Manuel Faria: Vitórias que até mudaram o nosso futebol

Triunfou em 1956 e 1957 e os seus métodos de treino foram aplicados no Benfica e no Sporting

Não há volta a dar. Todos os anos por esta altura fala-se de Manuel Faria e das suas duas vitórias na então famosa corrida de São Silvestre de São Paulo em 1956 e 1957. Foi o primeiro sinal de afirmação internacional do nosso atletismo (muito pequeno, tal como o nosso país), que estava à procura de um herói. Depois houve um tal Manuel Oliveira (4º classificado nos Jogos de Tóquio em 1964) e, mais tarde, foram Carlos Lopes e Fernando Mamede a darem uma expressão mundial em toda a linha ao atletismo português...

Mas o mais interessante nas duas vitórias de Manuel Faria é que o fundista, natural de Abrantes (1930-2004), não era treinado por Moniz Pereira, mas sim por Luís Aguiar, um antigo saltador em altura, que depressa virou técnico e que à sua maneira soube construir um campeão de corpo inteiro, adaptando um conceito que virou moda. Era o chamado ‘treino intervalado’ preconizado por dois alemães, o técnico Woldemar Gerschler e o cardiologista Herbert Reindel.

O Sporting chegou a pagar vários estágios a Manuel Faria na Universidade de Friburgo e Luís Aguiar foi ter com ele numa motorizada scooter, dormindo num parque de campismo. Era assim naquela altura...

E qual é, na verdade, o segredo do chamado ‘ treino intervalado’, que depressa se generalizou ao futebol e a outras modalidades? Basicamente, o atleta estava sujeito a correr várias vezes uma determinada distância e o intervalo de recuperação era fixado para se saber como funcionava realmente a máquina cardíaca.

Nos anos 50, o checo Emil Zatopek chegava a percorrer 40x400 metros para 70/75 segundos com recuperação de 200 metros em corrida ligeira, mas os dois técnicos alemães rapidamente chegaram à conclusão que se deveria aumentar a intensidade e retirar volume.

Manuel Faria, que dominou de forma clara os anos 50, batendo uma série de recordes nacionais, desde os 1.500 metros aos 10.000 metros, adaptou-se muito bem a este conceito. Disciplinado, humilde, tinha condições para evoluir e estava bem policiado por Luís Aguiar, que pensava em tudo. Ia buscar o seu pupilo ao emprego de motocicleta para não perder tempo em transportes e assim treinar mais tempo...

Partilha de informação

Luís Aguiar chegou a trocar correspondência nos anos 50 com Woldemar Gerschler e este acedeu a dar algumas informações, convidando o técnico português a ir à Alemanha. Mais tarde foi Gerschler a visitar Portugal, ficando maravilhado com a Praia das Maçãs, dando até um curso de formação aos nossos treinadores no Estádio Nacional.

Não tardou muito para o chamado ‘treino intervalado’ virar moda e em Portugal dois conhecidos técnicos, Fernando Ferreira, do Benfica, um dos fundadores de Record, e Moniz Pereira, do Sporting, aplicaram este conceito ao futebol, onde foram preparadores físicos nos clubes e na Seleção.

Moniz Pereira e os sprints de 50 metros

Nos trabalhos que chegou a publicar, Moniz Pereira, que na qualidade de preparador físico foi campeão pelo Sporting em 70 com Fernando Vaz, tinha a noção que o treino do atletismo não poderia ser copiado para o futebol. "Está provado que a resistência para os 90 minutos não se pode alcançar com voltas e mais voltas ao retângulo em andamento moderado. O maratonista José Araújo ou Filipe Luís dão com facilidade 40 voltas à pista e nem por isso se podem considerar preparados para fazer um jogo de futebol, que exige constantes sprints. O jogador deve fazer muitos sprints de 50 metros com um intervalo de 2 minutos", escreveu Moniz Pereira, que em jeito de conclusão deu a receita: "Quando um jogador conseguir realizar 10 vezes essa distância, sem que a diferença entre o seu pior tempo e o melhor seja superior a 1 segundo, é sinal que se encontra apto a um desafio sem esforço."

Por Norberto Santos
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