Descolámos do Porto passava já das 7:00 de sexta-feira, num voo com destino a Milão que inicialmente estava agendado para as 6:15, mas que atrasou quase uma hora devido a um problema técnico. Apenas esperava que este não fosse um mau augurio para um fim de semana ansiado à uns 9 meses! Decidimos chegar a Florença via Milão, fazendo depois a viagem de comboio, por várias razões – não há voos diretos entre Porto e Florença e os voos Lisboa Florença têm um preço absolutamente proibitivo. Fazendo a viagem desta forma, apesar de mais cansativa, tínhamos oportunidade para passar algumas horas na belíssima cidade de Milão. Para um amante de Itália, como eu, é sempre uma boa opção! O atraso no voo acabou por condicionar bastante o planos, mas sobrou ainda tempo para almoçar no centro de Milão!
Chovia com alguma intensidade quando chegámos a Milão, mas não nos preocupamos muito porque as previsões meteorológicas para domingo eram perfeitas.
Nesta altura percebemos que, no final das contas, tínhamos acabo de ter uma sorte incrível na nossa viagem de Aveiro até ao Porto – chovia torrencialmente e, pouco depois de passarmos, a A1 foi cortada por estragos causados pelo mau tempo.
Adiante. Apanhámos o comboio e chegámos finalmente a Florença às 18:30h, absolutamente exaustos. Fomos fazer o check-in no hotel, que felizmente era perto, jantámos uma bela pizza (estávamos esfomeados) e, ainda nem eram 9:00h locais já dormia.
No sábado, acordámos bastante cedo e parecia que estávamos noutra dimensão – 15ºC, zero chuva e zero vento e um autêntico dia de primavera! Meti uma bolacha à boca e fomos fazer uma ligeiríssima corrida de "adaptação ao relvado" à volta da Forteza da Basso. Foram 2,5km a 6:45 e 1km em ritmo de prova apenas pra ver se estava tudo no lugar! Espaço aberto na barriguinha e fomos ao pequeno almoço – afigurava-se um duríssimo dia carbload!
Fomos então em direção à Stazione Leopolda, o local da feira da Feira da Maratona. Aqui, pela primeira vez, senti que estava numa verdadeira feira de Maratona. À entrada estava imediatamente o mural com o nome dos participantes. Como estou sempre nos primeiros, não foi difícil encontrar o meu. Entrámos no centro de congressos e parece que levei com uma rajada de maratonismo em cima! Era Asics por todo o lado. Imediatamente somos abordados por um dos inúmeros voluntários que nos entregam duas coisas – um pequeno mapa com os passos a dar para o levantamento do dorsal, do kit, da t-shirt e por fim a verificação do chip e um mapa da cidade de Florença, detalhado, com o percurso da Maratona. Parece um pormenor sem importância, até porque é algo que está sempre disponível online, mas para quem não é da cidade e vai acompanhar a prova (como o caso da minha roadie Sofia Cavaco) é uma verdadeira mais valia. Feitos todos os passos necessários, tiradas as fotos da praxe, demos uma vista de olhos pelos stands – estavam imensas provas com stand e algumas marcas especializadas.
O destaque naturalmente para a Asics, patrocinador principal e para a Enervit, que também era patrocinador relevante. O Kit não era nada extraordinário, mas tinha algumas coisas curiosas, para além da sweat Asics que é absolutamente linda! Ofereceram um pequeno pack de produtos Enervit para experimentarmos, creme para pés, uma capa plástica para o pré-prova (e assim não ter que ir vestido com um saco do lixo...), azeite (um dos patrocinadores), flyers, livro da maratona e... detergente para a roupa! Pois é, quem é de fora, acaba a prova e a última coisa que quer é levar a roupa a feder na mala. No nosso caso até já tínhamos planeado ir a uma lavandaria self-service. Noutras situações já levei detergente para tratar do assunto no hotel, mas com desta forma não seria preciso. Esta é uma maratona que, vão perceber, é feita de pequenos pormenores que são extremamente agradáveis e que a distinguem pela positiva!
Despachada a feira, fomos ao hotel deixar as tralhas e tirámos a tarde para passear um pouco e claro, comer. Ao almoço, a refeição onde gosto de carregar mais, escolhemos uma Trattoria com refeição Italiana completa e então comi uma Penne alla Putanesca (molho de tomate, azeitonas e anchovas) e um Rolo de Carne com Riccota e Espinafres (regado com um molho igualzinho ao molho de um prego bem português!). Demos uma volta no centro e começámos a pensar no jantar – comi uma belíssima Pasta allo Scoglio num restaurante tipicamente Italiano! Comer em Itália é absolutamente fantástico!
Com isto tudo às 10:00h já estava na cama e dar os últimos toques na estratégia para o grande dia!
