Varandas explica polémica do "rebentar com eles": «Houve muita gente ofendida...»

• Foto: Vítor Chi

Frederico Varandas esteve este sábado no programa da SIC 'Alta Definição', onde falou de si, da família e do Sporting. O líder dos leões recordou como se tornou adepto dos leões, ainda em criança, até chegar a presente do clube, entre muitos outros assuntos.

Jogador sem talento

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"Passei por uma fase onde quis ser jogador de futebol, depois arquiteto, e depois percebi que não tinha talento. Sempre fui dado para ciências. O meu meio normal é matemática, física. Esta foi a minha vida, uma vida ótima. Tenho um irmão, nunca tive um quarto só para mim, levei sempre com o meu irmão. É como se fosse uma extensão minha. Foi uma vida de muita sorte, muito feliz."

Jogos de futebol com o avô

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"O meu avô, pai do meu pai, verdadeiro leão e sócio desde sempre. Depois entrei na ginástica, mas o que gostava era mesmo o futebol. Ainda levei com a natação, mas esse foi o lado emotivo. Aprendi a ir ao futebol, íamos três horas antes aos jogos dos juniores, depois víamos a equipa a entrar. Era um ritual. Depois ia para o antigo campo do Sporting, via a equipa principal a treinar, miúdos da ginástica a ver os treinos. Eram outros tempos. Isso criou sempre uma paixão pelo futebol, pelo Sporting. Costumo dizer, por brincadeira, que quem não é do Sporting é porque quem os educou não ligava a futebol. Aconteceu com os meus amigos. Se a pessoa que nos educa liga ao futebol, é do Sporting..."

Mesas partidas

"Sou do tempo onde Benfica e Sporting [dominavam]. Em dia de jogos a sério, para vomitar, não comia. E a minha mãe já sabia. E isso prolongava-se se o resultado não fosse tão bom. Se cheguei a partir mesas? Sim, em algumas fricções mais acesas... Houve um erro que cometi, alturas onde podia ter sido mais diplomata."

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Papel de presidente

"Existe o Frederico Varandas presidente do Sporting. E entendo qual deve ser o papel do presidente. Muitas vezes estamos em penáltis e não me mexo. Ali não é o Frederico Varandas, é o presidente do Sporting."

Rebentar com eles

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"Houve um caso bem recente onde saiu cá para fora uma comunicação minha, onde usei o termo vamos 'rebentar' com eles. Esse é o Frederico Varandas presidente dentro do Sporting, não o que está na tribuna. Houve muita gente ofendida. Pessoas que não percebem. O que ninguém viu ou vai ver sou eu a criticar um jogador publicamente. Mas ao longo do ano falo com vários jogadores a pedir para não terem certo comportamento. E isso também faço para motivar internamente os meus soldados."

Casa

"A minha fortaleza é a minha casa, tiro a farda de presidente do Sporting e sou o Frederico Varandas. É isso que me agarra todos os dias. Há dias muito duros. Ali, estão as pessoas que me levantam. É aí que faço o meu escape."

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Mulher a ganhar

"Tive muita sorte pelo equilíbrio que tenho em casa pela minha mulher. É sueca e muito pragmática. Sempre percebeu que ok, era o meu trabalho. É diretora de uma multinacional, responsável por múltiplas pessoas abaixo dela. Ela é uma máquina e atenção, ainda estou a perder. Ela tem três prémios Stromp, eu tenho dois. São os genes de viking, as filhas dão muito muito trabalho. Mas isto ajuda muito porque ela mantém o equilíbrio como se nada fosse. Eu ser presidente do Sporting ou trabalhar numa padaria é igual."

Super-mulher

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"Eu para estar bem, para ser presidente do Sporting, preciso de estar bem, os meus filhos precisam de estar bem. Ela é uma super-mulher. Faz com que a vida seja normal e não é fácil, para a mulher do presidente do Sporting, ter uma vida normal."

Festa do título

"Não deve ter ficado tão orgulhosa da maneira como cheguei a casa [depois da festa do título]... Sinto que a minha mulher admira aquilo que a minha equipa alcançou, que tem orgulho em mim, em nós. Nunca se meteu na parte do futebol, não gosta, mas na pré-época ouvia muitos telefonemas e o Viana dizia 'não vamos conseguir esse gajo'. E ela, sueca..."

