tem sido reconhecido dentro das quatro linhas, Emílio Peixe escuda-se num discurso cauteloso quanto às suas perspectivas imediatas. Não se cansa de ressalvar que ainda só fez sete jogos consecutivos e ainda não garantiu qualquer título para a equipa que representa.
As boas exibições que vem realizando permitiram-lhe apresentar uma forte candidatura a um espaço no selectivo plantel portista que vai encarar a luta pelo "hexa". Sempre determinado a não permitir outra penitência de oito meses sem poder competir com regularidade.
Foi com o propósito de triunfar ao serviço do FC Porto que Emílio Peixe rejeitou as propostas de saída que lhe foram surgindo ao longo da temporada. Aos 26 anos, e apesar de um passado invejável no futebol português, é inevitável a sensação de ter começado uma nova vida diante da U. Leiria.
-- O Emílio Peixe renasceu para o futebol há sete jornadas?
-- A expressão do meu trabalho talvez dê a entender que sim. No entanto, nunca deixei de me treinar de forma intensa. Nunca baixei os braços e dei sempre o melhor. Acreditava que a oportunidade ia acabar por surgir. Foi somente a ausência dessa ocasião que impediu que o meu desempenho tivesse sido verificado mais cedo por todos.
-- Foi preciso capacidade de sofrimento para suportar essa segunda travessia do deserto na sua carreira?
-- Fundamental. É muito frustrante para um jogador de futebol estar privado de expressar-se naquela que é a sua arte. É como um pintor não poder pintar. Assumi um espírito de sacrifício e conquista muito grande. Isto, a par da coragem que me ia sendo transmitida por todos os que me rodeavam. Mantive os olhos sempre postos no trabalho diário. Mantendo-me em boas condições, poderia agarrar qualquer "chance" que surgisse de aparecer na equipa. Foi o que aconteceu.
-- A palavra "acabado" alguma vez fez parte do seu vocabulário ao longo de um período tão difícil?
-- Nunca.
-- Reconhece, todavia, a descrença que existia em relação ao contributo que poderia dar ao FC Porto?
-- Isso admito que sim. Ao fim de tanto tempo sem uma oportunidade, é natural que até um jogador duvide um pouco das suas capacidades. É nesses momentos que faz a diferença ter um suporte forte no mundo extrafutebol. Falo da família, que sempre me apoiou e esteve do meu lado. De qualquer forma, as recordações do passado também me ajudavam a ter a certeza de que era capaz de ainda chegar a algum lado no futebol. Felizmente que a oportunidade chegou.
-- A infelicidade do Paulinho Santos acabou por ser fundamental na sua carreira...
-- Foi uma coincidência. O futebol é assim. Como profissional, tinha de aproveitar a oportunidade que me foi colocada. Nos jogos em que tenho actuado tenho feito tudo por cumprir, e continuo à espera de continuar a ter um lugar nas preferências do treinador.
-- O seu sucesso comprova que a "segunda linha" do FC Porto tinha capacidade para cobrir qualquer emergência no conjunto titular?
-- Penso que sim, mas não sou o único nessa situação. O plantel do FC Porto está recheado de grandes jogadores, mesmo que alguns não possam actuar com a regularidade que pretendiam. Todos são profissionais dedicados. Mesmo nos treinos, deram sempre garantias à equipa técnica de que seriam capazes de dar o passo em frente. Isto, pese embora a situação verificada nos jogos da Taça, onde as circunstâncias foram muito peculiares. O facto é que é muito difícil acontecerem alterações de fundo numa equipa de ganha, como é felizmente o caso do FC Porto. Por isso friso que é fundamental nunca baixar os braços, dado que nenhuma oportunidade pode ser desperdiçada.
-- No seu caso, pensa que teria sido justo aparecer mais cedo na equipa principal?
-- Se era justo? Bem, tenho de admitir que apareci na equipa numa fase já tardia da temporada. Não foi possível encontrar a situação certa anteriormente. É aquele ponto da grande valia do plantel que não me canso de frisar. Não era fácil que um atleta que esteve tanto tempo sem competir, entrasse de um momento para o outro no "onze" titular do FC Porto. Tinha consciência disso, mas também de que só me faltava confiança para ser bem sucedido.
-- Então, depois de se convencer a si próprio, só ficou a faltar convencer o técnico...
-- Sim. É a última pessoa, aliás, a única pessoa a escolher a equipa. Ele é testemunha de toda a minha persistência ao longo deste ano. Da forma como me entreguei ao trabalho diário. Por isso, quando ele achou necessária a minha inclusão no "onze", sabia que podia esperar que eu desse o meu máximo.
