RODRIGO Alvaro Tello Valenzuela nasceu em 1979, em Santiago do Chile. Começou a jogar futebol nas camadas jovens do Colo Colo, mas aos 15 anos saiu para o clube rival, a Universidad do Chile, onde permaneceu antes de embarcar na aventura europeia. Nos últimos dois anos teve um percurso ascendente que o guindou ao estrelato no país natal. A nível sénior, conquistou duas vezes o campeonato chileno (1999 e 2000). Pela selecção olímpica ficou em terceiro lugar nos Jogos de Sydney e conquistou a titularidade na selecção principal.
É considerado um dos melhores jogadores chilenos da actualidade e visto como um dos craques do futuro. Em Janeiro deste ano, o Sporting contratou-o naquela que foi a transferência mais cara de sempre na história do futebol português (sete milhões de dólares). Mas o rendimento do jogador não tem correspondido à aposta dos responsáveis leoninos e poucas vezes tem sido utilizado. Tello vive dias difíceis em Alvalade mas está convicto que vai dar a volta por cima e mostrar o seu valor.
– Que balanço faz destes seis meses no Sporting?
– Quando cheguei a Portugal, em Janeiro, vinha com muitas ilusões. Os meus dois últimos anos tinham sido fantásticos. Em 1999, fui campeão chileno com a “U” e bicampeão em 2000 – marquei o golo que decidiu o título. Fui ainda titular da selecção olímpica do Chile, que ficou em terceiro lugar em Sydney, um feito que para o povo chileno foi como se tivéssemos conquistado a medalha de ouro. Tinha então pela frente um novo e grande desafio: jogar na Europa. Surgiu a oportunidade de vir para o Sporting e aceitei o desafio. Mas estava consciente que nem tudo seria fácil. A adaptação a um novo país, a um novo tipo de futebol poderia dificultar a minha integração.
– E é isso que explica o seu rendimento menor nestes seis meses?
– A adaptação a um novo país não me custou muito. Ao fim de um mês já cá tinha os meus pais e Lisboa até é muito parecida com Santiago. As pessoas são muito simpáticas e acolhedoras, o clima é parecido. Não foi por aí que senti dificuldades. Os meus problemas tiveram mais a ver com o estilo de jogo que vim encontrar em Portugal, muito diferente daquele a que estava habituado no Chile.
– Concretize...
– Em Portugal, o futebol é mais dinâmico e também mais físico, fazem-se muitas faltas. No Chile, tinha tempo para parar o jogo, rematar em arco a trinta ou quarenta metros da baliza sem que ninguém aparecesse a tentar estorvar. Em Portugal não, temos de conviver com a pressão do adversário, sempre em cima de nós. Estou a começar a adaptar-me a tudo isso.
– O facto de ter sido a contratação mais cara do futebol português (sete milhões de dólares) não acabou por pesar no seu rendimento dentro de campo?
– É evidente que ser a contratação mais cara do Sporting é uma grande responsabilidade para mim, mas isso não me preocupa. Não dou importância a isso. Faz parte do mercado actual. O Riquelme, por exemplo, já está avaliado em 20 milhões de dólares. O que me interessa é o meu futebol, se sou ou não capaz de expandir o meu jogo no relvado. E isso infelizmente ainda não sucedeu por inteiro. Reconheço isso e compreendo as críticas. Não sei se valho esse dinheiro, o que sei é que as pessoas ainda não viram o verdadeiro Rodrigo Tello. Eu conheço-me e sei do que sou capaz de fazer.
– Mas um investimento tão grande não deixa de ser uma grande responsabilidade para si, quando tem apenas 21 anos e esta é a primeira experiência na Europa...
– Ter 21 anos não é sinónimo de imaturidade. O importante é que eu conheço-me, sei do que sou capaz de fazer dentro de campo e por isso só posso estar tranquilo e aguardar que a situação mude. Não vou continuar sempre assim. Sei que sou capaz de fazer muito melhor. E isso deixa-me tranquilo em relação ao futuro. Não posso esquecer a confiança das pessoas que me trouxeram para o Sporting. Elas sabem do meu valor e da forma como eu jogo.
