O Tribunal Correccional de Lille (França) dá a conhecer, sexta-feira, a três dias do Natal, a decisão sobre o "caso Festina”, que foi desencadeado no dia 8 de Julho de 1998, quando o massagista Willy Voet foi apanhado na fronteira franco-belga na posse de uma considerável quantidade de substâncias dopantes. A partir daí, foi uma verdadeira caça ao homem, que parece, todavia, estar longe do fim. O ciclista francês Richard Virenque é um dos arguidos no processo e a sua confissão, no dia 24 de Outubro deste ano, em pleno tribunal, veio apenas confirmar o que já se suspeitava: o "doping" fez parte da sua carreira desportiva
O "CASO Festina” chega sexta-feira ao fim, com a leitura da sentença dos dez arguidos, no Tribunal de Lille, em França. Não se esperam grandes surpresas nem tão-pouco penas graves, tendo, inclusive, o procurador adjunto pedido a absolvição de Richard Virenque, apoiando-se no facto de a sua visão dos acontecimentos não ter sofrido qualquer evolução.
O ciclista, todavia, não se livra de um castigo desportivo por ter confessado que ingeriu substâncias dopantes. A Federação Suíça de Ciclismo, na qual Virenque está filiado, deverá dar a conhecer a sanção no dia 29 deste mês, devendo o corredor sofrer uma suspensão entre seis a um ano. A acusação, de resto, não foi muito severa para com os restantes arguidos.
Para Willy Voet e Bruno Roussel, talvez os mais importantes arguidos, a par de Virenque, foram pedidos, respectivamente 18 e 14 meses de prisão, com pena suspensa, enquanto para os restantes o castigo deverá ser de 8 a 12 meses de prisão. É caso para dizer que a montanha pariu um rato, ou seja, dois anos de investigação, e polémicas, que, ao que tudo indica, se resumirão a pequenas e insignificantes sanções.
É importante, todavia, reconhecer que o "caso Festina” veio impor uma nova ordem no ciclismo e até mesmo no desporto em geral, nomeadamente no que respeita à caça de substâncias mais perigosas, como, por exemplo, a Eritropoietina e a Hormona de Crescimento. E, depois da França, as investigações da polícia estenderam-se a outros países, com a Itália a ser, também, um dos pólos de atenção por parte das autoridades.
Pantani e Armstrong
Após o escândalo que abalou o Tour de 1998, o italiano Marco Pantani voltou a colocar a suspeita de recurso ao "doping" na primeira linha da actualidade, quando no ano seguinte foi suspenso do Giro, a dois dias do final da prova e quando se preparava para festejar o triunfo, devido a uma taxa de hematócrito superior a cinquenta por cento. A partir daí, o trepador italiano "escondeu-se" de tudo e todos, regressando à competição praticamente um ano depois. Agora, Pantani volta a ser notícia de primeira página e outra vez devido à suspeita de recurso a substâncias proibidas. Os tribunais italianos sancionaram o ciclista com três meses de prisão por "fraude desportiva", mas, curiosamente, não devido ao que aconteceu no Giro de 1999 mas sim no que se passou três anos antes. Pantani sofreu um acidente na clássica Milão-Turim e os médicos do hospital onde foi observado detectaram-lhe uma elevada taxa de hematócrito, mais de 60 por cento.
O último episódio da "caça ao homem" e ao "doping" tem como principal protagonista a US Postal, equipa do bivencedor do Tour, o norte-americano Lance Armstrong. As autoridades francesas, sempre essas, iniciaram recentemente uma investigação, após uma denúncia dando conta de que a equipa usou substâncias dopantes durante a Volta à França.
Armstrong, esse, negou categoricamente as suspeitas e já ameaçou que boicotará o Tour de 2001 se as investigações não pararem. Vamos ver quem vencerá este braço-de-ferro.
Cronologia
1998
8 de Julho - Willy Voet, massagista da Festina, é interceptado na fronteira franco-belga, na posse de produtos dopantes, bem como de estupefacientes, três dias antes do início do Tour, na Irlanda. Dois dias mais tarde começa a ser investigado.
