RUI MATOS PEREIRA e PEDRO SÁ DA BANDEIRA, enviados especiais
Roma - O Sporting é finalmente campeão nacional, 18 anos depois do último triunfo, com Augusto Inácio na direcção dos leões rumo ao título mais desejado a nível interno. Contudo, o técnico português não foi o único que passou pelo banco da equipa verde-e-branca. Antecedeu-lhe o italiano Giuseppe Materazzi, que iniciou a época como a grande aposta da dupla Paulo Abreu-Carlos Janela. Mas uma pré-temporada pouco convincente, cinco jornadas do campeonato (embora sem conhecer a derrota) e uma má noite em Stavanger, perante o Viking, na Taça UEFA, custaram a eliminação da competição europeia e a sua prematura demissão. Por isso, é com naturalidade que o técnico italiano responde negativamente quando questionado sobre se sentia campeão tal como os restantes membros do grupo de trabalho dos leões.
Record foi encontrar o ex-treinador dos leões na sua casa dos arredores de Roma, a poucos quilómetros de Formello, o complexo desportivo da Lazio, a nova campeã de Itália, clube onde Materazzi trabalhou em 1988-89 e 1989-90 e ao serviço da qual os portugueses Fernando Couto e Sérgio Conceição venceram o "scudetto".
Simpático e descontraído, mas sempre frontal, o ex-treinador dos leões não se furtou a responder a qualquer pergunta e confessou mesmo ter saudades dos tempos que passou em Lisboa, pelo que também sente alguma amargura por não ter podido continuar à frente da equipa técnica dos leões. Para que a sua experiência no Sporting tivesse tido outro desfecho, bastar-lhe-ia, segundo o próprio, ter contado com os jogadores que apenas chegaram após a sua saída.
- Considera-se também campeão português?
- Honestamente, não me sinto campeão, porque é necessário dar o mérito a quem verdadeiramente o merece. E esse é de Inácio, dos jogadores, dos adeptos e do presidente, pelo empenho que aplicaram durante toda a temporada, inclusivamente durante a minha estada no clube. Quando saí, o Sporting estava a quatro pontos do FC Porto e não havia perdido qualquer jogo do campeonato.
REFORÇOS TARDIOS
- O que correu mal?
- Quando cheguei, o clube havia terminado o campeonato na 4ª posição e vendera Simão e Leandro. Comprou Schmeichel e Ayew, mas não entrou ninguém como Simão. Por isso, quando vi o plantel, pedi um esquerdino e veio, uns meses depois, De Franceschi. Pedi ainda um central e um avançado. Só depois de eu ter sido demitido é que chegaram André Cruz e o dianteiro (Mpenza). O presidente Roquette, Paulo Abreu e Carlos Janela haviam-me prometido um avançado e só chegou muito depois. Só após dar conta de que não vinha ninguém é que comecei a apostar em Acosta... Pelos vistos, deveria ter começado mais cedo... (desabafo) Quanto a De Franceschi, já o queria em Julho, mas o Venezia pedia 750 mil contos, o que nos pareceu muito para um jogador que não fazia parte dos seus planos. Quando chegou, já havia passado o prazo das transferências. Depois, teve duas contraturas. Antes, na pré-temporada, fizéramos uma preparação física muito exigente. Corridas longas com 1000, 1500, 2000 metros, "sprints", mas houve jogadores que não reagiram bem. Viveros, por exemplo, desmaiou com uma desfibrilação no coração e passou três dias no hospital... Mas é normal que a minha equipa não fosse brilhante no início, devido à forte preparação. Os suplentes Toñito, Hanuch e Kmet, apesar de serem bons jogadores, não trouxeram uma mais-valia evidente à equipa e só depois de verem os resultados das primeiras aquisições é que a direcção trouxe jogadores para vencer o campeonato. Mas também houve coisas boas na minha passagem pelo Sporting. Os jogadores ofereceram-me duas camisolas autografadas. Schmeichel e Pedro Barbosa apreciaram o meu trabalho. Houve ainda as satisfações pessoais, como ver Rui Jorge, Beto e Vidigal na selecção portuguesa ou ainda ver Viveros valorizado. Quando indiquei De Franceschi, perguntaram-me pelas suas características e disse-lhes que não era um génio como Simão nem marcava os golos que o português conseguia, mas referi que se tratava de jogador com muito valor.
