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Opinião
Jaime Antunes

Benfica District: Muitas dúvidas, zero de estratégia

Durante a campanha para as recentes eleições dos orgãos sociais do Sport Lisboa e Benfica, o Presidente Rui Costa surpreendeu os sócios com a apresentação de um projecto, a que chamou Benfica District, relativamente ao qual nenhum dos restantes candidatos soube argumentar ou contrapor outras alternativas, apesar de ser evidente que o lote onde se situa o Estádio da Luz e edifícios adjacentes precisa de uma reorganização/modernização que sirva a estratégia de crescimento do Clube.

Agora, a direção avançou para uma AG de sócios, em dia de jogo e a funcionar ao longo de um dia, também com intervenções  remotas por via electrónica, para aprovar e ter o conforto dessa aprovação por parte dos sócios. Tenho dúvidas quanto à regularidade estatutária deste tipo de AG para este efeito.

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O Benfica District em si levanta muito mais dúvidas do que certezas quanto à exequibilidade, à rentabilidade e quanto ao interesse deste projecto para o SLB.

Em primeiro lugar há o problema do licenciamento.

O lote do Estádio, para além do PDM, rege-se pelas regas estabelecidas no alvará do loteamento onde o lote do Benfica está incluído.

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Para avançar com este projecto é essencial alterar o alvará do loteamento. Nas sessões de esclarecimento feitas pelo Vice-Presidente Nuno Catarino foi afirmado que já está feito o PIP para apresentar na CML. Não se percebe como poderão os serviços técnicos da Câmara apreciarem o PIP sem a alteração do loteamento ser concretizada.

Para alterar o loteamento é preciso que todos os proprietários estejam de acordo com a projecto do Benfica, considerando que dele beneficiam ou, pelo menos, não são prejudicados. É preciso que a Câmara aceite aumentar a área de construção para o SLB, quase duplicando a que ainda dispõe, para os cerca de 60 mil metros quadrados.

Este projecto tem um impacto significativo nas acessibilidades ao Estádio e no tráfego. Não se conhecem estudos de acessibilidades e de tráfego, que certamente terão de ser entregues na Câmara.

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No calendário divulgado pelo SLB, considera-se que em 2026 será concretizada a alteração do loteamento, a aprovação do PIP (que depende da alteração) e a seleção de operadores e parceiros (com projecto em estado embrionário não se percebe quem se comprometem a investir). A acontecer, será num prazo recorde para o habitual na CML, mesmo considerando que se trata do Benfica.

Assumindo que o licenciamento acontece, prevê-se para 2027 a elaboração dos projectos de arquitectura e as especialidades (abastecimento de água, electricidade, telecomunicações, acessibilidades, etc).

Se estes projectos só estão concluídos algures em 2027, o que temos neste momento e que a Direção submete aos sócios para aprovação é um mero desenho 3D e os 220 milhões de euros de investimento previsto uma mera estimativa feita com base em preços médios. Ou seja, o risco de o custo final ser maior é evidente e só será orçamentável de forma séria após a conclusão dos projectos das especialidades.

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Em síntese, no que respeita aos projectos está tudo por fazer e os sócios vão votar um cheque em branco.

Mas assumindo que tudo corre bem no licenciamento e na elaboração dos projectos, será que o Benfica District responde às prioridades do SLB em matéria de infra-estruturas e tem sentido estratégico?

Para que vai o SLB investir num pavilhão multiusos com 10 mil lugares de capacidade? Nenhuma razão desportiva o justifica.  Há dois pavilhões que, com um investimento de umas centenas de milhares de euros, continuariam a responder às necessidades desportivas do Clube.

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Tal investimento significa que o SLB vai abrir uma nova área de negócios. Vai concorrer com o MEO ARENA. Mesmo aceitando que há procura para este novo negócio, a questão é se tem sentido o Benfica desviar o seu foco da área desportiva, alocando os escassos recursos (financeiros e humanos) de que dispõe a este negócio.

Nas estimativas de receitas, este pavilhão representa 22 por cento do total. Ou seja, sem este negócio o Benfica District não seria viável, mesmo no papel.

As restantes componentes do projecto também encerram riscos significativos. Food and Beverages, rendas de lojas e renda de hotel representam 21 por cento da receita estimada.

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Ao lado está um dos maiores centros comerciais do país, o Colombo,  com uma estação do Metro dentro. A zona em volta do Estádio da Luz não é amigável para circulação de pessoas, o que potenciaria as vendas de tais lojas. Só vai ao Estádio quem precisa.

Os serviços do Clube e Corporate é suposto contribuirem com 30 por cento da receita. No primeiro caso aumenta custos e no segundo há formas no actual Estádio de potenciar tais receitas, sem o Benfica District.

Em 2027, julgo que lá para o fim do ano, é previsto avançar o project finance.

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Nessa altura, estarão os projectos feitos para entregar na CML, não são conhecidos parceiros de negócio com contratos firmados para garantirem as receitas, que banco financiará um projecto neste estado?

Por definição, os bancos fazem project finance, aceitando como garantia as receitas/rendas, devidamente contratadas e objectivadas.

Se as receitas dependem de um negócio (multiusos) e rendas de lojas a concorrer com o Colombo, quem assume o risco de tais negócios? O banco não será certamente.

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Com exceção do edifício para residência de atletas, nenhuma das componentes do Benfica District é necessária à estratégia de crescimento do Benfica. O foco deveria estar no Estádio (aumento de capacidade e nova cobertura) e no Seixal.

A reorganização/modernização dos espaços à volta do Estádio deveriam ser pensadas numa lógica de complementaridade e melhoria de serviços para os sócios. Já agora o Benfica District ignora a fun zone, que tem pouco espaço e está desadequada.

Finalmente, este investimento certamente será efectuado pelo SLB, através da sua participada Benfica Estádio, dona do lote.

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Que garantias tem o Clube de dar para a concretização do investimento? Os parceiros assumem o risco do negócio? E se falharem  e entregarem o pavilhão e as lojas ao Clube ao fim de dois ou três anos?

Muitas dúvidas para nenhuma certeza. Mais uma vez, a fuga para a frente é a estratégia do presidente Rui Costa, que gostaria de ter o Benfica District para inaugurar no início de Outubro de 2029, sem se preocupar com os riscos que está a fazer o Clube assumir.

 

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Por Jaime Antunes
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