Daniel Sá

Daniel Sá
Daniel Sá Diretor Executivo do IPAM

O desporto tem muito a aprender com a música

Num país onde os festivais de música e os grandes concertos se tornaram experiências culturais de referência, é inevitável perguntar: o que pode o desporto aprender com a indústria da música ao vivo? A resposta é clara: muito. Da organização à comunicação, do ticketing à experiência do espetador, passando pela ativação de patrocinadores, os espetáculos musicais em Portugal estão a elevar a fasquia. E o desporto, se quiser manter-se relevante, tem de acompanhar.

Comecemos pela organização. A MEO Arena, por exemplo, tem vindo a transformar-se num modelo de acessibilidade e inclusão. No concerto de Tate McRae, realizado em maio de 2025, foram usados coletes sensoriais para que pessoas surdas pudessem “sentir” a música através da vibração, e foi disponibilizada audiodescrição para pessoas cegas. Tudo isto sem custos adicionais para os espetadores. Esta atenção ao detalhe e ao conforto do público é ainda rara nos recintos desportivos portugueses, onde a acessibilidade continua a ser um desafio.

Na comunicação, os concertos são mestres em criar expectativa e envolvimento. A tour dos Calema, que culminou com um espetáculo no Estádio da Luz, foi promovida como uma celebração de 15 anos de carreira, com conteúdos exclusivos, bastidores partilhados nas redes sociais e uma narrativa emocional que ligou os fãs à história dos artistas. No desporto, a comunicação continua muitas vezes centrada no resultado, esquecendo que o público quer sentir-se parte de algo maior.

O ticketing é outro exemplo de sofisticação. Muitos concertos oferecem bilhetes com experiências diferenciadas: acesso antecipado, meet & greet, merchandising exclusivo, lugares premium com catering incluído. No desporto, a venda de bilhetes é frequentemente padronizada, sem opções de personalização ou valor acrescentado. A música já percebeu que o bilhete é mais do que uma entrada, é apenas o início da experiência.

A experiência do espetador é onde a diferença mais se nota. Festivais como o MEO Kalorama ou o NOS Alive criam verdadeiras cidades temporárias, com zonas de descanso, ativações interativas, gastronomia de qualidade e ambientes instagramáveis. O desporto, por norma, oferece pouco mais do que o jogo e uma bifana. E isso já não chega.

Por fim, a ativação de patrocinadores. Marcas como a Super Bock, Vodafone ou NOS criam experiências memoráveis nos festivais: desde zonas chill-out a desafios digitais, passando por brindes personalizados e ativações com realidade aumentada. No desporto, muitas ativações continuam a ser estáticas, com pouca criatividade e escasso retorno emocional.

O desporto tem uma vantagem única: a paixão. Mas a paixão precisa de palco, de envolvimento, de memória. A música ao vivo já entendeu isso. Está na hora de o desporto português fazer o mesmo. Porque no fim, o que o público quer não é apenas ver, é viver.

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