- ...
- Criticavam-me sempre que colocava Vidigal em campo, mas, pelos vistos, foi dos jogadores mais úteis ao Sporting. Fico, por isso, bastante satisfeito por ver que as minhas apostas resultaram bem no Sporting, como Vidigal, Rui Jorge e De Franceschi, assim como De Lucía [n.d.r.: o treinador de guarda-redes que resistiu à "chicotada" de Materazzi]. Acosta, por exemplo, quando se despediu de mim, pediu-me desculpa: "O senhor merecia mais da minha parte", disse.
- Quando o contrataram, que lhe disseram os dirigentes do Sporting?
- Disseram-me "queremos vencer o campeonato. Vá para estágio e depois diga-nos o que faz falta. Faça uma boa preparação, porque não queremos que a equipa faça uma grande 1ª volta e, depois, perca rendimento com facilidade".
- Considera que, com os jogadores que chegaram posteriormente à sua saída [n.d.r.: César Prates, André Cruz, Mbo Mpenza e Spehar] e os novos dirigentes [n.d.r.: Luís Duque, Manolo Vidal e José Manuel Torcato], poderia ter conseguido levar o Sporting ao título?
- Creio que, com os jogadores que chegaram e com os novos dirigentes, talvez tivesse conseguido ser campeão... Mas não posso nem quero tirar o mérito que é devido a Augusto Inácio.
- O que lhe pareceu o seu sucessor?
- Tem de ser, forçosamente, um treinador competente. Falei apenas duas vezes com ele: uma no dia da minha saída e outra, alguns dias mais tarde, por telefone e pareceu-me uma pessoa bastante simpática, nada arrogante e com ideias seguras sobre o que pretendia.
- E com que ideia ficou de Paulo Abreu e Carlos Janela?
- Janela era competente, mas creio que ele não sabia muito bem o que faltava à equipa. Em Barcelona, a perdermos por 3-0 ao intervalo, após uma péssima primeira parte, recuperámos, após substituirmos Rui Jorge e Pedro Barbosa. Mas foram alterações que não agradaram a algumas pessoas. Tive a sensação já ali que Paulo Abreu não tinha a mesma confiança em mim. Também me parecera o mesmo após o empate com o Santa Clara na 1ª jornada. Estávamos a perder por 2-0 ao intervalo e as substituições permitiram o empate. Com o V. Setúbal, estávamos a perder por 1-0 e demos a volta ao resultado. Em Braga, também recuperámos da derrota. No total, somei duas vitórias e três empates, jogando três encontros fora de casa.
A CONTESTAÇÃO DOS ADEPTOS
- O que achou da contestação em seu torno da parte dos adeptos?
- Sinceramente, nunca percebi muito bem o que se passou entre os adeptos e eu. Não sei, inclusivamente, se estavam manipulados por alguém. A verdade é que, após o segundo jogo, já se falava da chegada de um outro treinador português para além de Inácio [n.d.r.: António Oliveira]. Por outro lado, treinei sempre no campo de treino, permitindo o contacto dos adeptos e certa vez fui obrigado pelos dirigentes a fazê-lo no Estádio devido medo que tinham de eventuais confrontos com os adeptos. Creio, no fundo, que faltou o total apoio da Direcção. Eu, por meu turno, trabalhei bem, mas os resultados do meu trabalho apenas chegaram depois. Cada um que faça a leitura que quiser destas palavras.
- O que sentiu quando foi demitido?
- Fiquei muito, muito abatido por não ter ficado até ao fim, porque creio que os resultados apareceriam. Acreditei na minha capacidade e se não acreditasse não teria aceite o convite do Sporting. Tenho uma grande experiência no campeonato italiano, treinei a Lazio e, por isso, creio que tinha a experiência suficiente para poder ser bem sucedido em Portugal.