Estava tudo pronto!
Eram 6:00h locais e toca o despertador. Não dormi mal, mas também não dormi profundamente. Reparei que a minha colega de quarto, roadie, manager e consciência já estava ON e de um lado para o outro. Rebolei para o outro lado da cama, confiante que não dormiria de mais. Saí então da cama seriam umas 6:10 e fui direto para o banho em tentativa de abrir apropriadamente os olhos. Do equipamento de prova apenas vesti os calções – tudo o resto já estava desde a véspera na sacola da organização pronto para "equipar" já perto da partida. Descemos para o pequeno almoço ainda não eram 6:30. Apesar de o habitualmente o pequeno almoço do hotel apenas começar às 7:00, por causa da quantidade de hóspedes que iam correr a maratona, o serviço começou eram 6:00. Quando chegámos já a sala estava cheia de corredores – o hotel onde ficámos não era grande, mas dos 25 quartos, seguramente mais de 15 tinham hóspedes corredores. Cruzámos-mos com um grande grupo de Franceses (nacionalidade mais representada nesta maratona, com cerca de 10% dos inscritos) de meia idade. Claramente o tipo de corredor a que acho mais piada – tem mais de 45 anos, vai em grupo fazer o maraturismo. Normalmente corre o homem e a mulher, mas nem sempre. É malta que claramente já tem os filhos criados e está a apreciar uma segunda adolescência. Quando nos olhamos e percebemos que não falamos a língua uns dos outros, mas desejamos boa sorte para a prova em gestos e em formas fonéticas estranhas. Adiante, lá comemos qualquer coisa e bebo um café duplo pra ver se abro um bocado mais os olhos – em itália, definitivamente, não é preciso ter grande preocupação com o que podemos ou não vir a comer. Estes caramelos sabem bem o que é bom!
Subimos ao quarto para calçar e apanhar as coisas e saímos. Seriam umas 7:00h (ainda noite) e estávamos a pouco mais de 10 minutos a pé do acesso aos currais de partida. Paramos perto da belíssima Stazione de Santa Maria Nouvella para beber mais um café, já com o dia a nascer. Já se começava a sentir maratona. Gente e mais gente de sapatilhas calçadas e em direção ao mesmo sítio. Nestes dias não há muito que enganar senão seguir a multidão.
Seguimos em direção à Piazza de Santa Maria Nouvella que era o meeting point dos corredores – aqui estava situado o bengaleiro, um bom número de WCs e, imagine-se, umas tendas para que, quem quisesse, trocasse de roupa com a devida privacidade. Equipei-me e sou abordado por uma Coreana para que lhe tirasse umas fotos – nada de anormal se não estivesse a rapariga toda equipada à adidas, dizendo a sua t-shirt "Adidas Team Seoul", mas nos seus pés estavam umas reluzentes Nike Vaporfly Next % rosa choque – diz bem do que se passa no mercado do calçado de corrida.
Já equipado, tiro eu meia dúzia de fotos, e começo a correr em ligeiro aquecimento. Pouco antes da 8:00 decido que é hora e parto em direção à linha de partida. Estava bem avisado pela organização de que quem entrasse no curral até às 8:15 entrava, quem não o fizesse teria que sair do último grupo. A última coisa que queria era sair com a malta que ia fazer mais de 5:00 horas – neste caso significaria ter que passar umas 5000 pessoas (!!!!) até chegar ao grupo do meu ritmo!
Seguimos pela Via del Sole, até à Piazza della Repubblica onde estava a entrada para a primeira zona fechada. Aqui entravam os 3 grupos mais rápidos (com exceção do elites) e daqui é que se fazia a separação. Nesta zona fechada havia um pequeno "aperitivo" para os corredores – água, chá, fruta e uns "dolces". Nesta zona estavam também mais alguns WCs que, a esta hora, já tinham filas enormes. Naturalmente que os homens estavam já todos a saltar as grades da zona fechada e a procurar esquinas e recantos. É feio, mas onde mija um corredor, mijam logo dois ou três.
Dou por mim no curral, a uns 20 minutos da partida e sem qualquer sinal de ansiedade. Nunca corri uma maratona com tão pouca ansiedade! A naturalidade com que estava a encarar o que iria em breve desfrutar foi incrível. Acho que, no percurso para esta maratona, percebi que uma maratona é um percurso de 4 meses e do qual se deve desfrutar de cada momento e não só daquelas 3 ou 4 horas de prova. Sentia, naquele momento, exatamente isso. Olhava à volta, via imensa gente das mais variadas origens e sentia-me extremamente satisfeito por ali estar.