ESTREIA EM GRANDE
-- E com um golo daqueles logo na estreia como titular, algum receio que subsistisse desaparecia imediatamente...
-- Não podia ter ficado mais satisfeito. Em primeiro lugar, com o meu rendimento em termos físicos. E depois com o golo obtido. É daquelas coisas que acontecem uma vez na vida. Quem viu, viu. Quem não viu, também não vê mais.
-- Com golo ou sem ele, concorda que a sua adaptação a um estatuto novo para si foi notavelmente rápida?
-- O golo pode ter sido importante, mas continuo a defender que para que essa adaptação decorresse de forma perfeita, foi ainda mais importante o trabalho realizado quando nem sequer tinha grandes perspectivas de jogar. Era muito difícil chegar ao fim-de-semana e não ver o meu nome na convocatória. Mesmo assim, na segunda-feira lá estava eu outra vez disposto a empenhar-me ao máximo. Essa é a explicação que encontro para o momento de forma actual.
-- A sua afirmação serviu igualmente para confirmar que o FC Porto, afinal, tinha mesmo soluções para colmatar a saída do Doriva para a Sampdória. Foi uma situação positiva para si?
-- Antes de o Doriva sair eu também tive oportunidade de abandonar por duas vezes do FC Porto. No entanto, nunca cheguei sequer a ponderar seriamente a saída do clube a meio da temporada A acontecer, isso teria sempre de ocorrer no final da época. Acreditei sempre no meu trabalho. A aposta do "mister" recaía de forma mais directa sobre o Doriva e o Paulinho. Respeitei sempre essa situação, mas nunca perdi a esperança.
-- Para além dos brasileiros do Fluminense, por exemplo, teve conhecimento do interesse de algum clube português nos seus préstimos?
-- Depois de dois clubes estrangeiros, surgiu de facto a possibilidade de ficar a jogar em Portugal. Não vale a pena estar a dizer qual é, mas mantém uma boa relação com o treinador.
-- Ficou porque estava determinado a triunfar ao serviço do FC Porto ou por recear, depois do que aconteceu em Sevilha, uma nova experiência negativa no estrangeiro?
-- Disse mesmo antes de estar a jogar que a opção de ter vindo para o FC Porto foi a melhor que tomei ao longo de toda a minha carreira. Na altura em que saí do Sporting não estava muito de acordo. Não foi algo que acontecesse por iniciativa própria. Fui mais ou menos empurrado. Não me dei bem em Sevilha, por isso valorizei tanto a forma como fui acolhido no seio do grupo portista.
CONFIANÇA DO "MISTER"
-- Ao ficar nas Antas fez, então, uma aposta na estabilidade?
-- Tinha a confiança do "mister". Ele veio várias vezes a público sublinhar que eu era um bom profissional e salientar essa faceta do meu profissionalismo. Isso era mais do que motivo para pretender manter-me ao serviço do FC Porto. O presidente também me disse por várias vezes que o clube contava comigo. Fez questão de me incentivar, garantindo-me que um dia a minha hora ia chegar. Por isso, tudo acabou por acontecer normalmente.
-- Você surge na equipa numa altura em que a "caça ao primeiro lugar" estava ao rubro. Sentiu-se um jogador importante na consolidação da liderança?
-- Senti-me, e sinto que tenho sido mais útil. Isto que digo vem de uma pessoa que passou muitos meses fora da convocatória. Quando finalmente me vi na situação de começar um jogo como titular, senti que valeu a pena esperar. Mesmo assim, ainda não ganhei nada. Ainda não consegui nada. Apenas fiz mais seis jogos.
-- Este é o primeiro ano em que você se vai sentir verdadeiramente campeão?
-- A época passada também me senti campeão. Desta vez, porém, o sabor vai ser completamente diferente. Não só pelo facto de se tratar do "penta", mas sobretudo porque fiz mais jogos. Vivi esta época de uma forma muito mais intensa.
-- Depois de ter começado a carreira num clube que tem sentido dificuldades em ganhar, o Emílio Peixe mostrou nas Antas que é um vencedor?
-- Antes de mais, quero frisar que o Sporting é uma grande instituição. Ainda que esteja a atravessar um longo mau momento. É mais fácil um jogador ser vencedor num ambiente de maior rigor, profissionalismo e disciplina. Talvez o FC Porto esteja avançado em relação aos outros clubes portugueses. É, sem dúvida, mais profissionalizado. Isso permite aos jogadores terem uma maior confiança. Mais calma ao longo da semana, para que a concentração se dirija única e exclusivamente para o trabalho.
