A hipótese de ver Cristiano Ronaldo e Neymar a vestir a camisola do Flamengo para a disputa do Mundial de Clubes é, no mínimo, sedutora. Dois dos maiores nomes do futebol mundial juntos no clube mais popular do Brasil. Mas há um detalhe crucial que o entusiasmo não pode ignorar: o que se ganha e o que se perde com uma aposta destas?
O brilho individual versus a mecânica colectiva
Não há dúvidas: tanto CR7 quanto Neymar são jogadores de talento raro. O primeiro mantém uma impressionante regularidade física e mental aos 39 anos. O segundo, embora mais marcado por lesões, continua a ter uma visão de jogo e uma qualidade técnica acima da média. Mas o futebol de clubes, sobretudo em torneios curtos, é tanto sobre o talento individual como sobre entrosamento colectivo.
O Flamengo de hoje é uma equipa entrosada, com dinâmicas tácticas bem assimiladas e um plantel que se conhece em campo. Introduzir duas figuras de protagonismo absoluto, com ritmos, rotinas e egos diferentes, pode ser mais uma ruptura do que um reforço, se mal gerido.
CR7: confiança no desempenho, mas fora do sistema?
Cristiano Ronaldo, ao contrário de Neymar, é hoje um jogador que não exige protagonismo criativo. Ele finaliza, movimenta-se bem sem bola e mantém uma ética de treino exemplar. Em termos de fiabilidade, é mais fácil projectar um desempenho positivo de CR7, mesmo fora do contexto habitual. Mas o Flamengo joga com um sistema ofensivo baseado em *mobilidade associativa*, e não necessariamente em um homem de área fixo. A questão é: o sistema adapta-se ao jogador, ou o jogador ao sistema?
Neymar: génio imprevisível e o risco de colisão
Já Neymar carrega outro tipo de incógnitas. A sua genialidade nunca esteve em causa. Mas o tempo de recuperação física, o histórico de lesões e o perfil emocional podem gerar um choque com a estrutura do grupo. O brasileiro tem um estilo de jogo mais centralizador, o que pode atrapalhar a fluidez de uma equipa já coesa e com papéis definidos. E no Mundial de Clubes, não há margem para adaptação prolongada.
Marketing ou título? É preciso escolher a prioridade
É evidente que, em termos de marketing, a presença dos dois elevaria o Flamengo a um patamar de visibilidade global. Camisolas vendidas, audiências astronómicas, patrocínios redobrados. Mas se o objectivo for conquistar o título, então o clube terá de considerar a lógica do futebol: o talento sem contexto pode custar caro.
O tempo necessário para criar química em campo não se compra com popularidade. E no futebol de alto rendimento, experiência e entrosamento são capacidades distintas, mas ambas determinantes.
Em suma: se for pela emoção, é uma jogada de mestre. Se for pela razão, é um risco calculado que precisa de muito mais do que nomes no papel. Afinal, um título mundial não se ganha apenas com estrelas, mas com equipa.
Por Fabiano Abreu Agrela