– Na rua, houve críticas em relação ao seu rendimento?
– Bom, agora, até pelos maus resultados do Sporting, às vezes dizem-me: “não estás a jogar nada”, “o Sporting pagou muito dinheiro por ti”. Tenho de manter a cabeça fria. Se fosse adepto do Sporting também reagiria assim. Mas acredito no meu valor. Posso jogar mais.
- Não era isto certamente que esperava quando chegou em Janeiro ao Sporting?
- Não esperava estar nesta situação, de facto. Vinha de dois anos excelentes, no Chile era considerado a grande sensação do futebol chileno, pela primeira vez estava no estrangeiro, e de repente vejo-me sem jogar. O futebol tem também estes momentos difíceis. Só tenho de trabalhar o dobro para superar esta etapa difícil. O Acosta, por exemplo, um dos meus ídolos, quando chegou a Portugal também viveu um período de adaptação muito difícil. E ele tinha 30 anos. Imaginem eu que só tenho 21 anos. Ninguém me pode crucificar.
- ...
– Já passei momentos muito difíceis na minha carreira antes de chegar ao futebol profissional. Momentos que quase me levavam a desistir de ser futebolista e seguir os estudos. Estava no Colo Colo e fiquei um ano sem jogar, tinha 15 anos. Fiquei muito triste e indeciso se não largaria o futebol e continuava os estudos. Os meus pais ajudaram-me muito, apoiaram-me. Decidi tentar a minha sorte na Universidad Católica e, graças a Deus, tive sorte. Agora, vivo uma situação parecida. Não é que esteja a pensar em abandonar o futebol, claro que não, mas essa recordação dá-me força para acreditar que as coisas vão mudar. Eu sei que cada jogador tem o seu período de adaptação.
– Falou com Acosta?
– Sim, falámos algumas vezes. É uma pessoa muito humana. Disse-me que com ele também se passou o mesmo e incentivou-me a trabalhar cada vez mais. Que eu ficasse tranquilo, e que pensasse agora em realizar uma boa pré-época que a minha hora haverá de chegar.
– Não está então arrependido de ter tentado a sorte na Europa via Sporting?
– Não me arrependo, apesar de estarem a ser momentos difíceis. O Sporting é um grande clube, que foi campeão o ano passado, que participa nas competições europeias. É um momento complicado aquele que estou a passar, mas tenho recebido grande apoio dos meus companheiros, dos meus pais.
– Depois do jogo com a União de Leiria, em que actuou apenas os primeiros quarenta e cinco minutos, nunca mais voltou a ser utilizado.
– Ainda fui convocado para o jogo seguinte, em Alvalade, com o Estrela da Amadora, mas fiquei no banco dos suplentes. Frente ao Boavista fiquei de fora porque tinha compromissos com a selecção – o Chile defrontou o Uruguai em jogo de apuramento para o Mundial de 2002. Nos jogos seguintes, com o Benfica, Belenenses e Paços de Ferreira, voltei a ficar de fora. Agora voltei a ser convocado para o jogo com o Campomaiorense. Só o técnico poderá responder a essa pergunta, embora ele, na altura, tenha falado comigo sobre o assunto.
– E o que lhe disse Manuel Fernandes?
– Pediu-me para eu ficar tranquilo, que sabia o que eu poderia render, mas que necessitava de jogadores diferentes e não me iria convocar. Fiquei triste, mas respeitei a decisão dele. Afinal, o importante é o Sporting conseguir o objectivo de assegurar o lugar europeu. Gostava, porém, de actuar nos próximos jogos, com o Campomaiorense e com o Marítimo. Pelo menos para terminar a época a jogar. Seria bom para mim se isso acontecesse. Mas se isso não suceder, também já estou mentalizado para esquecer estes seis meses e apostar tudo na próxima época. Vou ter três a quatro semanas de férias, no Chile, onde vou aproveitar ao máximo para descansar, junto com a minha família, e regressar com as baterias todas, pronto a realizar uma grande época ao serviço do Sporting. É esse o meu desejo. Na última semana de férias vou treinar-me na “U” com os meus antigos companheiros para regressar a Lisboa já em boas condições físicas.