-- Trata-se de um profissionalismo com rosto humano?
-- Exacto. A atenção que era dispensada pelo técnico ou pelo presidente acabaram por ser trunfos a meu favor para aumentar a convicção de que um empurrãozito seria suficiente para mudar toda a minha posição dentro da engrenagem.
-- A nível interno, no FC Porto, o Boavista foi sempre um adversário mais temido que o Benfica?
-- Lembro-me que o "derby" no Bessa era rotulado de decisivo. Que poderia ditar de alguma forma o posicionamento das equipas com vista ao resto do campeonato e à definição de objectivos. Desta vez, diante do Benfica, isso não aconteceu. O Benfica vinha de uma semana muito agitada e a classificação também era completamente diferente. Tal como o nosso treinador disse, nunca esperámos ir à Luz com seis pontos de vantagem. Isso deu-nos maior tranquilidade, apesar de o espírito e o propósito de ganhar ter sido idêntico.
-- É fácil refrear os ímpetos no balneário quando o título parece estar tão perto?
-- Considerava que estes dois jogos eram decisivos. Já conseguimos um triunfo em Chaves. Agora, com mais uma vitória diante da Académica, poderemos considerar que o "penta" vai estar muito, muito perto. Temos de estar, todavia, atentos à carreira do Boavista. Não queremos entrar em euforias.
-- Que podemos esperar da sua parte para esta recta final?
-- Falta muito pouco para terminar a época. Por isso não posso estar a falar de objectivos pessoais. O importante nesta altura é que a equipa consiga chegar ao título. Se isso for possível, ficarei muito feliz. Se fizer todos os jogos, ainda mais feliz ficarei. Agora, para quem passou tanto tempo de fora, só o facto de poder jogar todos os fins-de-semana pelo FC Porto já constitui o meu maior motivo de alegria.
«PARA MIM FOI BOM SAIR DE ALVALADE»
-- QUAL será a sensação de entrar em Alvalade como titular do FC Porto e, possivelmente, campeão nacional?
-- Não vou virar a cara aos meus amigos. No entanto, claro que me dava muito mais prazer poder cumprimentá-los no final do jogo com um sorriso na cara. Sinal de que o FC Porto tinha conseguido os seus objectivos. De qualquer forma, estou confiante de que vamos poder encarar esse jogo sem pressões de maior, entrando em Alvalade já com o título garantido.
-- Não se esqueça do lado pessoal...
-- Já disse que consegui no FC Porto em 20 m aquilo que nunca foi possível em 11 anos de Sporting. Sendo campeão este ano, fico muito feliz, porque é sinal de que fiz a melhor opção.
-- Diria que a forma como foi tratado tem de ser vista em Alvalade como um exemplo de erro a não repetir no futuro?
-- Na altura em que saí aconteceram opções. O treinador optou por me dispensar. Durante a época disseram sempre que contavam comigo. Trabalhei sempre da mesma forma, ainda que não jogasse tantas vezes como desejava. Acabei por ir parar à lista de dispensas e, a partir daí, o percurso é conhecido. Para mim, até foi bom que as coisas ocorressem desta maneira. Ficou claro que nem o Peixe ou o Costinha tiveram culpa em tudo o que se passou.
«SOU COMPATÍVEL COM O PAULINHO»
-- TENDO a responsabilidade de recolher o testemunho das mãos de Paulinho Santos, a motivação foi mais forte do que o peso da responsabilidade?
-- Tenho de deixar claro que o meu primeiro sentimento foi de tristeza. Independentemente de se tratar de um jogador que desempenhava funções idênticas às minhas, desagradou-me o que o aconteceu ao Paulinho Santos. No entanto, os interesses da equipa estão acima de tudo. A partir do momento em que o azar bateu à porta do Paulinho, senti que poderia ter uma palavra a dizer a partir daí. Não tive qualquer receio.
-- O Peixe e o Paulinho Santos são compatíveis dentro de campo?
-- Isso é algo que se calhar ainda vamos poder comprovar esta temporada. Ainda faltam alguns jogos e, ao ritmo a que o Paulinho tem vindo a recuperar, acredito que ainda vai poder actuar, por alguns minutos que seja. Mesmo não considerando ser a pessoa mais indicada para responder a essa questão, penso que somos compatíveis.
VÍTOR PINTO
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