A 29 de maio de 1985, o Estádio de Heysel, em Bruxelas, recebia a final da Taça dos Campeões Europeus entre Juventus e Liverpool, equipas que dominavam o futebol naquela altura, mas ninguém esperava o que aconteceu. Estávamos numa fase em que o hooliganismo atingia o seu pico máximo em Inglaterra e, em Itália, se começava a utilizar o termo ultra. Depois de terem sido alvo da fúria dos adeptos da Roma no ano anterior – quando os reds ganharam a Taça dos Campeões na capital romana frente à equipa da casa – uma franja de hooligans do Liverpool viu nesta final com a Juventus (com quem perdera a Supertaça Europeia em janeiro) a hipótese ideal para a "vingança": uma hora antes do jogo, a morte passou em direto na televisão, com os hooligans ingleses a atacarem os ultras italianos, devido à fraca presença policial nas bancadas.
Os adeptos italianos foram encostados a um muro e, encurralados, foram agredidos e pisados por hooligans do Liverpool, situação que originou 39 mortes – 32 italianos adeptos da Juve, 4 belgas, 2 franceses e um irlandês –, além de 600 feridos. A partida foi adiada uma hora e meia, enquanto alguns adeptos eram assistidos no relvado até as ambulâncias começarem a evacuar mortos e feridos. O impacto mediático da tragédia de Heysel foi enorme por se tratar de uma final da Taça dos Campeões Europeus, transmitida em direto na televisão para todo o Mundo, algo raro naquela altura, tendo a UEFA sido muito criticada por não ter evitado a realização do jogo naquele dia.
Antes da partida, os capitães de Juventus e Liverpool, Gaetano Scirea e Phil Neal, apelaram à calma dos fãs mas ambos disseram mais tarde que não se aperceberam da situação real das bancadas: o jogo realizou-se sob um clima de consternação e com vários cadáveres no chão. Inclusivamente, Michel Platini, na altura avançado da Juventus, que decidiu o jogo com um golo solitário, foi bastante criticado por ter festejado de forma efusiva.
Medidas
A partir desta tragédia, a FIFA tomou medidas drásticas para impor maior segurança nos estádios e criou a campanha mundial Fair Play. O Estádio de Heysel não voltou a acolher um jogo de futebol e a Bélgica foi impedida de acolher eventos desportivos nos 10 anos seguintes. O cenário do futebol, a nível europeu, alterou-se dentro e fora de campo mas, em Inglaterra, só depois de Hillsborough, em 1989, se olhou para o futebol com outros olhos.
Penas severas a ingleses
Após cinco meses de avaliação ao caso, 14 adeptos do Liverpool foram considerados culpados da tragédia de Heysel, tendo todos sido condenados a três anos de prisão pela justiça belga. Nem a UEFA, como organizadora do evento, nem os proprietários do Estádio de Heysel nem as autoridades de segurança foram vistas como responsáveis e o futebol inglês não se livrou de penas severas.
Todos os clubes em Inglaterra ficaram impedidos de participar nas competições europeias nos cinco anos seguintes, mas o Liverpool foi castigado com 10 anos, embora a pena tenha depois passado a 6 anos, mais um do que os restantes.
Este castigo provocou uma grave crise no futebol inglês e veio interromper o domínio daqueles clubes na Europa – tinham ganho sete das anteriores oito Taças dos Campeões Europeus. A proibição de ir às competições da UEFA enfraqueceu financeiramente os clubes, que perderam milhões em publicidade, patrocínios e direitos televisivos. Além disso, os melhores jogadores e treinadores britânicos foram saindo de Inglaterra e tornou-se então muito difícil ir comprar craques ao estrangeiro.
OUTRAS DESGRAÇAS EM ESTÁDIOS DE FUTEBOL
1946: Burnden Park, Bolton, Inglaterra Morreram 33 adeptos por asfixia, devido à sobrelotação do estádio do Bolton – a lotação era de 60 mil mas superou os 85 mil adeptos – na 2.ª mão dos quartos-de-final da Taça de Inglaterra frente ao Stoke City.
1964: Estádio Nacional, Lima, Peru Num jogo entre o Peru e a Argentina, morreram 318 pessoas ao fugir de uma carga policial sem poder sair do recinto.
1968: Estádio Monumental de Núñez, Buenos Aires, Argentina O clássico entre River Plate e Boca Juniors ficou conhecido como a Tragédia da Porta 12, por esta estar fechada no fim do jogo quando era suposto que os fãs do Boca saíssem do recinto. O caminho para a porta ficou encurralado pelo enorme número de fãs e faleceram 71 adeptos xeneizes, a maioria menores de idade.
1982: Estádio Lenine, Moscovo, Rússia Tragédia de Luzhniki ocorreu por sobrelotação das bancadas em jogo da Taça UEFA entre os russos do Spartak e os holandeses do Haarlem. Morreram 66 pessoas.
1985: Valley Parade, Bradford, Inglaterra Num jogo entre o Bradford City e o Lincoln City, deflagrou um incêndio nas bancadas, provocando a morte de 56 pessoas e ferindo 265.
1989: Estádio de Hillsborough, Sheffield, Inglaterra A conhecida Tragédia de Hillsborough ocorreu num jogo das "meias" da Taça de Inglaterra entre Liverpool e Nottingham Forest, quando 96 adeptos do Liverpool faleceram por sobrelotação do estádio e falta de organização policial.
1996: Estádio Mateo Flores, Guatemala A venda de bilhetes falsos para o Guatemala-Costa Rica, de apuramento para o Mundial’1998, provocou a sobrelotação do recinto, resultando na morte de 83 adeptos e em 200 feridos devido a asfixia.
2012: Estádio de Port Said, Cairo, Egito Num jogo entre Al Ahly, então treinado por Manuel José, e Al Masry, um grupo de adeptos deste último invadiu o estádio e atacou adeptos, jogadores e representantes do Al Ahly, matando 75 pessoas e ferindo perto de mil, obrigando à suspensão da liga.