15 de Julho - Bruno Roussel, director desportivo da Festina, e Eric Rijickaert, médico da equipa, começam também a ser investigados por suposta ligação ao primeiro.
17 de Julho - A equipa Festina é expulsa do Tour, em dia de contra-relógio individual, após a confissão de Bruno Roussel da existência de "doping" organizado no seio da formação.
24 de Julho - Cinco corredores da Festina (Laurent Brochard, Francis Moreau, Alex Zulle, Laurent Dufaux e Armin Meier) reconhecem terem-se dopado.
29 de Julho - O juiz Patrick Keil estende a sua investigação a outras três equipas. O corredor italiano Rodolfo Massi (Casino) e o médico espanhol Nicolas Terrados (ONCE) entram igualmente para o rol do grupo de investigados. O primeiro, no entanto, é considerado não culpado, ao mesmo tempo que o director desportivo da equipa La Française des Jeux é ouvido pela primeira vez pelo juiz de Lille.
4 de Outubro - A União Ciclista Internacional (UCI) dá ordem de suspensão de sete meses aos três suíços da Festina.
30 de Novembro - As análises feitas detectam a presença de Eritropoietina (EPO) e outros produtos dopantes em oito corredores da equipa Festina. O francês Richard Virenque continua a afirmar que nunca se dopou.
14 de Dezembro - Os ciclistas Laurent Brochard, Christophe Moreau e Didier Rous são suspensos até ao dia 1 de Maio. Outro corredor, Pascal Hervé, por solidariedade com os colegas, decide não competir até essa data.
1999
26 de Março - Richard Virenque começa também a ser investigado pelo juiz Keil por infracção à lei "antidopagem", apesar das suas negações.
29 de Março - O juiz Patrick Keil dá ordem para investigarem Roger Legeay, presidente da Liga Profissional de Equipas.
1 de Abril - Nem o presidente da Federação Francesa de Ciclismo escapa. Daniel Baal começa, igualmente, a ser investigado, enquanto o director do Tour, Jean-Marie Leblanc, é apenas ouvido pelo Tribunal de Lille.
6 de Maio - O juiz Keil convoca uma confrontação entre Bruno Roussel, Daniel Baal, Roger Leavy e Jean-Marie Leblanc. O clima é de expectativa e alguma apreensão.
10 de Maio - O mesmo juiz convoca, também, para um frente-a-frente, Richard Virenque e Willy Voet. Ao mesmo tempo, os famosos cadernos de Voet, com os apontamentos sobre o "doping" organizado, chegam às mãos do magistrado. O presidente da UCI, Hein Verbruggen, é ouvido em Lille durante nove horas.
19 de Maio - Willy Voet publica um livro acusador.
16 de Junho - A Sociedade do Tour de França anuncia a lista dos nomes recusados para o Tour. Richard Virenque é um deles.
29 de Junho - A poucos dias do início da Volta à França, a UCI anula a decisão dos responsáveis do Tour, permitindo a Virenque e outros participarem na corrida.
2000
23 de Maio - As datas do processo a julgar em tribunal são anunciadas: 23 de Outubro a 10 de Novembro.
23 de Outubro - Richard Virenque, no primeiro dia do julgamento, afirma que nunca teve conhecimentos de "doping" na equipa.
24 de Outubro - Confissão bombástica e que marcou o julgamento. Richard Virenque recua e confessa ter-se dopado.
Os arguidos
WILLY VOET
O antigo massagista da Festina, o belga Willy Voet, desencadeou o escândalo de "doping" que abalou o Tour de 1998, quando foi "apanhado" na fronteira franco-belga na posse de uma considerável quantidade de produtos dopantes. Dois dias depois (10 de Julho de 1998), começa a ser investigado e é acusado de "contrabando e circulação irregular de produtos proibidos". Chegou a estar preso 16 dias.