– Gostava de ter estado em Coimbra a festejar a Supertaça com os seus companheiros?
– Fiquei, sobretudo, feliz por o Sporting ter vencido o troféu. Foi importante para a equipa. Depois de o ano passado ter sido campeão, esta época as coisas correram menos bem. Claro que gostava de viver aquela alegria com os meus companheiros, mas espero ainda viver muitos momentos daqueles com a camisola do Sporting.
«Não sou um extremo»
– Vamos lá então fazer o seu retrato como jogador. No Chile, jogava em que posição?
– Num sistema com três centrais, fazia de lateral-esquerdo ofensivo. Partia da linha da defesa para o ataque. Joguei muito nessa posição ao serviço da selecção e na Universidad do Chile. Mas também já joguei como médio-esquerdo, um pouco mais interior, “alimentando” os dianteiros.
– Em qual das duas prefere jogar?
– Prefiro jogar pela esquerda, a partir de trás, mas adapto-me também ao sistema táctico do Sporting que não é de três centrais. Sou um polivalente.
– Não é então um extremo?
– Não, um extremo clássico é que não sou. Não sou o tipo de jogador que tenha só uma função em campo, como ir à linha e cruzar. Também gosto de ir para o meio, conduzir o ataque, fazer passes largos. Gosto de tentar o remate e não marco mal os livres.
«Estive em Lisboa em segredo»
“Poucos dias antes do fim de ano fui informado pelo meu representante, Gustavo Mascardi, que tinha de viajar no dia seguinte para Lisboa. Era a primeira vez que ouvia falar do interesse do Sporting. Lembro-me que em finais de 1999, falaram-me superficialmente do Benfica, mas não dei muita importância. A proposta do Sporting era bastante concreta – falaram-se de muitos clubes interessados em mim, River, Boca, Napoles, Lazio, Saragoza, mas o único clube que oficializou o interesse foi o Sporting – e viajei até Lisboa. Estive um dia na capital, em completo segredo. Reuni-me com Ribeiro Teles e Carlos Freitas e acertámos o contrato, até 2004, com o Sporting a ter mais um ano de opção. Voltei ao Chile a tempo de festejar a passagem de ano. E a minha ida para o Sporting.”
«Cáceres é ‘matador’»
Com Rodrigo Tello veio também Mário Cáceres, embora este a título de empréstimo. “Mário é um grande amigo meu. A família dele e a minha sempre se deram muito bem, em Santiago. Não sei se ele vai ficar no Sporting, mas gostava que ficasse. Não tenho dúvidas da sua capacidade como jogador. No Chile, no Everton, em cinco meses marcou 14 golos. É um matador” Porque é que Cáceres não vingou, então? Tello tem a sua opinião. “O Sporting, na maioria dos jogos, alinha só com um ponta-de-lança, Acosta, e ainda tem Spehar e Kirovski, o que tornou a vida complicada para ele. Desejo-lhe toda a felicidade para o Campeonato do Mundo de Sub-20.”
«Lindo jogar com Acosta»
Apesar de ainda não se ter afirmado na equipa principal do Sporting, Tello já concretizou um sonho. Jogar ao lado de Acosta. “Quando tinha 17, 18 anos via jogar Acosta no Chile. Ele e Gorosito formavam uma dupla terrível. Foi lindo encontrá-lo no Sporting. É um jogador respeitado na Argentina. Tenho a sorte de ter jogado ao lado dele, assim como o fiz também com Zamorano e Marcelo Salas. Acosta vai-se embora, mas já deixou uma marca de goleador no Sporting. Espero que o seu substituto consiga fazer tantos golos como ele fez.”
O título perdido nos jogos em casa
“Quando cheguei ao Sporting estávamos em terceiro lugar mas a poucos pontos do primeiro. Tínhamos a convicção de que era possível alcançar o título e repetir o êxito do ano passado. Mas para se ser campeão não se pode perder tantos jogos em casa e isso foi determinante. A derrota com o Boavista também foi má. O Boavista, no entanto, merece ser campeão, pois foi o mais regular.”