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Ida ao cemitério

"Antes do resultado sair, fui dizer ao meu avô que ia ser presidente do Sporting. Acima de tudo, sinto uma responsabilidade de cumprir a missão. Primeiro, quando aceito ser presidente, avaliei os prós e contras, se era ou não capaz. Há dois objetivos: um, devolver a dignidade do Sporting. Dois, fazer que as novas gerações não passassem o que a minha passou. É preciso perceber que muitos chegaram onde cheguei com as melhores das intenções mas não conseguiram. O meu pacto é com o clube. Vou fazer o melhor para o clube. Vou durar um mês, um ano, quatro anos? Não interesse, vou fazer o que tenho a fazer. Esse foi o primeiro passo para que a minha equipa conseguisse revolucionar o Sporting."

Pressão enorme

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"Para mim, o ego condiciona o ser humano. Condiciona-nos na decisão, no trabalho, na capacidade de realização pessoal, de sermos felizes. Preocupamo-nos mais com os outros do que com o que somos realmente. Num cargo destes, a pressão é enorme. Muitas decisões são condicionadas, preocupamo-nos muito mais com a perceção que temos do que com o que somos."

O que os outros dizem é zero

"Não me posso preocupar com o que dizem de mim. O que as pessoas vão opinar, não interessa. É perder o tempo da minha vida apenas com o que interessa. Ser melhor pai, melhor marido, melhor pai, melhor filho e marido. Vou ocupar o tempo da minha vida com o que certo comentador, presidente ou treinador diz ou pensa? Assim passa a vida. Enquanto nos dedicarmos ao presente, às pessoas que gostamos, ao que sabermos fazer bem, isso é o que importa. Não é o que falamos, é o que fazemos e a obra que deixamos feita. O que os outros dizem é zero."

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Ida ao cemitério

"Fui de manhã, antes de o resultado sair, dizer ao meu avô que ia ser presidente do Sporting. Ele morreu quando eu ainda era médico, não era presidente do Sporting nem nunca sonhou, na vida, um neto dele ser presidente do Sporting. Eu disse-lhe só que ia tomar conta do Sporting. Também por ele."

O avô

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"Sei que ele sofria com o Sporting. Falo sempre com ele e disse-lhe 'o Sporting é campeão'. E ele está feliz com o Sporting. O que ele teria dito? Teria dito para não ir [para presidente]. Se calhar não o teria dito, mas reprovaria. Acho que, acima de tudo, está orgulhoso do seu Sporting. Essa é a minha missão. Acho que está orgulhoso do neto. Não gosto muito que se pessoalize o presidente. A minha formação é: missão entregue, missão cumprida. É assim que vejo. Para mim, ser campeão e repor a dignidade do Sporting, faz parte da minha missão. Quando há sucesso, é fácil as pessoas perderem contacto com o planeta terra. Isso não altera o meu comportamento, a minha forma de viver ou quem sou."

O pai

"Primeiro gesto do meu pai, na Assembleia Geral do Sporting, havia uma bancada no João Rocha que me estava a insultar. O meu pai vai, entra para ir votar, e entra exatamente do lado onde estão os adeptos organizados para me insultarem. O meu pai entra, começa assim (gesto de dedo na cabeça). Eu digo-lhe 'tu és maluco. Vota e vai-se embora'."

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V. Setúbal

Vi uma vaga para entrar no V. Setúbal. Queriam que eu fosse três vezes por semana lá e eu disse ao meu pai que ia reduzir o tempo de consulta na clínica dele. Disse 'olha pai, há esta hipótese'. E ele 'quanto vais ganhar?'. E eu '800 euros'. Ele perguntou 'aceitaste?'. E eu disse que sim. Ele respondeu 'fazes bem. Mete-te nessas brincadeiras da bola'.

(...)

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O meu pai disse que lhe disseram 'no dia em que o Gyökeres se for embora, eu tenho 15 Gyökeres. Um no Montijo, outro aqui, outro ali...'."

Ameaças enquanto presidente

"Tenho para troca. Já tive de tudo. O Afeganistão deu-me uma lição, aprender a viver com o medo. Quando cheguei lá, fomos ativados porque havia ameaça de um veículo que estava possivelmente armadilhado para um ataque. Nos primeiros 10 segundos, vi 40 carros brancos daquela descrição. Andámos horas numa patrulha. Quando cheguei, o batimento cardíaco... E eu 'correu bem'. Depois fiz uma conta de cabeça e pensei que ia fazer aquilo seis meses. Pela primeira vez na vida coloquei na minha cabeça que não ia aguentar. Um dia fomos fazer outra patrulha, numa zona completamente controlada pelos talibãs. Começo a preparar-me e entra um oficial como eu. Ele fecha a porta, entrega-me uma carta, e diz-me que era para a namorada dele, caso algo corra mal. E eu digo-lhe que também ia com ele. Ele encosta-se à parede e vomita de ansiedade. Ele olha para baixo, limpa-se. Chega cá fora, está o pelotão dele à espera. E eu a pensar 'este estava com medo, a achar que ia acontecer alguma coisa, mas chega lá fora e está de cabeça levantada para os seus homens'. Eu aprendi que era normal ter medo. Aprendi que coragem não é não ter medo, é não ceder ao medo."