"ISTO NÃO É PRESSÃO"
- Esperava ter sido demitido após o encontro com o Viking [derrota por 3-0 em Stavanger]?
- Não, não pensava. Jogámos bem e acabámos por sofrer três golos perfeitamente evitáveis. O primeiro nasce de uma falta do avançado do Viking no seu próprio campo que a defesa ficou a protestar. No segundo, Schmeichel foi lento a sair da baliza e o terceiro surgiu num "penalty" assinalado por um compatriota meu [n.d.r.: Vincenzo Treossi] após um defesa nosso ter caído sobre a bola. Quando Janela me falou a primeira vez sobre a minha demissão devido à pressão dos adeptos e dos jornalistas ri-me na sua cara, porque a pressão que há em Portugal não é nada quando comparada com o que se passa aqui em Itália, principalmente nos clubes do Sul. Por exemplo, na minha primeira passagem pelo Bari, dei o primeiro treino sob uma chuva de pedras, garrafas e latas só porque substituí um treinador que os “tifosi” gostavam [n.d.r.: Eugenio Fascetti]. Em Lisboa, passei sempre entre as pessoas, conversava com elas. Passeei muito pela zona do Parque das Nações e, por entre vários milhares de pessoas com quem me cruzei, apenas uma vez fui importunado por um adepto. Ora, isto não é pressão nenhuma.
- Seguiu a festa da conquista do título?
- Sim, vi-a e tenho-a gravada no vídeo e estive sempre em contacto com De Lucía, que nunca havia visto semelhante coisa. Estou contente pelos jogadores, que foram grandes profissionais, e também pelos adeptos, que, após estes anos todos, mereciam a vitória no campeonato.
- Continua a torcer pelo Sporting?
- Sim, claro.
VOLTAR A PORTUGAL? NO BENFICA...
- Estaria disposto a voltar a trabalhar em Portugal?
- Sim, claro que sim. Com o mesmo entusiasmo com que aceitei o convite do Sporting. Gostava de provar às pessoas que não sou incompetente e que tenho valor mais que suficiente para voltar a treinar em Portugal.
- E em que clube?
- Principalmente no Benfica. É um grande clube, com óptimas condições de trabalho, tem uma excelente massa associativa (como, aliás, a do Sporting) e, também, uma boa equipa. Mas não era apenas o Benfica que gostaria de treinar.
TERÇA-FEIRA EM PORTUGAL
Giuseppe Materazzi regressa terça-feira a Portugal, dois dias depois da final da Taça de Portugal, entre o "seu" Sporting e o FC Porto, marcada para depois de amanhã, no Estádio Nacional. O ex-treinador dos leões apressou-se logo a dizer que não assistiria à final de domingo e que apenas se deslocará ao nosso País o tempo suficiente para se reunir com o presidente do Sporting, José Roquette, e rever alguns amigos, principalmente Silvano de Lucía, o técnico de guarda-redes que consigo ingressou no clube no início da época e que continuou a trabalhar sob as ordens de Augusto Inácio.
"Vou a Portugal na terça-feira e conto regressar no dia seguinte... Digamos que vou lá buscar De Lucía [risos]. Vou falar com o presidente Roquette, a quem já havia pedido um encontro a quando da minha saída e aproveitar para rever alguns amigos", referiu o ex-treinador dos leões. Quando questionado sobre o que esperava da final da Taça, à qual conta assistir através da RTP Internacional, Giuseppe Materazzi referiu esperar um novo triunfo do Sporting, mas deixou, também, um aviso: "Convém que não festejem de mais o título, porque a final da Taça também é uma partida muito importante e o FC Porto tudo fará para conseguir triunfar. É necessário que continuem concentrados e... muito atentos a Jardel", concluiu o técnico transalpino, que considera ter o atacante brasileiro o talento suficiente para jogar nas principais equipas de Itália ("Marcou quase 50 golos esta época, alguns dos quais ao Real Madrid, Barcelona e Bayern Munique e mostrou que não é apenas um bom cabeceador").
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