A partida é feita entre o Duomo e o Baptistério e o acesso é feito através da Via del Calzaiouli – uma rua estreita e bem típica do centro de Florença. Até aqui, e do ponto de vista da organização, tudo absolutamente perfeito. Os voluntários vestiam todos um belo blusão Asics Verde tropa que se distinguia com bastante facilidade. E eram muuuuitos!!!!.
Tiro de partida e começava esta verdadeira obra de arte que é a Firenze Marathon, mesmo em frente ao Duomo de Floreça, a Catedral de Santa Maria del Fiore, uma obra de arte que tem tanto de belo como de rico e de imponente!
Comecei calmíssimo no primeiro km, ainda nas estreitas ruas do centro da cidade que já tinha bastante público – resultado 5:33. Saímos então do centro sinuoso, o piso melhora substancialmente, os corredores começam a encontrar o seu espaço, e eu encontro o meu ritmo, como planeado, a rondar os 5:00. Fazemos um retorno na Viale Giacomo Matteotti e seguimos em direção à Forteza da Basso. Logo a seguir era a marca dos 5km e a prova estava, para mim, a voar. Aqui estava a Sofia à minha espera e depois de mandar um beijo para a fotografia atirei-lhe com o buff que levava. O São Pedro foi um verdadeiro parceiro dos corredores e reservou um dia absolutamente fantástico para a prova!
A parte seguinte da prova é bela mas sem história e quase sem público. Basicamente são 12 km às voltas no belíssimo Parco delle Cascine, que terminariam ao km 17 na primeira passagem sobre o Rio Arno. Podemos dizer que aqui começa a prova – até aqui não passa de um aquecimento. Digo que começa a prova por várias razões – nesta ponte é onde encontramos a primeira bolsa de publico e é onde ouço a primeira vez um "Andiamo Portugallo!". É, onde também, começa a grande dificuldade da prova, que é o paralelo! Esta prova é relativamente plana – não é perfeita por causa de um par de viadutos explosivos! No entanto, temos que contar com cerca de 10% da prova em paralelo, o que até nem é muito – não fosse estar grande parte depois do km 35...
Voltando à prova, as palmas dos italianos subiram-me à cabeça e quando dei por mim estava a fazer kms a 4:45! Vamos lá por um "arréte" aqui na coisa, pensei eu – mas como do pensamento à prática ainda vai um pedaço...
Aos 18km estava novamente a minha roadie, desta vez com um flask de Isotónico e uma salt bar para me entregar – tudo para correr umas gramas mais leve.
E aqui chegamos ao grande defeito desta prova (e dos muito poucos reparos que consigo fazer) – o abastecimento em copo! Eu sei, eu sei, que é o que todo mundo civilizado usa, mas porra, não dá jeito nenhum!
Graças a isto consegui seguir até ao km 25 praticamente sem parar em nenhum abastecimento. Digo abastecimento porque, tenho que confessar, ao km 12, em pleno parque verde, tive que ir ter uma pequena conversa com uma árvore! É impressionante como, mesmo indo "à parede" 20 minutos antes da prova começar, já estava com vontade... felizmente segui até final da prova em perfeição!
Voltando à prova, depois de passar a Sofia a segunda vez, seguimos à beira rio até à Ponte Vechio. Mal virámos à esquerda começou novo banho de multidão – desta vez ainda relativamente curto, as serviu para esquecer os 500m do pior paralelo da prova que se aproximavam!
Mais uma passagem a sul do rio, de novo a norte e finalmente passamos o pórtico da Meia Maratona. Este é sempre um marco importante – depois do aquecimento feito é aqui que eu penso "bem, agora é só fazer isto outra vez"! Virei a meia maratona em 1:45:52 – 52s acima do objetivo definido significava que estava a correr perfeitamente!
Seguimos mais 4km à beira rio, com pouco publico e começo a ver os primeiros atletas a fraquejar. Tento ignorar e foco-me no quão bem me estava a sentir. Começo, no entanto, a mentalizar-me que a montanha ainda estava para trepar e havia que gerir muito bem as energias. Sentia-me muito bem em termos musculares – estava a fazer um bloco de 5km seguidos a 4:55. Mas como nada é perfeito, começava a sentir algumas dores na palma dos pés, pela dureza das sapatilhas (algo previsível e que sabia que tinha que gerir!) e nas articulações dos joelhos. Estas dores eram mais chatas de gerir e de controlar. Nesta fase decido por em prática a estratégia mais me ajudou – parar nos abastecimentos! Por norma, evito ao máximo caminhar nos abastecimentos para não quebrar o ritmo. Aqui, por causa dos copos, era algo que tinha que fazer obrigatoriamente, portanto decidi fazê-lo, com a devida calma para me hidratar devidamente e aproveitar e aliviar um pouco os joelhos e os pés! Aos 25km abrandei uns 20 segundos – quando retomei parecia novo! Voltei rapidamente ao meu ritmo e assim segui até ao km 30, já perto do Stadio Comunale. Nesta altura tinha que comer a última Salt Bar. Parei, comi, bebi água e isotónico, tirei géis da organização (este era o único ponto onde distribuíram) e retomei a corrida como novo. Nesta altura começou a fase em que mais tenho que agradecer a Florença o apoio – aproximei-me de uma das voluntárias na zona da água e disse "due (copos), per favor". Não sei se pelo meu esforço em falar Italiano se que, a senhora desatou a incentivar "andiamo Portugallo!". A coisa parece que se espalhou pelos outros e, inexplicavelmente, dali até ao fim, imensa gente que via a minha camisola a dizer Portugal e puxava por mim. Havia Franceses, Alemães, Polacos, Austríacos, toda e mais alguma nacionalidade mas os Italianos só puxavam por Portugal! Às tantas uma outra senhora, Brasileira e voluntária, desata a correr ao meu lado e a incentivar – absolutamente indescritível!!!! Como é possível não correr assim?