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Sem medo

"Quando houve ameaças disto e daquilo [enquanto presidente do Sporting], claro que avalio a ameaça mas, de certa forma, se cedesse a uma ameaça ia ter de colocar o meu lugar à disposição. Ia falhar, não estava preparado para ser presidente do Sporting nesse caso."

Ouviu uma final da Taça do Sporting no Afeganistão?

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"Consegui. Sabia que, com sorte, apanhava ondas curtas do outro lado do planeta. Na final contra o FC Porto, em 2008, foi a única que não assisti do Sporting. Pego na antena e achei uma coisa extraordinária. Era um fim-de-semana de lua cheia, estávamos com elevada suspeita de sermos atacados, e estávamos em regime de silêncio absoluto. Tínhamos as tendas montadas para eles julgarem que estávamos lá a dormir. Eu vou ao rádio, começo a meter aquilo devagarinho, meto na Antena 1 e ficou tudo à minha volta a ouvir o relato do Sporting. Foi maravilhoso."

Na pandemia

"Ninguém sabia o que ia acontecer. Disse que se precisassem do João Rocha, podiam utilizar. Eu sou oficial do exército, ainda sou, sou capitão, estou de licença sem vencimento. Foi duro sobretudo fazer o que fazia e acumular ser presidente do Sporting. Cheguei à urgência do hospital e era preciso mão-de-obra para todo o tipo de urgência. Há covid, mas as pessoas continuam ter infartes, infeções urinárias, etc... Fiquei com o covid. Vinham os doentes, e eu ia completamente equipado e só se via os olhos. Fazia a história do cliente, a colheita, e alguns viravam-se para mim 'oiça lá, você não é o meu presidente?'."

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Intuição

"No momento da decisão, a intuição é muito importante. Tenho 4 ou 5 pessoas que oiço sempre, mas quem dá o 'tiro' sou eu. Sinto que sou bom a formar equipas, o exército ensinou-me isso. Sempre tive a parte intuitiva de comandar homens."

Foi muito aconselhado a não contratar o Rúben Amorim?

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"Fui e ainda bem que fui. Foi uma decisão marcante. Teve muito a ter com a intuição mas também a parte racional. Lembro-me do primeiro jogo dele. Acabei o jogo e fiquei preocupado, foi o primeiro sentimento que tive. Fui falar com o [Hugo] Viana. Entendemo-nos muito bem. Senti que as coisas não estavam bem também em virtude da questão financeira. Quando não há dinheiro, não há dinheiro. Tínhamos de começar com calma. Quando começamos a ver a fase de evolução do Rúben, perguntei ao Viana se dava para falar com ele. O Viana começa-se a rir. O Rúben tinha uma cláusula de 10 milhões. Eu e o Viana fomos ao Norte. O que é que eu senti? Primeiro, a parte racional. Depois, a parte intuitiva que sinto que é 'louca', mas o acreditar que o Rúben tem o olhar. Fechamos a porta, entramos no elevador, o Viana olha para mim, ri-se e diz '10 milhões é muito dinheiro'. E eu: 'Viana, qual é o melhor treinador para o Sporting? Eu não tenho dúvidas, tu tens?'. A única pessoa que estava alinhada comigo era mesmo ele. Ele nunca quis sequer sugerir outra coisa. Se calhar já devia ter ido buscar o Rúben há mais tempo. Depois, havia a questão do dinheiro. Disse ao Viana que a decisão estava tomada lá em baixo, depois de saírmos do elevador."

O presidente mais titulado

"Na hora de sair, sei que vem alguém melhor do que eu. Muitas vezes, quando chegamos ao cargo, queremos fazer coisas para ficarmos na história. Eu rio-me como as pessoas se desgastam a vida toda para ficar com o nome numa rua ou num museu. Hoje fala-se que o Frederico Varandas ganhou X títulos e se está a aproximar do presidente mais titulado. E eu pergunto: 'Quem é o mais titulado?'. Muitos dizem que é o João Rocha. Mas foi o António Ferreira, que conquistou muitos títulos em poucos anos, em 1946. A história varre-nos sempre. A geração abaixo de mim vai-se lembrar quem é o Frederico Varandas, a seguinte também."

