Jogar em 1x4x4x3

O míster e os seus adjuntos começaram a contar os jogadores no quadro. Logo os respetivos ‘ajudantes’ ficaram em pânico, pois sabiam que ia sobrar para eles

A carreira de treinador de futebol é intensa e muito desgastante do ponto de vista mental. É certo que a qualidade do trabalho desenvolvido todos os dias no campo, e fora dele, é determinante para obter sucesso. Mas existe uma série de outros detalhes que contribuem para que os objetivos coletivos possam ser atingidos: saber trabalhar em equipa; termos ao nosso lado um grupo de colaboradores competentes e com compromisso; dar atenção a todos os pormenores; saber comunicar e ter um tipo de intervenção humano, justo e convergente. E, principalmente, ter jogadores de qualidade para podermos construir uma equipa forte, coesa e que possa fazer a diferença.

Não existem, também aqui, milagres. Por isso, o Zé Mourinho ganha. Tal como Ancelotti, Guardiola, Leonardo Jardim, Klopp, Conte, Luís Enrique e alguns outros por esse Mundo fora. Ganham e ganham muitas vezes. Até quando cometem erros. Mas também por isso fazem a diferença.

Saber liderar em crise e na dificuldade, torna o treinador um exemplo e o general que os soldados seguem com orgulho e vontade.

Lembro o tipo de intervenção psicológica desenvolvida pelo ‘Mestre’ Pedroto, meu treinador no V. Guimarães, que ainda no túnel, prestes a entrarmos em campo para a batalha, nos fazia sentir possuídos por uma força sobrenatural, fazendo-nos crer que éramos invencíveis e mais fortes do que o inimigo.

Não foi por acaso que, nessa época de 1981/82, nos jogos com os grandes só perdemos com o Benfica na Luz (1-0) com golo do Filipovic. E conseguimos o 4.º lugar no campeonato nacional.

Trabalhei com treinadores que encaravam o jogo de formas completamente diferentes. Uns acusavam a pressão e até tinham vontade de vomitar, outros com rezas veladas, com momentos de alheamento e solidão, com tremeliques ou com vontade de andar e falar muito e sem nexo. Outros ainda, em contraste, sempre com um sorriso nos lábios, comunicando positivamente, sem medos ou receios e contagiando o grupo com a sua confiança.

Já para não falar naquele, "ai se eu dissesse o nome", que na preleção e no quadro com a equipa, colocou 12 jogadores em campo!

Nesse jogo, iríamos jogar com um sistema inovador: 1x4x4x3. E nem o grande número de ajudantes de campo que o míster tinha, vislumbraram o erro. Foi necessário, depois de algum tempo de intervenção do treinador, o capitão da equipa tentar esclarecer a situação:

– Ó míster, vamos jogar com 12?

– O quê? Quais 12?

– Sim, o senhor falou num guarda-redes, quatro defesas, quatro médios e três avançados. São 12 jogadores! Veja no quadro.

O míster e os adjuntos começaram a contar os jogadores no quadro. E logo os respetivos ‘ajudantes’ ficaram em pânico, pois sabiam que ia sobrar para o seu lado.

– Tenho de pensar e ver tudo. Não tenho ninguém ao meu lado que me ajude e esteja atento. Cambada de...

Resultado da falta de concentração, método e profissionalismo (e de outras coisas...): saiu do ‘doze’ o jogador que não devia ter saído e empatámos um jogo que devíamos ter ganho, já numa fase decisiva do campeonato.

Por António Carraça
Deixe o seu comentário

Últimas Notícias

Notícias
Newsletters RecordReceba gratuitamente no seu email a Newsletter Geral ver exemplo

Ultimas de A crónica de António Carraça

Três notas vermelhas

Jogadores, Vieira e Rui Costa vão tomar as decisões certas para superar a tormenta

Viagem curta

E, mais uma vez, saíram para a Europa dezenas de jovens colombianos cheios de esperança

Futebol envenenado

Quando o Atlético Nacional ganhou a Libertadores, em 1989, o árbitro argentino Juan Bava sofreu ameaças tenebrosas de Escobar e foi ameaçado com armas de fogo

Notícias
Notícias Mais Vistas