Nuno Félix

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Nuno Félix Scout internacional

Vítor Roque no Palmeiras: O ponto de viragem para a Nova Era no Futebol Brasileiro

A transferência de Vitor Roque do Barcelona para o Palmeiras representa mais do que uma simples operação de mercado, é a face visível para o planeta futebol do que está a acontecer no futebol brasileiro, evidenciando a crescente capacidade de investimento dos clubes nacionais e o fortalecimento da competitividade à escala global da sua gestão desportiva.

Nos últimos anos, o Palmeiras consolidou-se como um dos clubes mais bem geridos do Brasil, combinando equilíbrio financeiro com resultados desportivos impares na história que o nosso Abel Ferreira ajudou a escrever para o clube. Sob a presidência de Leila Pereira, o clube tem investido fortemente na manutenção de um plantel competitivo, na modernização das suas infraestruturas e, agora, na contratação de talentos que, até há pouco tempo, eram impensáveis resgatar ao futebol europeu.

A chegada de Vitor Roque ao Palmeiras marca uma mudança de paradigma. 

Historicamente, o Brasil sempre foi um exportador de talentos. Agora, assistimos a um movimento contrário: um jovem avançado promissor, que havia sido recentemente adquirido pelo Barcelona, regressa ao país para representar o "Verdão".

Esta transferência reflete o fulgor financeiro do Palmeiras, mas também o novo futebol brasileiro. Com o crescimento das receitas televisivas, com patrocínios robustos, e a implementação de uma gestão mais profissional, clubes como o Palmeiras, Flamengo e Atlético Mineiro estão a conseguir competir no mercado internacional de transferências, como nunca acontecera antes.

Os dados do Global Transfer Report da FIFA mostram que o Brasil continua a ser o maior exportador de talentos para a Europa. Entre 2011 e 2020, os clubes brasileiros transferiram 15.128 jogadores para o estrangeiro, gerando 7,1 mil milhões de dólares em receitas, tendo sido Portugal o principal destino, acolhendo 1.556 jogadores brasileiros durante este período.

Em 2024, o Brasil manteve esta liderança, com 2.350 jogadores "exportados"  dos quais resultaram 1,9 mil milhões de dólares em receitas, o que torna evidente como o jogador brasileiro agora custa em média aproximadamente o dobro do que era pedido na década passada. As transferências para Portugal continuam a ser as mais frequentes, com 262 jogadores que movimentaram 33,9 milhões de dólares.

No sentido inverso, entre 2011 e 2020, registaram-se 934 transferências de Portugal para o Brasil, refletindo essencialmente o regresso de jogadores brasileiros em final de carreira após passagem pelo futebol europeu. No entanto, apenas em 2024, registaram-se 223 transferências de Portugal  para o Brasil, movimentando 24,8 milhões de dólares, o que é bem demonstrativo do aumento deste fluxo de Portugal para o Brasil, e de como o Brasil começa a pagar pelos jogadores a atuarem no campeonato português.

Comparando com a década anterior, observa-se um crescimento significativo na capacidade de negociação dos clubes brasileiros. Se antes os clubes europeus monopolizavam os talentos emergentes no Brasileirão, agora os clubes brasileiros começam a ter capacidade para competir financeiramente logo no momento da sua retenção e, invertendo até, o fluxo que foi tradicional durante décadas.

Há dez anos, um jogador do nível de Vítor Roque dificilmente regressaria ao Brasil tão cedo. Mas hoje, clubes como o Palmeiras já têm estrutura financeira e desportiva para oferecer um projeto de carreira competitivo ao jogador que sente que não está a dar necessariamente um passo atrás regressando ao Brasil.

Esta mudança terá um impacto direto na forma como os clubes europeus encaram o mercado sul-americano. Se antes Portugal era um destino natural para jovens talentos brasileiros devido ao baixo custo e à facilidade de adaptação, agora os clubes brasileiros começam a rivalizar diretamente com Benfica, FC Porto e Sporting na disputa por jogadores, e começam mesmo a cobiçar alguns frutos das melhores escolas de formação de Portugal.

A contratação de Vítor Roque pelo Palmeiras não será um acontecimento isolado, é sim um reflexo visível de um futebol brasileiro que procura reinventar-se.

Talvez seja agora que o Brasil se afirma não apenas por formar os maiores talentos do futebol mundial, mas também por ter alguns dos mais interessantes projetos desportivos do Mundo, por enquanto apenas ao nível dos seus clubes, mas quem sabe no futuro também ao nível das suas competições que ainda sofrem bastante com a sobre dosagem do seu calendário e de muitas influências externas à sua organização.

Poderemos estar a testemunhar o início de uma nova era, onde o futebol brasileiro venha a tornar-se num destino competitivo para jogadores de elite no pico do seu potencial, e aqui igualmente para nosso prejuízo, que nos habituamos durante décadas a ter Portugal como ponto de passagem obrigatório para os melhores jogadores brasileiros de muitas gerações.

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