Depois do Km 30 começou verdadeiramente a prova para mim. Se até ao 32 consegui gerir bem as dores, a partir daí entrei em algum sofrimento e a pensar km a km. Primeiro pensava no abastecimento dos 35 para me deixar caminhar um bocado, depois nos 37 onde a Sofia me esperava a última vez para entregar a bandeira de Portugal. Sentia-me com energia, bem hidratado, sem a sensação de desfalecimento causado pelo muro (que não vi...) mas com bastantes dores musculares. Depois dos 37km abrandei o ritmo, mas ainda conseguia correr a 5:15. Nesta fase o grande adversário foi o paralelo. Estávamos de volta ao centro da cidade, nas belíssimas e duras ruelas tão características! Ao km 38 passamos mesmo ao pé da meta, no Duomo, mas virámos para mais 4km às voltas – é duro psicologicamente, mas já estava avisado para a situação.
Nesta altura olho para o relógio e percebo que só um verdadeiro descalabro me iria tirar um belo PR, mas sabia também que este PR ia ser tanto melhor quanto melhor conseguisse combater a dor. Estava com um discernimento incrível. Chego ao km 40 e vejo um corredor Inglês com uma tshirt a dizer "Pain is only pain". Li aquilo e pensei no quão perfeita era aquela frase, naquele momento da prova. Revigorei-me e arranquei para a meta sem mais parar!
O meu relógio marca o Km 41 em 3:29:25 e eu imagino-me imediatamente a terminar em 3:35:00 – um tempo absolutamente fantástico para mim. Sigo forte e, quando sem estar à espera, depois de cortar à esquerda vejo a meta, já ali à frente... O relógio marcava 41,5km... Estranho porque toda a prova a coisa andou muito certinha e eu tinha visto os kms marcados até ao km 40. Tiro a bandeira do flipbelt meio à pressa, levanto-a e termino! Olho para o relógio e marca 3:33:30!!! Tiro a selfie da praxe e sigo, sem desligar o relógio, em busca da minha bela medalha! Frustrado porque o relógio marcava 41,8km...
Mas não havia volta a dar, estava feita esta autêntica obra de arte!
Já depois de almoço vejo um comunicado da organização em que é explicado que, durante a prova e já depois de 50 atletas terem passado, por causa de uma fuga de gás, foram obrigados a atalhar o percurso entre o km 40 e o 41, o que retirou os tais 400m à prova. Segurança acima de tudo.
Depois disto tudo o que posso dizer? Corram a Maratona de Florença, é uma autêntica obra de arte, ultra bem organizada e com pequenos pormenores que fazem a diferença pela positiva. Com cerca de 10000 participantes tem uma boa dimensão, sem qualquer confusão e o apoio é incrível. Sendo no final de novembro, há sempre o risco do tempo, mas até nisso tive uma sorte incrível.
Até ao dia 23-2-2020, em Sevilha, Espanha.
#quandoacaba
Autor: André Andrade
Participaste na Maratona de Valência? Conta-nos como foi a tua experiência, enviando o teu relato acompanhado de uma foto para o email recordptrunning@gmail.com
Depois de subir ao Evereste, português correu a maratona
Pedro Queirós começou já há duas semanas a angariar dinheiro através das redes sociais para as crianças
Portuguesa repetiu o mesmo lugar conseguido em 2017
Companhia aérea 'proibiu' música do defesa nos seus voos
Pressão sobre águias e dragões faz disparar gastos a Liga Betclic, defende economista João Duque
Médio jogou no Galatasaray com o extremo, que foi polémico ao apresentar-se no Fenerbahçe
Uche replicou, palavra a palavra, a publicação do jogador português nas redes sociais e só trocou... os clubes