Qual é o problema
1 - O que traz de novo a aplicação do mecanismo de solidariedade da FIFA às transferências internas com "dimensão internacional"?
O mecanismo de solidariedade encontra-se consagrado no Regulamento de Transferências de jogadores FIFA, "FIFA Regulations on the Status and Transfer of Players", tratando-se de uma compensação atribuída a qualquer clube que tenha contribuido para a educação e formação de um jogador profissional, sendo estabelecido que 5% de qualquer compensação tem de ser obrigatoriamente deduzida e distribuída pelos clubes formadores que tenham tido o jogador oficialmente registado entre as épocas desportivas dos seus 12 aos 23 anos de idade.
Este mecanismo não tem sido, infelizmente, suficiente, para evitar o contínuo fosso entre associações nacionais, ligas e clubes, não estando a cumprir o seu papel redistributivo de forma efetiva.
Um "pequeno passo" introduzido pela FIFA no Regulamento para assegurar a maior eficiência e abrangência do mecanismo de solidariedade foi a entrada em vigor, no passado dia 1 de julho de 2020, da extensão de aplicação do mecanismo às transferências internas com "dimensão internacional".
Anteriormente o mecanismo de solidariedade da FIFA apenas atuava no caso de transferências internacionais (não obstante o facto de cada associação poder consagrar nos seus próprios regulamentos um mecanismo de solidariedade interno para transferências nacionais, como é aliás o caso de Portugal). Atualmente, no anexo 5, número 2, do Regulamento, a FIFA veio então estabelecer que as transferências internas originarão também contribuições de solidariedade "quando um jogador profissional seja transferido, de forma temporária ou permanente, ente clubes da mesma associação, desde que o clube formador seja afiliado de uma associação diferente".
Como exemplo prático, olhemos para a transferência do jogador Diogo Jota do Wolverhampton para o Liverpool em setembro de 2020. Ao abrigo do regime anterior, esta transferência não originaria qualquer mecanismo de solidariedade por se tratar de uma transferência interna, ou seja, os 5% de uma transferência de um montante a rondar os 45M€ não seriam re-distribuidos pelos clubes formadores. Ao abrigo do novo regime, os clubes formadores afiliados de uma associação diferente da inglesa (caso dos clubes portugueses Gondomar, Paços de Ferreira ou FC Porto) puderam beneficiar da re-distribuição proporcional desencadeada por este mecanismo.
2 – A extensão de aplicação do mecanismo de solidariedade às transferências internas com "dimensão internacional" é uma medida suficiente no âmbito da reforma deste mecanismo?
A resposta é não. Entendemos que a FIFA deveria não só aconselhar, mas também verdadeiramente impor a aplicação do mecanismo de solidariedade a todas as transferências internas, independentemente de existir ou não uma componente internacional, aplicando por exemplo sanções fortes e eficazes às associações nacionais que não viessem a adotar o mecanismo nos seus regulamentos internos. Os clubes formadores não podem ver os seus esforços serem deixados à sorte dos seus talentos virem a ser transferidos apenas internacionalmente, sendo que só com a aplicação global a todas as transferências é que a FIFA e o seu mecanismo de solidariedade assumirão o seu verdadeiro papel aglutinador e de promoção da competitivade, equidade e justiça no futebol.
Guilherme von Cupper, associado n.º 272