Daniel Sá

Daniel Sá
Daniel Sá Diretor Executivo do IPAM

A Liga Portuguesa, na verdade, cada vez mais estrangeira

O futebol português vive uma transformação silenciosa, mas profunda. Na época 2025/26, estima-se que 19 da totalidade dos clubes das duas principais divisões profissionais — Primeira Liga e Segunda Liga — têm investidores estrangeiros nas suas SADs, o que representa mais de metade do total de emblemas da competição portuguesa.  Em 15 desses casos, esses investidores detêm a maioria do capital, enquanto em quatro ocupam uma posição minoritária.

Na Primeira Liga, o fenómeno é particularmente visível. O Moreirense é o exemplo mais recente, com 70% da SAD vendida ao fundo norte-americano Black Knight Football Club, que também detém o Bournemouth da Premier League. O Famalicão, pioneiro neste movimento, vendeu 51% da SAD ao grupo Quantum Pacific em 2018, e hoje esse grupo, liderado pelo israelita Idan Ofer, controla 85% do capital. O Estoril Praia é detido em 92,3% pelo Globalon Football Holdings, ligado ao norte-americano David Blitzer.

Outros casos incluem o Santa Clara, com 55,8% da SAD nas mãos do empresário brasileiro Bruno Vicintin, e o Rio Ave, cujo capital é detido em 80% por Evangelos Marinakis, dono do Olympiacos e do Nottingham Forest. O AVS Futebol SAD, sucessor do Vilafranquense, é controlado exclusivamente pelo brasileiro Rubens Parreira.

Os recém-promovidos à Primeira Liga também entraram na tendência. O Tondela vendeu a maioria da SAD ao grupo espanhol Elite Gestión y Administración, enquanto o Alverca foi adquirido por um consórcio de investidores espanhóis e brasileiros, com ligações ao jogador Vinicius Júnior, por cerca de 10 milhões de euros.

Mesmo os “grandes” não escapam. O Sporting tem 9,9% da SAD detida pela Holdimo, empresa ligada ao angolano Álvaro Sobrinho. O Benfica viu o grupo norte-americano Lenore Sports Partners adquirir 5,24% da SAD. O SC Braga tem 29,6% do capital nas mãos da Qatar Sports Investments, dona do PSG. O Vitória de Guimarães conta com 29% da SAD detida pelo grupo V Sports, liderado pelo egípcio Nassef Sawiris e pelo norte-americano Wesley Edens.

Na Segunda Liga, o investimento estrangeiro também é expressivo. O Portimonense tem 85,88% da SAD controlada pela britânica For Gool Company, liderada pelo brasileiro Theodoro Fonseca. O Feirense, Académico de Viseu, União de Leiria, Vizela, Oliveirense e Penafiel também contam com capital estrangeiro, em maior ou menor grau.

Este movimento é explicado por vários fatores. Portugal é reconhecido como um trampolim para talentos, com forte tradição formadora e facilidade de adaptação cultural e linguística para jogadores latino-americanos e africanos. A Liga destaca que o país permite a inscrição de muitos estrangeiros e a criação de equipas de desenvolvimento, o que atrai investidores à procura de ativos subvalorizados com elevado potencial de valorização.

Mais tarde do que noutras ligas, a verdade é que a tendência mundial do desporto profissional, passar para as mãos dos ricos chega também a Portugal. Diria que o grande desafio agora é escrutinar o perfil destes investidores estrangeiros: fazem parte do grupo que investe para obter ganhos financeiros de curto prazo ou, por outro lado, prefere um investimento de médio e longo prazo e está mais focado em criar estrutura, sustentabilidade e valor. Eu, sou daqueles que prefere estes últimos. São estes que podem garantir a estabilidade e viabilidade do futebol português.

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