Gaspar Ferreira

Gaspar Ferreira
Gaspar Ferreira Ordem dos Psicólogos Portugueses

A 14 segundos do sucesso

A seleção Portuguesa de futsal, campeã mundial em título, foi eliminada nos oitavos de final pelo Cazaquistão, com um golo sofrido a 14 segundos do fim da partida. Umas horas antes, tive o privilégio de conversar com o psicólogo das seleções de futebol, Jorge Silvério, numa entrevista online realizada no âmbito de um  Congresso Internacional promovido pela Ordem dos Psicólogos Portugueses. Uma das questões colocadas ao psicólogo, que se encontra a apoiar a equipa no Uzbequistão, foi se existia um plano de recuperação psicológica para os atletas caso o desenlace não fosse favorável, e acabamos, também por isso, a analisar aspetos mais relacionados com a gestão de carreira dos atletas. Jorge Silvério partilhou que no momento atual havia apenas dois jogadores com perspetivas muito favoráveis do ponto de vista económico, mas que o panorama geral dos jogadores de futsal "é que  ganham o dinheiro suficiente para ter uma vida normal, para pagarem as contas, mas não ganham o suficiente para acabarem a carreira aos 38 e não precisarem de fazer mais nada". Acrescentou que "ao nível da gestão e planeamento da carreira temos a sorte de muitos dos jogadores concluírem formações superiores ainda enquanto atletas, mas temos alguns que não concluíram os seus estudos." Valorizou, por isso, a existência de uma atenção muito especial a esta dimensão do seu trabalho com os seus atletas. 

A este propósito, Cristina Fafiães, psicóloga da Rede UAARE, presente no evento, concordou que ser aluno e atleta no ensino superior traz inúmeros desafios e pressão mental, e que para um atleta é muito importante ter um plano B. Aproveitou para partilhar que o acesso a estes serviços se vai tornar tendencialmente mais universal, pois já arrancou o projeto piloto UAARE Superior, sob a coordenação do Prof. Vitor Pardal, com o objetivo de conciliar a carreira desportiva com o ser estudante, também no Ensino Superior.  Nesta fase o serviço de apoio aos alunos e atletas estará disponível na Universidade do Porto, na Universidade de Coimbra, na Universidade do Minho, na Universidade de Aveiro, no Instituto Politécnico de Santarém e no Instituto Politécnico de Leiria.

Se é verdade que o sucesso e o reconhecimento público de uma equipa pode depender de um golo marcado ou sofrido a 14 segundos do fim do jogo, sabemos hoje que a disponibilidade de apoio psicológico à gestão de carreira é um fator protetor fundamental não só no planeamento do futuro dos atletas, mas também na construção da resiliência para lidar com momentos críticos dentro e fora dos recintos desportivos.

A complementaridade de uma rede pública universal de apoio a estudantes atletas com iniciativas privadas que contemplam o apoio às carreiras duais, presente no exemplo virtuoso da Federação Portuguesa de Futebol, e que testemunhamos no trabalho de Jorge Silvério, permite que tenhamos a esperança de que ser atleta já não significa que é preciso escolher entre o desporto e uma educação integral.

Hoje é possível construir um futuro onde os atletas podem conciliar a paixão pelo desporto com a construção de um projeto de vida mais sólido e sustentável, com mais saúde psicológica.

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