A pré-época e a Copa América
“A Copa América realiza-se este ano na Colômbia, de 12 a 29 de Julho, e vai coincidir com a pré-época do Sporting. Gostava de estar presente, mas é uma situação que terá de ser bem analisada por todos, pois também não quero prejudicar a minha preparação no Sportng. Quero fazer uma boa pré-época. É importante para mim. Tenho de me apresentar em Alvalade a 2/3 de Julho, e depois logo se verá.
A amizade com Escalona e Uribe
“Joguei com Escalona três anos nas camadas jovens do Colo Colo. Ele era extremo-esquerdo, jogava com o número 11, e eu era médio interior. Fomos duas vezes campeão. Somos grandes amigos. Os nossos pais conhecem-se. Falei com ele e com Uribe antes de vir para Lisboa. Às vezes juntamo-nos para conversar. Escalona está a passar por um momento difícil, por causa do problema dos passaportes, mas vai superar tudo isso.”
Sintra e os castelos
“Ao princípio a minha vida era apenas Hotel-Alvalade-Hotel. Fazia o percurso a pé em cinco minutos. Agora já conheço outros locais. Já fui à Expo, à Torre de Belém, a Fátima. Gostava muito de ir a Sintra. Disseram-me que é um local muito bonito, com castelos e uma paisagem muito verde. Quero ir lá... Gostava também de conhecer o Porto”.
Lisboa combina velho e novo
“A diferença entre Lisboa e Santiago talvez esteja na paisagem urbanística. Em Lisboa, os edifícios antigos são conservados. No Chile, não. Volvidos alguns anos deitam abaixo e constroem de novo. Esta combinação do velho com o novo faz de Lisboa uma cidade mais atractiva, mais europeia.“
Rendido ao bacalhau com natas
“A comida portuguesa é muito boa. Tive a oportunidade de provar bacalhau. A minha mãe conta que quando era pequeno dava-me bacalhau porque tinha muitas proteínas, mas já não me lembrava do sabor. Adoro bacalhau com natas. Tal como no Chile, por aqui também há muito marisco.”
A paixão por Pablo Neruda
“Tenho um amigo no Chile que me manda sempre alguns livros pelo correio. Gosto de ler, ajuda-nos a pensar melhor. História e poesia são os meus temas preferidos. Gosto muito de Pablo Neruda. É um dos símbolos da história do Chile. Poucos há como ele que reflictam tão bem sobre a psicologia humana.”
A emoção de estar em Fátima
“Foi emocionante ter estado em Fátima, um local mundialmente conhecido. Encontrar-me ao lado da Virgem, para uma pessoa, como eu, que é católica, foi algo de especial. A primeira vez fui sozinho, da segunda levei os meus pais. Ficaram muito contentes.”
O apoio da família
“Tenho os meus pais comigo desde 12 de Fevereiro. O meu irmão teve de voltar para o Chile para acabar os estudos. Agora tenho também a minha namorada comigo. Eles apoiam-me muito, é importante tê-los ao meu lado. Estive um mês a viver num hotel, eu e Cáceres. Agora já estou num apartamento, nas Laranjeiras, um sítio muito bonito, tranquilo, e perto do estádio, a cerca de 8 minutos de carro.”
Salas é o melhor jogador chileno
“Marcelo Salas é o melhor jogador da actualidade no Chile. Foi campeão no River Plate e, na Lázio, que já não ganhava o título há muitos anos, conseguiu também sagrar-se campeão. É um exemplo a seguir, quer como profissional quer como ser humano. Admiro-o muito.”
À espera do sol português
“Quando cheguei a Portugal disseram-me que Lisboa era uma cidade onde raramente chovia. Havia sempre muito sol. Mas desde que aqui estou o sol não tem aparecido muitas vezes. Pode ser que esteja à espera que Tello começe a jogar (risos).”