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Valores do Sporting

"Sou do Sporting porque me identifico com os valores do Sporting. O que fiz foi reorientar o Sporting para esses valores. Enquanto for presidente, o Sporting vai ter o mesmo caminho. Mesmo perdendo amanhã. A nossa postura, dignidade e integridade tem de ser inabalável. Um dos fenómenos do Sporting é que vencer ajuda, mas com os nossos valores... É uma coisa fortíssima. Não há nada mais inspirador do que vencer pelo mérito, sem nunca ligar ao presidente do Conselho de Arbitragem a perguntar por que vai ser certo árbitro [a dirigir um jogo]. Muitas vezes chego ao jogo e nem sei quem é o árbitro. Temos de nos controlar nas variáveis que controlamos."

Importância de Paulinho para o caminho do Sporting?

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"É uma grande figura do Sporting, um ser humano espetacular. Uma pessoa super intuitiva, sensível, muito muito esperto. Mais do que a maioria das pessoas julga. O exemplo de uma pessoa feliz. O meu papel? Eu sou o doutor Varandas para ele. Como ele diz, 'Varanas'. Tenho um carinho especial por ele. Apesar de ele ser completamente independente, tomo conta dele, sou um tutor. Ele sempre teve o senhor Mário Lino. Há uns anos, fomos almoçar os três e o Mário disse que já tinha uma certa idade. Eu disse ao Paulinho que estava na altura de alguém tomar conta dele caso acontecesse alguma coisa. O Paulinho disse 'eu quero o senhor Varandas'. Até tenho um quarto dele em minha casa. De vez em quando vai lá jantar, costuma comer um frango inteiro, literalmente... Pago-lhe o IRS. Mas ele sabe tomar conta dele melhor do que ninguém."

O presidente em casa é o seu filho?

"Não, sou eu. Mas se ele continuar a crescer assim... Já ouve boa música, Metallica faz parte de boa música."

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O que mudou na sua vida depois de ser pai?

"Tudo, eu se pudesse tinha 7, 8, 10 filhos. Se tivesse sido pai mais vezes, se calhar não tinha paciência, disponibilidade, tempo. Eles são tudo. Ele tem agora 4 anos, começa a perceber algumas coisas, e a minha filha com um ano também não percebe nada. Os miúdos são miúdos. Muitas vezes são cruéis, tenho medo da parte dos 13/14 anos. Ser pai é como levar uma injeção de amor."

Convívio em casa, o seu filho já lhe disse algo que nunca esqueceu?

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"Em casa falamos inglês. A mãe fala sueco com ele, mas já vou percebendo. Nós falamos inglês todos e ele na vida normal fala português. Quando me despeço dele, digo-lhe sempre 'you are me and more'. E ele termina sempre com o 'more'. Como podia ser mais feliz? A manter o que tenho. A vida é viver as oportunidades que a vida nos dá. Em 2008 rebentou a maior crise financeiro e muitas pessoas perderam milhares de trabalhos, depois veio o covid... Lembro-me de ser miúdo, de estar a fazer ski, e ver dois aviões a irem contra as Torres Gémeas. Passado dois anos, estava a ir para o Afeganistão. Somos tão vulneráveis que temos de dar valor ao que temos."

Festa no Marquês

"Jamais vou esquecer o que vivi no Marquês. Há coisas que não me lembro tão bem, tive de ir ver à televisão (risos). Ver um mar de gente a cantar... Aquele dia é para os jogadores, para os artistas. É viver o dia. E ser feliz é onde eu vivo. Viver não é um mar de rosas, há dias que são duros, que são maus, dias em que chego a casa e não me apetece falar. Mas o outro dia vai correr melhor, é estar vivo. Todos os dias acontecem centenas de coisas que podem mudar a nossa vida."

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Alguém lhe deve um pedido de desculpas?

"Não perco um segundo de vida com o que não interessa. Tomar conta dos meus filhos, da minha mulher é o que me importa. De resto, não mexo um ponteiro."

Como gostaria que os seus filhos descrevessem o pai?

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"Como um lutador. Hoje ganhei, amanhã vou perder. Mas o que sei, é que depois de amanhã vou à luta outra vez."

O que dizem os seus olhos?

"Que esta é a minha essência. Lutei para entrar na Academia Militar, lutei no exército, no covid, no Sporting, e vou continuar a lutar."

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Por André Santos
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