CHRISTINE PARANIER
Na altura do surgimento do "caso", era farmacêutica na localidade de Veynes (Hautes-Alpes), onde reside Willy Voet. Era na sua "oficina" (laboratório) que o ex-massagista da Festina "fabricava" as suas "bombas" dopantes. Começou a ser investigada no dia 13 de Setembro de 1998, por "cumplicidade no fabrico e comercialização de substâncias venenosas".
BRUNO ROUSSEL
Em 1998, era ele o director desportivo da Festina, primeira equipa mundial na altura dos acontecimentos. Começou a ser investigado cinco dias depois de Willy Voet por "administração e incitamento ao consumo de produtos dopantes por ocasião das provas". Esteve preso 11 dias.
ERIC PARANIER
Marido de Christine Paranier, e responsável pela farmácia. Foi dado como implicado no escândalo no mesmo dia da sua esposa e sensivelmente pelas mesmas razões.
ERIC RIJCKAERT
Antigo médico da equipa Festina, de nacionalidade belga. Foi implicado no "caso" no dia 15 de Julho e preso dois dias depois, em Douai, pelos mesmos motivos de Bruno Roussel (uso ilícito da medicina). Foi posto em liberdade no dia 20 de Outubro, após três meses de prisão.
JEFF D' HONT
Outro arguido de nacionalidade belga e igualmente massagista na altura da descoberta do escândalo, mas na equipa La Française des Jeux. Foi acusado em 18 de Setembro de 1998 "por administração e incitamento ao consumo de substâncias venenosas". Foi posto em liberdade no dia 29 de Setembro, após 11 dias na prisão.
RICHARD VIRENQUE
Chefe de equipa da Festina na altura dos acontecimentos. Foi acusado no dia 26 de Março de 1999 "por cumplicidade e incitamento ao uso de produtos dopantes", e por "cumplicidade na importação e circulação de substâncias venenosas".
JEAN DALIBOT
Mais um massagista da Festina, na altura dos acontecimentos. Foi acusado em 3 de Março de 1999 "por infracção à lei antidopagem de 1989".
NICOLAS TERRADOS
Médico da equipa espanhola ONCE. Foi acusado no dia 31 de Julho de 1998 por "incitamento ao uso de produtos dopantes" e no dia 17 de Dezembro de 1998 por "importação ilegal de substâncias venenosas".
JOEL CHABIRON
Antigo responsável pela logística da Festina na altura dos acontecimentos. Começou a ser investigado em Janeiro de 1999 e logo depois acusado de "importação e contrabando de produtos proibidos".
Discurso directo no tribunal
"Depositei a minha confiança no médico, já que não queria ficar doente e acusar 'doping'... Pensava que eram vitaminas e produtos para fortalecimento"
RICHARD VIRENQUE (ciclista)
"Sim, é verdade, tomei substâncias dopantes, mas não tive outra escolha"
Idem
"Ao fazer esta confissão, você [Virenque] sai engrandecido e poderá, agora, olhar-se ao espelho"
DANIEL DELEGOVE (juiz do Tribunal de Lille)
"Comecei a tomar 'doping' em 1994. Mas a EPO [Eritropoietina] tinha efeitos negativos em mim. Tomava anfetaminas, mas a minha mulher estava sempre a pedir-me para parar"
LUC LEBLANC (ex-ciclista)
"Não me sinto responsável pelo facto de os corredores se doparem ou serem dopados"
HEIN VERBRUGGEN (presidente da UCI)
"A certa altura, a EPO [Eritropoietina] acabou por ocupar mais espaço no nosso frigorífico que a própria comida"
SYLVIE VOET (mulher de Willy Voet)
"O ciclismo, hoje, não é um desporto limpo"
DANIEL BAAL (presidente da Federação Francesa de Ciclismo)
"Não sei se Miguel Indurain consumia ou não produtos dopantes, pois não ia a todos os quartos, mas penso que sim"
THOMAS DAVY (ex-ciclista da Festina).
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