Cronistas

O senhor professor

O senhor professor
O senhor professor

1 – QUANDO responde à chamada, Ednilson levanta o braço com timidez e diz o nome em voz baixa, respeitando o perfil de rapaz sensível e aluno assustado. Esse é apenas o primeiro sintoma do que acaba por tornar-se paradoxo insanável: a expressão do rosto e o corpo de menino de escola não encaixam na maturidade de quem prova depois já ter aprendido quase todas as lições da vida e do futebol.

A partir de certa altura, sem dizer uma palavra e com atrevimento quase provocatório, assume o comando das operações; acrescenta coragem a cada atitude; borda de inteligência todas as ideias que gera; reveste de segurança máxima as acções que inicia, desenvolve e algumas vezes conclui.

2 – DURANTE hora e meia, Ednilson assume por sua conta e risco, com o beneplácito do treinador e a cumplicidade dos companheiros, o papel do mestre que dá aulas de gestão e administração futebolística a partir dos sempre complicados caminhos do centro do terreno. Pertence à enciclopédia de uma ciência inconsciente, baseada no instinto, e da matéria aprendida, assimilada com tempo e aperfeiçoada na grande universidade que é o futebol italiano.

Ocupa o espaço, orienta a manobra e garante o equilíbrio; antecipa o passe ou o movimento e rouba a bola; em cada situação e zona do terreno, sabe se deve esperar ou sair ao adversário, se tem condições para ganhar a bola ou se a falta é a melhor solução.

3 – NO SEU estilo há uma característica que distingue os futebolistas de verdade: opta sempre segundo o que entende ser o melhor para a equipa. Nunca se esconde porque tem apurado sentido de responsabilidade, nem reclama qualquer protagonismo porque não é esse o seu estilo.

Ednilson não transforma sozinho o péssimo em óptimo, mas é em si mesmo uma operação de somar sistemática que ao longo do jogo acrescenta e faz aproximar o conjunto do máximo que tem para oferecer. E neste Benfica jovem, a quem falta identidade e liderança, que troca de capitão como quem muda de camisa, o comportamento, o carácter e a personalidade assumem valor superior ao do próprio talento.

4 – SE É verdade que só há duas formas de abordar o jogo – uma festa se a ideia é usufruir da bola, ou uma guerra se o plano é entregá-la ao adversário para depois correr atrás dela –, Ednilson é daqueles que estão técnica e moralmente preparados para tudo. Em poucos meses já sentiu raiva para lançar mensagens para o interior do grupo (como em Braga); chorou nas derrotas; agrediu nas dificuldades (Paços de Ferreira, na Luz); perdeu-se em discussões com o árbitro (em Faro).

Aprendeu depressa o significado da camisa que enverga, de tal forma que em breve será olhado, também por essa lógica da mística, como o senhor professor que tem muito para ensinar.

A figura: Toni

TELEGRAMA – “Data: 1961. Stop. Belfast. Irlanda do Norte. Stop. Para Matt Busby. Manager Manchester United Football Club. Stop. De: Bob Bishop. Stop. Mensagem: Encontrei um génio. Stop.” Foi através de um telegrama sucinto, prova de que há 40 anos não havia empresários, que o olheiro do Man. United deu conta da descoberta de um dos maiores jogadores do século: George Best.

SEGREDO – Tanto tempo passado a única verdade imutável é que os grandes talentos continuam a aparecer (não os génios como Best, esses estão em vias de extinção), a maior parte dos quais fora dos grandes centros e dos grandes clubes. Do Lusitano de Évora para o Farense transferiu-se um defesa-direito desconhecido. Nove meses depois, meia Europa tem-no debaixo de olho.

COBIÇADO – Chama-se Toni, tem 21 anos, é grande revelação do futebol português da presente temporada e um dos melhores jogadores na sua posição – e entre todos seguramente o que tem mais futuro. Despertou a cobiça de muitos clubes estrangeiros que já se apinham no S. Luís para o ver e que estão prontos para desembolsar muitos milhares para o contratar.

ALTERNATIVA – Toni, que fez excelente actuação com o Benfica, mostrou condições para em breve ser alternativa à própria selecção nacional. É uma questão de esperar um pouco: que recupere os efeitos da falta de escola no tempo em que dela mais necessitava e que aumente a experiência competitiva ao mais alto nível. Nessa altura, e a julgar pelo potencial que já mostra, será um caso muito sério.

Passe curto

Se meio Mantorras custou ao Benfica um milhão de contos, não é preciso ser matemático para concluir que inteiro vale dois milhões. Curioso que o destino do mais caro jogador africano de expressão portuguesa de sempre cumpra o traçado histórico que o coloca, para já, no clube de Eusébio da Silva Ferreira.

Depois de Alverca, Clayton voltou a ser decisivo no triunfo em Paranhos. Se ganhar na Madeira, o FC Porto assume o duelo com o Boavista. Ao Marítimo interessa que os portistas façam a melhor carreira possível na I Liga para garantir a UEFA. Um alerta para defender a verdade desportiva: estes regulamentos não prestam.

O Sporting deve a Peter Schmeichel a vitória sobre o Estrela da Amadora, construída através de excelente golo de João Pinto. E os adeptos do Sporting voltaram a mostrar sentido estético apurado, prova de que os protestos em Leiria não foram pela derrota mas pela exibição: desta vez ganharam mas voltaram a não gostar.

No fim de cada derrota, a estratégia pegou moda e foi agora utilizada pelo presidente do Sp. Braga a seguir ao jogo nas Aves: críticas ao árbitro que errou de propósito e ao adversário que correu de mais. Com uma conclusão: “Estamos a incomodar muita gente.” Com tanto barulho sem sentido incomodam de facto toda a gente que tenha o mínimo de bom senso.

Lá por fora...

Guti rubricou uma actuação de sonho no Real Madrid-Villarreal, que os madridistas venceram por 4-0. Sem Morientes e com Raúl no banco, o capitão não fez por menos e apontou três golos que lhe deram todo o protagonismo da partida. Mas nem precisava de tanto: depois de assinar o golo que abriu a contagem não precisava de mais para transformar aquela hora e meia numa noite inesquecível.

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