Escrevem os Leitores
Durante as próximas semanas, os amantes do futebol estão ao rubro. Assistir ao jogo de competições nacionais ou internacionais, neste momento com o Europeu de 2016, é, para nós, ocidentais, algo tão corriqueiro, que já faz parte da nossa natureza de uma forma tão natural como comer, respirar ou dormir: quando chegamos a meados de Junho, de dois em dois anos, já sabemos que vamos instalar-nos em frente à televisão durante horas para seguir todos os acontecimentos, mesmo os jogos aparentemente desinteressantes.
Esta realidade contrasta, porém, com a de milhões de pessoas que, por mais que amem futebol, não podem vê-lo nem sequer praticá-lo. Refiro-me a pessoas que se encontram em territórios administrados por grupos extremistas islâmicos, entre os quais o Da’esh, mas também outros proeminentes como o Boko Haram (Nigéria) ou a Al-Shabaab (Somália). Nestes territórios, existem estádios de futebol, mas os mesmos são destinados a acções de propaganda e demonstração de força jihadista, à execução pública de pessoas que violaram a sharia (lei islâmica) e até a instalação de órgãos das estruturas de poder dos fundamentalistas.
Nestes territórios, não é permitido assistir a jogos de futebol pela televisão, nem tão pouco a jogar futebol, na rua que seja. Mas, pergunta o leitor, porque motivo é proibido o futebol se, aparentemente, não implica acções consideradas imorais? O entendimento não é unânime, pois, na prática, cada um faz a sua interpretação e aplica a sua razão – que, em muitos casos, é a razão da força e o "porque sim".
Neste sentido, autoridades islâmicas mais conservadoras de países como a Arábia Saudita têm defendido que é preferível não estar presente ou participar em actividades desportivas. Todavia, caso se insista em fazê-lo, sujeitam essa relação com o desporto à condição de não serem negligenciados os deveres impostos aos muçulmanos (tais como o jejum e as orações diárias), mas também à obrigação de os praticantes ou os espectadores não repararem no corpo dos outros nem desenvolverem sentimentos de animosidade ou rancor para com terceiros (praticantes ou apoiantes de outras equipas).
No mais, considera-se que os eventos desportivos distraem os participantes e o público e podem desviá-los dos seus deveres e abrir caminho a condutas imorais, enquanto se se resumirem a acções religiosas mais facilmente seguirão o propósito de Deus. Claro está que em visões extremistas como as de territórios controlados por organizações como o Da’esh a interpretação dos preceitos islâmicos é de tal forma dominada pelo fanatismo que o futebol está banido em praticamente todo o território, mesmo a crianças de 12 ou 15 anos, exactamente por se pretender que se dediquem exclusivamente à causa religiosa e não se distraiam com trivialidades, investindo-se totalmente na sua radicalização para servir a "causa".