João Sundfeld nasceu há 19 anos em São Paulo, Brasil. Mudou-se para Portugal em 2019 para estudar Ciências da Comunicação na Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas da Universidade de Lisboa, mas a ligação ao nosso país vem de antes: o bisavô era português. No sangue da família está também o amor pelo Palmeiras. E foi na qualidade de adepto do clube brasileiro e como estudante de Jornalismo – é editor no ‘Nosso Palestra’ e colabora com o site ‘Fair-play’ – que Record convidou João Sundfeld a escrever um texto sobre o que representa Abel Ferreira para o Palmeiras. O treinador português pode conquistar no sábado a segunda Taça Libertadores consecutiva ao serviço do Verdão – defronta o Flamengo em Montevideu (Uruguai)."Quem é Abel Ferreira para o palmeirense?
Joelmir Beting, um dos maiores corações palestrinos com passagem por este mundo, dizia que não dá para explicar a emoção de ser palmeirense. De facto, é algo maior do que palavras e razão são capazes de compreender. É irracional, é fanático, mas, acima de tudo, é belo.
Sei disso desde criança. Cresci com fortes influências portuguesas vindas do meu avô, mas foi o calor italiano presente no Alviverde que me conquistou, através do meu pai, que da Itália não tem nada além das cores que dominam seu coração.
É um amor que transcende barreiras, fronteiras. Algo universal, compartilhado por mais de 16 milhões de pessoas. Algo presente em todos os cantos do mundo, da sala, quartos e tantos mais. Explicado apenas pelas lágrimas na tristeza da descida em 2012 ou na alegria dos títulos que viriam anos depois.
E como poderia um português que nunca tinha escutado o nome Sociedade Esportiva Palmeiras na vida personificar isso à beira do campo, entender a história e carinho para levar a equipa às glórias de outrora? À Glória Eterna que é obsessão? Ainda mais sem os adeptos no estádio para empurrar, criticar e 'jogar amendoins'?
Ninguém sabia se poderia, acredito que nem ele. No entanto, o tempo mostrou a realidade. Temperamento forte, declarações incisivas após as partidas. Saindo em defesa do clube e dos jogadores, como poucos fariam e nenhum, além dele, faz. Amarelos, vermelhos, suspensões e críticas. Briga constante com a imprensa, arbitragem e, até, torcida. Acima de tudo, vontade de vencer.
Não à toa, não tardaram as comparações com o maior de todos, Felipão. De histórias interligadas e feitios similares. Que sabe ser palmeirense como ninguém, que conhece os adeptos e o clube. O país e o futebol. A história que foi e será feita.
Abel mostrou ter tudo isso, em pouquíssimo tempo de Brasil e Palmeiras. Não era apenas um treinador que chegou para salvar o ano arruinado pela direção. Era alguém para marcar época. Para recuperar o orgulho palestrino que estava desgastado pelas péssimas decisões que vinham de cima. Para ser o símbolo de uma nova era, de Crias da Academia e troféus que, pasmem, ainda não tinham chegado.
Mas nem só de atitudes extra-campo vive um treinador de futebol. Afinal, a equipa precisa jogar de bem para vencer. Precisa de vencer para conquistar. Precisa de conquistar para sair do campo e ser eternizado nas paredes do Allianz Parque.
E disso Abel entende como poucos. Analisou as características da equipa, do pequeno trabalho realizado por Andrey Lopes, o ‘Cebola’, antes de sua chegada e o resultado não poderia ser outro.
Goleada atrás de goleada na Libertadores. Delfín ficou para trás. Libertad? Nunca nem vi. River Plate foi o mais difícil. E, mesmo assim, no primeiro jogo, 3-0 - fora o baile.
Na Copa do Brasil, situação semelhante. Vencendo e convencendo. Bons jogos e resultados. Nas duas, eventualmente, a final chegou. Com ela, os títulos.
A Glória Eterna voltou às mãos palmeirenses. Depois de 20 anos daquela que eu não estava vivo para presenciar. Depois de uma eternidade de deceções e tristezas na mesma competição. Gritos e xingos. Noites mal dormidas e passadas em claro. Tudo por aquele momento.
Abel Ferreira fez o palmeirense sentir uma felicidade que nunca havia sido experienciada. Uma sensação rara, inédita, que pode se repetir, ou ser imitada, contra o Flamengo.
E tudo depende de um homem que comanda 11. Como bem disse o histórico Felipão ao Nosso Palestra, "vamos vencer com a estratégia e convicção do Abel". Tudo depende dele. Os jogadores não são melhores que os adversários, assim como ocorreu na meia final em Avellaneda ou no Mineirão. O conjunto, porém, pode.
Abel Ferreira, hoje, é mais do que um nome histórico e vencedor. É o símbolo da esperança do palmeirense em conquistar grandes coisas, apesar das dificuldades.
A direção não investiu, abriu mão, mas, como Atlas, lá estava o português, segurando o Palmeiras nas costas em busca de mais uma Obsessão.
De coração quente e mente fria.
Avanti, Palestra!"
Por Record