Na agenda preenchida de Eusébio, muitos anos depois de ter deixado de jogar, continuou sempre a haver dias sagrados. Por exemplo, se lhe pedíamos uma entrevista ou qualquer outro envolvimento pessoal, isso nunca podia colidir com a agenda do Benfica: “Hoje não posso, tenho jogo”, respondia ele. Mesmo que a partida fosse à noite, toda a sua concentração e motivação era o jogo, que encarava como se fosse realmente alinhar, lutar e marcar golos. Uma vez jogador, jogador toda a vida.
Ora, se fosse vivo, era isso que Eusébio responderia a quem o atentasse no dia de hoje. À sua maneira, ele entregar-se-ia ao jogo, mas os jogadores reais, em campo, nem sentiriam a sua presença, a sua influência. Com esta mudança brutal na vida dos portugueses e dos benfiquistas, em particular, as circunstâncias do Benfica-FC Porto alteraram-se profundamente: agora, todos os jogadores, sobretudo os da casa, sentirão a presença dele em campo.
Este vai ser o primeiro jogo depois da morte do maior jogador da história do campeonato português, um clássico para decidir a liderança no final da primeira volta, sem perder de vista que Eusébio considerava muito menos importante os jogos com o FC Porto, relativamente aos dérbis com o Sporting [ver aqui].
O trabalho dos treinadores ao longo da semana passou bastante por este ponto. Jesus tentando refocar a atenção dos jogadores, Fonseca querendo tirar o máximo partido das emoções à solta entre o 3.º Anel e a equipa adversária. A carga emocional estará toda sobre os jogadores do Benfica.
Eusébio não vai encarar Américo e driblá-lo para mais um golo, mas todos os jogadores do Benfica vão entrar em campo com o desejo nada secreto de serem o herói da partida, o marcador do golo, aquele que vai poder dizer “por ti Eusébio”.
A partida está dependente do tempo que as equipas tardarem a sair debaixo desse manto de emoções. Normalmente, a bola começa a rolar e os jogadores esquecem todos os condicionalismos e se isso acontecer, teremos um grande clássico, com outras emoções à solta: o Benfica precisa de vencer este jogo, sob pena de se atrasar perigosamente, mas o FC Porto começa o ano com tranquilidade, confiança e a crescer coletivamente. Também há alguma vantagem dos visitantes relativamente à estabilidade do plantel, em matéria de impedimentos, nesta época invulgarmente infeliz em matéria de lesões. A chave para os encarnados é conseguirem pôr em prática um modelo acutilante, prático e, sobretudo, veloz e agressivo. Isto, se conseguirem ter a bola e não forem surpreendidos pelo talento do debutante Carlos Eduardo.
O meio-campo do FC Porto ou a profundidade do Benfica? Bem, no final, talvez um detalhe, um erro individual, uma inspiração súbita, uma bola parada.
MUITO PROVÁVEL
» Benfica em 4x2x3x1;
» Oblak titular;
» Matic mais decisivo do que Fernando;
» Carlos Eduardo, o melhor dragão;
» Defensiva do FC Porto em foco nas bolas paradas (defesa e ataque);
POUCO PROVÁVEL
» Menos do que dois golos;
» Mais de três portugueses em campo;
» Quaresma ou Kelvin na equipa inicial;
» Agressividade excessiva apesar da tensão envolvente;
» Erros muito graves de Artur Soares Dias.