Carolina Duarte deixa desabafo após conquista do bronze nos Jogos Paralímpicos: «É muito difícil chegar a patrocinadores»

• Foto: Epa/Lusa

Carolina Duarte conquistou este sábado o bronze nos 400 metros T13 (deficiência visual) nos Jogos Paralímpicos Paris'2024, garantindo a sétima medalha para Portugal na competição. No Stade de France, a portuguesa, que tinha sido a mais rápida nas eliminatórias (55,99 segundos), correu a final em 55,52, terminando atrás da azeri Lamyia Valiyeva, que foi prata com 55,09, e da brasileira Rayane Silva, que assegurou o ouro como novo recorde mundial (53,55).

No final, a atleta portuguesa falou da emoção de subir ao pódio, dos sacrifícios que fez, reconhecendo que os apoios à preparação já são satisfatórios, mas ainda assim lamenta que nem todos olhem para o desporto paralímpico da mesma maneira.

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Como é que foi esta prova no fundo?

Carolina Duarte: Foi bastante inesperada. Saíram marcas que nunca tinham saído como o recorde do mundo. Eu estava preparada. Não consegui ganhar. Eu não controlo o que as outras fazem, o controlo que eu faço. Eu fiquei contente com a minha marca, com a minha prestação. Eu dei tudo o que eu tinha e foi espetacular correr com elas com este público. Estou muito, muito feliz.

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Quando sai da curva para a recta final, sente que ainda pode chegar ao segundo lugar?

Carolina Duarte: Como ela estava com uma decalagem grande de duas pistas, eu fiquei sempre com esperanças que ela quebrasse, a brasileira. Eu sabia que ela estava longe, mas acreditei sempre que ela ia quebrar e que eu ia conseguir acelerar. Depois vejo a outra ao meu lado. Aí eu percebi que já podia estar um bocadinho para trás, mas estávamos na reta final e eu tive sempre, sempre esperanças. Não quebro. Uma medalha paralímpica é ótimo. Estou contente.

Qual foi o sentimento quando passou a linha?

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Carolina Duarte: Sim, foi mesmo ufa! Estou no pódio. Estou entre as três melhores do mundo há quase cinco, seis anos. Estou mesmo feliz, pois tenho aqui imensa gente a ver: a minha mãe, a minha irmã, e a minha filha estiveram cá. Estou muito, muito feliz de ter conseguido esta medalha aqui.

Qual é o sentimento agora que tem a medalha em sua posse?

Carolina Duarte: (começa a chorar) Ainda não tinha chorado, mas é muita emoção. Estou muito feliz. Não interessa se é de ouro, ou de prata, ou de bronze. Subir ao pódio é espetacular. Com o estádio cheio. Estou muito feliz, muito feliz.

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Essas lágrimas são de felicidade?

Carolina Duarte: É de felicidade. Obviamente que toda a gente chega aqui com o objetivo de alcançar medalhas, porque no fundo é o confirmar de que nós realmente trabalhámos e treinámos, que tudo o que fizemos foi certo e as escolhas foram as certas. E de repente é chegar aqui e levar um carimbo de excelência. E eu estou mesmo muito contente, porque tudo o que eu fiz até agora foi bem feito e eu dei tudo o que eu tinha. Mais do que isto, eu não conseguia ter dado. Estou feliz. Não foi ouro, não foi prata, foi bronze. É espetacular esta medalha ao peito em Paris, no estádio com nem sei quantas mil pessoas estão aqui. Estou feliz. Estou muito, muito feliz e realizada.

É o confirmar do trabalho?

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Carolina Duarte: Claro. Eu investi muito também a nível físico, psicológico, e eu não teria conseguido estar aqui sem ter toda a equipa que me ajuda. Eu não sou a mesma atleta que era há oito anos, que ficou em último na final, ficou frustrada na final. Naquela altura eu nem sequer consegui rever a minha prova porque fiquei mesmo sem saber lidar com a frustração. E há um ano e meio que eu estou a trabalhar para conseguir estar aqui feliz, a agradecer por tudo o que eu tenho, ter conseguido correr numa das minhas melhores marcas. E é a sentir que estou mesmo a gostar daquilo que eu faço. Isto é o meu trabalho. Oito anos depois de estar num palco destes, é espetacular.

Como é que é sentir esta vibração toda, estas ondas positivas, perante 70 mil pessoas no estádio olímpico?

Carolina Duarte: Sim, é espetacular. Eu canalizo toda a energia que toda a gente que está aqui a gritar, quer seja por mim, quer seja por outra atleta, canalizo tudo, tudo para mim. Nunca tinha estado num estádio, nunca na minha vida, com tanta, tanta gente, quer como atleta, quer como espectadora. E de facto, é indescritível. E percebe-se porque é que todos os atletas querem estar neste palco. Mesmo nunca tendo estado. E chega-se aqui e é "uau", isto é mesmo o que eu mereço. Eu trabalhei para isto e sou muito grata, mesmo.  

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Como é ser atleta paralímpica em Portugal?

Carolina Duarte: De há uns anos para cá, as condições melhoraram muito. Nós já recebemos uma bolsa mensal, temos um ‘plafond’ bastante generoso para gastar na nossa preparação, em estágio, em sapatos, em material de recuperação. Temos isto tudo, mas comparando agora com a minha colega brasileira, ela recebe o dobro do que eu recebo, por exemplo. E depois também outra coisa, a nível dos atletas paralímpicos, é muito difícil chegar a patrocinadores, a empresas, e isso é discrepante em relação aos atletas olímpicos. Quase todos os atletas que chegam a um palco olímpico têm patrocinadores, marcas de desporto, bancos, enfim, empresas. E os atletas paralímpicos têm muita, muita dificuldade em chegar a essas marcas. E um dos meus objetivos também é conseguir provar às empresas que os atletas paralímpicos são tão dignos de representar qualquer tipo de marca como qualquer atleta olímpico. Nós trabalhamos como os outros atletas. Eu treino todos os dias. Eu não como doces, eu vou à nutricionista, vou à psicóloga, eu faço todo o trabalho igual a um atleta olímpico. E então eu gostava muito que o desporto adaptado não só para mim, mas para todos os atletas que temos, já vamos na sétima medalha paralímpica é espetacular, eu gostava que as marcas conseguissem olhar para os atletas como embaixadores, representantes das marcas, porque nós trabalhamos também muito. E não é por ver mal, por não ter uma perna, por não ter um braço, enfim, qualquer que seja a deficiência, não é por isso que somos menos. E então eu espero muito que esta medalha que eu trago consiga dar um ‘boost’, na imagem que os paralímpicos têm, de que somos atletas de excelência.

Dar também condições para alcançar mais em 2028?

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Carolina Duarte: Eu espero que sim. Eu demoro uma hora para chegar ao treino. Eu adorava ter um patrocinador que me pagasse o transporte para o treino, por exemplo. Eu não posso conduzir por ver mal, mas obviamente que, mesmo com patrocinadores, se chegar a Los Angeles, se não alcançar o primeiro e ficar novamente em terceiro, é inevitável. Eu não consigo controlar as marcas das outras. Eu consigo controlar as minhas. Eu sei que posso melhorar as condições de treino, sei que, com ajuda externa, eu consigo melhorar isso. E esse tempo que eu poderia conseguir reduzir no transporte para o treino, pode me permitir estudar para preparar o meu pós-carreira. Eu já estudei, sou licenciada em Gestão, tenho mestrado em gestão, tenho uma pós-graduação, tenho imensas coisas. Já estou a estudar mais outra coisa para ser mentora de atletas, ajudar no ‘Mental Coaching’, psicologicamente outros atletas que passaram ou passam pelo que eu passo, mas eu preciso de tempo para estudar. E então sinto que essa redução no tempo, na duração da deslocação para o treino, ajuda-me. Mas de toda a forma eu sei que eu estou no bom caminho. Tive uma filha há três anos e é espetacular estar aqui. Eu espero que todas as mulheres, com ou sem filhos, se sintam incentivadas a lutar pelos objetivos, pelos sonhos. Não é impossível. Somos todas capazes disso, com ou sem deficiência, é possível. Não se prendam por nada, não deixem que ninguém vos corte os sonhos, porque ninguém tem esse direito.

Qual seria a mensagem que deixaria aos portugueses que estiveram no estádio ou à frente da televisão a torcer pela Carolina?

Carolina Duarte: Em primeiro lugar, obrigada. Obrigada mesmo, porque é muito importante para os atletas sentirem essa vibração. Eu estou feliz por estar em terceiro. Nós não ficamos felizes só com o primeiro lugar. O terceiro lugar é ótimo e eu sou a terceira melhor do mundo. Já tinha sido vice-campeã do mundo, mas nos Jogos Paralímpicos nunca tinha sido. E também queria deixar uma mensagem aos portugueses de que os Jogos Olímpicos e Paralímpicos são de quatro em quatro anos, mas nós trabalhamos todos os dias. Para o ano é ano de Mundial. A seguir é europeu e então continuem a apoiar, a ver as nossas coisas, a partilhar, a seguir-nos a todos os atletas nas redes sociais. É muito importante para nós conseguirmos ter mais visibilidade. E obviamente, obrigada pela curiosidade em ver os Jogos Paralímpicos. Está imensa gente a ver que nunca tinha visto. Os meios de comunicação estão a fazer um excelente trabalho. E também a toda a gente que nos viu aqui: lutem por aquilo em que acreditam mesmo, porque é possível concretizar qualquer sonho.

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Por Marco Martins
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